As empresas reconhecem hoje que a responsabilidade corporativa já não é, simplesmente, uma questão moral. Segundo o responsável global da KPMG para as alterações climáticas e sustentabilidade, “é encorajador ver que as grandes empresas olham agora para as mudanças sociais e ambientais como uma fonte de oportunidade, tanto ou mais do que como uma fonte de risco”. Portugal segue os mais elevados padrões internacionais nesta matéria e distingue-se em 3º lugar, entre os países que mais utilizam os parâmetros do GRI nos seus relatórios de RC
O estudo da consultora KPMG Survey of Corporate Responsibility Reporting 2013, que avalia as cem maiores empresas (N100) de 41 países analisando as suas práticas de reporting sobre Responsabilidade Corporativa, revela que a elaboração de relatório sobre Responsabilidade Corporativa (RC) se tornou já numa prática empresarial standard em todo o mundo, com a maioria das organizações a integrar a RC nos seus modelos de gestão. Uma prática adoptada por quase três quartos (71%) das empresas, de acordo com esta 8ª edição do relatório da consultora, tendo por base a avaliação realizada nas 4100 empresas. A análise revela um aumento de 7% no número de empresas que adoptaram esta actuação, desde 2011. Acresce que entre as 250 maiores empresas do mundo (G250), o índice do relatório de RC atinge os 93%. Em Portugal, as empresas estão a aderir aos padrões internacionais mais elevados nesta matéria, com 71% das cem maiores a produzirem relatórios de RC. O estudo da KPMG “Survey of Corporate Responsibility Reporting” é publicado a cada dois anos, desde 1993. A pesquisa baseia-se num estudo detalhado dos relatórios das organizações sobre o desempenho de responsabilidade empresarial, nas informações púbicas disponíveis nos relatórios financeiros das empresas e nos sites das mesmas. Para além da pesquisa sobre as cem empresas líderes em facturação em cada país (organizada por 15 sectores de actividade), o estudo da KPMG integra também uma análise qualitativa dos relatórios de Responsabilidade Social das 250 maiores empresas do mundo, agrupadas em 14 sectores (cada um classificado em função de os impactos da cadeia de fornecimento da empresa serem discutidos em detalhe, com limitações, ou não serem sequer discutidos).
Esta avaliação, desenvolvida pelo centro global de excelência para mudanças climáticas e sustentabilidade da KPMG, é realizada segundo oito critérios: estratégia, riscos e oportunidades; relevância; objectivos e indicadores; fornecedores e a cadeia de valor; interacção com stakeholders; gestão da responsabilidade corporativa; transparência e equilíbrio. Portugal com bom nível de reporting As empresas nacionais são das que mais utilizam os parâmetros do Global Reporting Innitiative (GRI) nos seus relatórios de Responsabilidade Corporativa, esclarece o estudo da KPMG: entre as empresas que produzem relatórios, mais de 90% fazem-no seguindo os parâmetros do Global Reporting Innitiative (GRI), considerados como o standard mais exigente a nível mundial, e aquele que tem maior reconhecimento internacionalmente. Neste aspecto, Portugal aparece em 3º lugar entre os 41 países analisados, apenas atrás da Coreia do Sul e da África do Sul.
Seguindo os padrões internacionais, as empresas portugueses têm hoje “um bom nível de reporting da sua actuação de Responsabilidade Corporativa”, estando ao mesmo nível da média mundial (também 71%), segundo o estudo da KPMG. Filipa Rodrigues, manager de Sustentabilidade da KPMG em Portugal e Angola considera que “estamos no bom caminho”, e devemos salientar a qualidade do reporting feito em Portugal, em que mais de 90% das empresas aderem aos padrões do GRI, o que é notável”. A nível mundial, 71% das empresas analisadas produzem relatórios de RC, contra os 64% que o faziam em 2011. A Europa (73%), que na edição anterior era a região que mais reportava sobre esta área, foi ultrapassada pelas Américas (76%). A Ásia-Pacífico regista também uma média de 71%, enquanto a região de África e Médio Oriente se situa nos 54%, abaixo da média verificada em 2011, devido à entrada de vários países ainda sem práticas de reporting a este nível, pela primeira vez no relatório. A análise por países indica que as melhores taxas de reporting em RC nos 41 destinos incluídos no inquérito são: França e Dinamarca, com 99 pontos (num máximo de cem), Japão, Malásia e África do Sul, com 98, Indonésia com 95 pontos, Reino Unido com 91, EUA com 86, Canadá com 83, Austrália, Holanda e Nigéria, com 82 pontos, Espanha e Finlândia, com 81 e Singapura com 80. Como referido, a quase totalidade das 250 maiores empresas do mundo (segundo a Fortune 500), produz relatórios de RC. Entre estas, integram o top ten das que mais se destacam ao nível da qualidade dos seus relatórios a A.P. Møller Mærsk , a BMW, a Cisco Systems, a Ford, a Hewlett-Packard, o grupo ING, a Nestlé, a Repsol, a Siemens e a Total. As grandes empresas que lideram a nível mundial pela qualidade dos seus relatórios são, numa escala descendente, de Itália, Espanha, Reino Unido, França, Austrália, Holanda, Alemanha, Suíça, Coreia do Sul, Japão, Estados Unidos, China/Hong Kong. Metade das organizações integra RC nos relatórios financeiros Contudo, somente 22% das empresas que fazem parte do G250 estabelecem nos seus relatórios um vínculo evidente entre o desempenho de RC e a remuneração dos executivos ou colaboradores. E apenas 23% publicam um relatório bem equilibrado, apresentando os desafios e os obstáculos inerentes à sua política de RC, bem como exemplos de sucesso. A KPMG apurou ainda que a maior parte dos relatórios de RC das empresas do G250 (87%) identifica pelo menos algumas mudanças sociais e ambientais (ou “mega-forças”) capazes de afectar os negócios. Alterações climáticas, escassez de recursos materiais e energia e combustível são os temas referidos pelos empresários com mais frequência. Finalmente, o estudo indica que são as empresas europeias quem alcança a média de pontuação mais alta ao nível da qualidade dos seus relatórios de RC (71 em cada cem empresas), enquanto as empresas nas Américas registam uma pontuação média de 54, neste item, e as da Ásia-Pacífico uma pontuação média de 50.
E, embora os investidores apostem cada vez mais nas empresas que produzem relatórios de RC, neles identificando eventuais ameaças ambientais e sociais ao seu negócio e apontando soluções para as mesmas, como alerta a KPMG, a verdade é que muitas das maiores empresas mundiais reconhecem os riscos que podem surgir devido a factores ambientais e sociais – como a escassez de recursos, alterações climáticas e ecossistemas em declínio -, mas são poucas as que avaliam o impacto que estes factores podem ter nos seus lucros. Nas palavras de Yvo de Boer, “cada vez mais investidores percebem a ameaça para o valor das empresas das forças ambientais e sociais. Cada vez mais investidores esperam transparência por parte das empresas sobre os riscos que enfrentam, os seus impactos financeiros e aquilo que estão a fazer para contrariá-los”. Certo é que estas forças sociais e ambientais também podem representar oportunidades para as empresas, “sendo que mais empresas mencionaram as oportunidades e menos os riscos nos seus relatórios de responsabilidade corporativa”, defende ainda o responsável da consultora. Sectores com maiores riscos são os que menos comunicam
Entre os sectores mais problemáticos, destacam-se, pois, os da indústria química e da indústria petrolífera: um dos que menos apresentou análises sobre a sua cadeia de valor foi o do petróleo e gás, com 14% das empresas a promoverem uma discussão detalhada sobre o assunto, 32% de forma limitada e 54% sem qualquer reflexão sobre a matéria. “Acontecimentos recentes como derrames de petróleo, catástrofes industriais e controvérsias sobre condições laborais servem para relembrar aos líderes a importância de gerir os impactos ambientais e sociais sobre a cadeia de valor”, alerta, no relatório, Yvo de Boer, acrescentando: “surpreende-me o facto de várias das maiores empresas do mundo não reportarem sobre este assunto. As empresas devem ganhar a confiança das comunidades em que se inserem, dos investidores e de outros stakeholders, garantindo-lhes que estão a dar a merecida atenção a estes assuntos. A melhor forma de fazê-lo é através dos relatórios de Responsabilidade Corporativa”. O especialista em alterações climáticas e sustentabilidade avisa ainda que “se as empresas não começarem a gerir essas questões, não terão licença para operar no mundo globalizado do século XXI”. Ultrapassando os negócios do petróleo e do gás, o sector que menos discutiu a sustentabilidade de suas acções e cadeias de fornecimento foi o financeiro, de seguros e valores imobiliários, com apenas 7% de discussão aprofundada, 44% intermédia e 49% ausente. Já no sector da electrónica e informática as empresas tendem a fornecer informações mais detalhadas no que toca à sua cadeia de valor, com 59% das empresas a discutirem a sustentabilidade das suas cadeias de fornecimento com detalhes, 35% de forma limitada e apenas 6% sem qualquer análise sobre a mesma. Por seu turno, no sector automóvel, 41% das empresas tiveram uma discussão detalhada, 41% limitada e 18% ausente. Em conclusão, e apesar das melhorias a proceder no reporting que as empresas devem fazer da sua actuação em matéria de RC, nomeadamente nas suas cadeias de fornecimento, “é encorajador ver que grandes empresas estão agora a encarar as mudanças sociais e ambientais como uma fonte de oportunidade, tanto ou ainda mais do que como uma fonte de risco, fornecendo uma visão mais completa para as partes interessadas”, como subinha Boer. A Responsabilidade Corporativa já não é, simplesmente, uma questão moral e as empresas reconhecem isso, defende. E, se finalmente os líderes empresariais olham com um olhar crítico para os riscos e oportunidades dos seus negócios, já não faz sentido que as organizações se questionem sobre se devem ou não publicar um relatório de RC. A discussão agora senta-se nos tópicos que devem ser considerados no documento e de que modo deve ser feito o seu reporting.
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Jornalista