A “sorte”das economias africanas ao longo da última década parece ter-se alterado substancialmente. Os países ricos em recursos naturais têm contribuído, em particular, para o crescimento recordista e impressionante da região, mas o mesmo não se pode dizer no que respeita aos seus índices de desenvolvimento humano A “sorte”das economias africanas ao longo da última década parece ter-se alterado substancialmente. O crescimento económico tem vindo a contribuir para o aumento dos rendimentos médios e a maioria dos países da região tem vindo a recuperar significativamente da recessão global. Os países ricos em recursos naturais têm contribuído, em particular, para o crescimento recordista e impressionante da região, mas o mesmo não se pode dizer no que respeita aos variados índices de desenvolvimento humano. É desta forma que começa o Africa Progress Report 2013, apresentado na Cidade do Cabo em Maio último, por ocasião de uma cimeira especial do Fórum Económico Mundial (FEM) dedicada ao continente africano e que reuniu centenas de líderes de todas as partes do mundo. O relatório em causa resultou da pesquisa de um painel de especialistas, liderado por Kofi Annan, o antigo secretário-geral das Nações Unidas e teve como principal temática o “cruzamento” dos excepcionais resultados económicos alcançados pelos países da região ricos em recursos naturais versus a proliferação do aumento do desemprego e da desigualdade entre os seus cidadãos. Como se pode ler no relatório, e apesar da debilidade que ainda afecta a economia global, o desenvolvimento económico da África subsaariana tem-se mantido robusto, crescendo, em média, cinco por cento ao ano, ao longo da última década. A fazer um pouco de sombra a este crescimento está apenas o leste asiático mas e mesmo assim, como afirmou Børge Brende, um dos directores gerais do FEM, “os leões africanos já estão a crescer mais rapidamente do que os tigres asiáticos”. A metáfora é bem aplicada se tomarmos em consideração que mesmo com a recessão económica que assolou o mundo em finais de 2008, em 2012, foram vários os países africanos que registaram um crescimento na ordem dos seis por cento. Tendo em conta a temática central do relatório em causa, o FMI identificou 20 países em África como “ricos em recursos”. Estas nações são igualmente conhecidas como “dependentes das exportações”, o que significa que mais de um quarto das suas receitas de exportação deriva da indústria extractiva, ou como “fiscalmente dependentes”, na medida em que os seus governos dependem dos recursos minerais em mais de 20% no que respeita às suas receitas internas domésticas. Destes, 13 dependem em mais de metade das suas reservas de recursos naturais. Reflectindo o facto de os exportadores de petróleo estarem associados a níveis elevados de colecta de receitas, os sete exportadores de ouro negro do grupo – Angola, Guiné Equatorial, República Democrática do Congo, Nigéria, Gabão, Chade e Camarões – possuem uma maior dependência fiscal do que os exportadores de minerais. No total, estes 20 países, e de acordo com os critérios do FMI, são responsáveis por 79,6% do PIB da região e abrigam 56% da sua população. Entre 2000 e 2011, a Guiné Equatorial era a economia de mais rápido crescimento no mundo, com uma performance que rondava os 17%, secundada por Angola, Chade, Serra Leoa e Nigéria. Em 2012, Angola, Chade, Nigéria e Serra Leoa suplantaram a China e o Gana, Moçambique e a Zâmbia tiveram um crescimento superior ao da Índia. Mesmo com um crescimento populacional elevado, os rendimentos médios têm vindo igualmente a prosperar na maioria dos países ricos em recursos. Numa estimativa feita em dólares (constante), os rendimentos médios per capita na Guiné Equatorial triplicaram, em 2011, face ao início do século. Em Angola, mais do que duplicaram. Ao longo da década, 10 dos 20 países ricos em recursos viram os seus rendimentos médios aumentar em pelo menos um terço (ou mais, em alguns casos); outros quatro registaram ganhos em excesso na ordem dos 20%. No fim da escala da performance estão a República Central Africana e o Zimbabué, em declínio económico, uma situação particularmente dramática para este último. Estes ganhos em termos de rendimentos médios catapultaram muitos dos países ricos em recursos naturais para o limiar, ou acima dele, no que respeita à separação entre países pobres e ricos. O Banco Mundial classifica os rendimentos dos países da seguinte forma: baixos rendimentos (até 1,025 dólares); médios baixos (entre 1,026 e 4,035 dólares): médios altos (entre 4036 e 12,475 dólares) e de rendimentos elevados. Ao longo da última década, os Camarões, o Gana, a Nigéria e a Zâmbia passaram o limiar dos baixos rendimentos para os rendimentos médio baixos. E mais cinco países – Angola, Botswana, Gabão, Namíbia e África do Sul situam-se agora no grupo dos rendimentos médios elevados. A Guiné Equatorial, com um rendimento médio de 27,478 dólares em 2011, está agora classificada como um país de elevados rendimentos.
Crescimento económico não diminui automaticamente a pobreza Os países ricos em recursos têm uma oportunidade sem precedentes para reduzir a pobreza de forma acelerada. Contudo, e como explica o relatório, medir essa oportunidade é igualmente complicado. Todavia, uma simples comparação das receitas actuais e estimadas em projectos da indústria extractiva e os custos implícitos de erradicação da pobreza ilustram a escala desse potencial. Em muitos países ricos em recursos, e quando se antecipam os fluxos das suas receitas, estes vão muito mais além do que seria necessário para se fechar o gap da pobreza nacional. Na Guiné, Libéria ou Moçambique, as receitas anuais previstas pelo FMI relativamente aos actuais projectos existentes ligados aos recursos naturais poderiam erradicar a pobreza extrema. A Tanzânia poderia reduzir para metade a pobreza da sua população e o Gana poderia fechar o gap em três quartos.
Ricos em recursos, pobres em desenvolvimento Um dos indicadores mais sensíveis do progresso relativo ao bem-estar é o da sobrevivência de crianças com idade inferior a cinco anos. E esta é uma área na qual África tem vindo a registar alguns progressos. Desde 2000 que a região tem vindo a duplicar a taxa de declínio da mortalidade infantil, para 2,4 por cento. E alguns dos países ricos em recursos têm contribuído para esta melhoria. A taxa da redução da mortalidade infantil na Tanzânia triplicou e mais que duplicou na Zâmbia. Mas o Gana e a Nigéria deixaram-se ficar para trás relativamente à média da região, enquanto a República Democrática do Congo, a Guiné Equatorial e o Mali não registaram qualquer modificação. Como alerta sucessivamente o relatório, tanto as boas como as más notícias têm de ser colocadas em perspectiva. Enquanto grupo, os países africanos mais ricos em recursos possuem ainda uma das mais elevadas taxas de mortalidade infantil do mundo: 12 destes continuam a ter o número impressionante de 100 mortes por cada 1000 nascimentos. Os progressos na educação têm sido igualmente desiguais. Vários países já percorreram um longo caminho que, todavia, começou de uma base muito baixa. O Níger mais do que duplicou as suas matrículas, mesmo tendo em conta que um terço das crianças em idade escolar não frequenta a escola primária. Em Moçambique, na Tanzânia e na Zâmbia, a quota de crianças que se inscreveu na escola primária aumentou de cerce de metade nos finais da década de 90 para mais de 90% na actualidade, o que indica que estes países estão próximos de atingir um dos Objectivos do Milénio em 2015: a educação primária universal. Pelo contrário, outros países, como a Nigéria, pioraram ainda mais a sua situação na última década. Tal como acontece com a redução da pobreza, o aumento das receitas provenientes dos recursos tem todo o potencial para transformar a oferta da educação. Uma pesquisa efectuada pelo programa “Education for All” da UNESCO e publicada no seu Global Monitoring Report ilustra bem o ponto em causa. O relatório analisou as fontes potenciais de rendimentos provenientes do petróleo, gás natural e de outros recursos minerais em 17 países em todo o mundo. E estimou que, caso estes cumprissem as normas internacionais de tributação de impostos no que respeita às exportações de recursos minerais e aplicassem 20% das receitas adicionais em educação, estes países poderiam mobilizar 5 mil milhões de dólares “extra”. Contextualizar o número em causa significa uma quantia duas vezes e meia superior ao que estes países recebem em ajuda externa. Se alocado adequadamente, o aumento do fluxo de receitas derivado das reservas de petróleo e gás natural em 13 países da África subsaariana poderia servir para prover educação a 10 milhões de crianças que, neste momento se encontram fora do sistema escolar, o equivalente a 1 em cada 3 crianças em idade escolar na região. A diversidade de resultados existente nesta secção em particular do estudo – e que o VER escolheu para resumir – sublinha as limitações da perspectiva dos recursos quando estes são encarados como uma maldição. Alguns governos conseguiram utilizar com sucesso as receitas provenientes dos recursos para apoiar as políticas que reduzem a mortalidade infantil e aumentam as oportunidades na educação. Outros não foram capazes – ou não demonstraram vontade – de o fazer. O que o relatório conclui é que não existe uma relação automática entre riqueza de recursos e progresso no desenvolvimento humano. E, o que realmente conta, são as políticas públicas, bem desenhadas e apoiadas pelos compromissos governamentais.
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Editora Executiva