Aguardo com ansiedade as mensagens do Papa para estas Jornadas, deste Papa Francisco que tanto nos tem interpelado e desafiado constantemente através das suas encíclicas, discursos e gestos, a caminhar com profundidade, discernimento, amor e atenção a cada pessoa e ao mundo como casa comum
POR MAFALDA SARMENTO

As Jornadas Mundiais da Juventude são muito mais do que um evento, são um enorme Encontro da Igreja que acontece porque os jovens de todo o mundo dão o passo de viajar para serem igreja presente, com entusiasmo, Amor vibrante e alegria contagiante.

As Jornadas são possíveis porque cada país que as recebe se prepara com toda a atenção, disponibilizando todos os seus meios e comprometendo-se, não só a nível institucional, mas também pessoal, a acolhê-las como quem acolhe a sua própria família, garantindo com a sua hospitalidade que todos possam viver e disfrutar desta experiência sem preocupações.

Ao longo dos três anos que antecedem as Jornadas, são muitos os corações totalmente focados neste acolhimento, com uma entrega e entusiasmo crescentes à medida que se aproximam os tão esperados dias, onde tudo se materializa e se sente de forma viva.

Era criança quando as Jornadas começaram com João Paulo II, o Papa de toda a minha infância a juventude. Com 7 anos ouvi histórias das minhas tias e tios que tinham ido às JMJ em Santiago de Compostela e com 9 anos já me senti a acompanhar de forma mais consciente o enorme impacto da ida do Papa à sua terra natal, a Polónia.

Sempre achei impressionante o facto de tantos jovens viajarem de todos os lugares, para se encontrarem com o Papa e com outros jovens, para rezarem em conjunto e para viverem de forma viva a Fé, na unidade da Igreja.

Quando chegou a altura de poder participar nas Jornadas, com 15 anos, lancei-me a Paris com um grupo de raparigas dos Clubes ligados ao Opus Dei.

Nas ruas de Paris, encontrei pessoas de todas as partes do mundo e pude começar a perceber de perto o que significa para elas crer em Deus, seguir Cristo e anunciar o evangelho em realidades tão distintas, com formas de expressão tão diferentes e tão únicas, com um mesmo Amor comum.

Foi a primeira vez que vivi a Igreja universal, a fraternidade universal vibrante e única, como diz Papa Francisco em Fratelli Tutti: “Sonhemos como uma única humanidade, como caminhantes da mesma carne humana, como filhos desta mesma terra que nos alberga a todos, cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas convicções, cada qual com a própria voz, mas todos irmãos”.

Em Paris, lembro-me que o metro parou devido à quantidade de pessoas, a rede de autocarros também deixou de funcionar, mas tudo foi vivido com enorme tranquilidade, entusiasmo e alegria por parte desta imensa comunidade, e sempre com a atenção a cada mensagem que o Papa nos deixava.

Pela primeira vez nas Jornadas, ocorreu o Festival da Juventude (que em Lisboa também terá lugar). Por toda a cidade, existiam palcos onde quase constantemente aconteciam concertos, música, dança e várias formas de expressão artística com a adesão de todos, a par do entusiasmo e espanto. Ao mesmo tempo, todas as igrejas da cidade estavam abertas e havia múltiplos momentos de oração, nas suas diferentes formas de expressão, com sons, instrumentos e cores também igualmente diversos. Poder rezar de formas tão distintas abriu ainda mais ao mundo a minha visão espiritual, enriquecendo a minha própria relação com Deus e com a Igreja.

Passados uns anos, nos caminhos de Roma repletos de pessoas, senti que a Vida se tornava visível e que a conseguíamos tocar com as nossas mãos.

O Papa João Paulo II esteve connosco o máximo de tempo possível em vários momentos. Recebeu-nos cheio de alegria em sua casa e agradecia constantemente pelo dom da juventude. Repetiu o “não tenhais medo! Abri, escancarai as portas do vosso coração. Cristo sabe o que existe dentro do Homem”.

Este era o ano do Jubileu dos Jovens e fomos dois milhões de jovens do mundo inteiro a percebermos, em cada dia, o quão importante era estarmos juntos, sermos a Igreja de hoje e de amanhã.

Em Roma, foi impressionante perceber que os jovens estavam felizes pela sua Fé, com um sentimento comum de unidade e harmonia.

O Papa pediu “fidelidade na vida e nas situações de cada dia porque é Jesus que procuram quando sonham com a felicidade, é Ele que vos aguarda quando nada do que encontram vos satisfaz, é Ele a beleza que tanto vos atrai, é Ele que vos impele a tirarem as máscaras que tornam a vida falsa, é Ele que vos lê no coração as decisões mais verdadeiras. Não ireis resignar-vos num mundo em que seres humanos morrem de fome, estão analfabetos, não têm trabalho. Defendam a vida sempre e esforcem-se com a vossa energia para tornar a terra sempre habitável para todos.”

O caminho para Tor Vergata (recinto das JMJ Roma) foi longo e muito quente, mas tínhamos constantemente voluntários e pessoas que viviam ali perto, a molhar-nos com jatos de água, a darem-nos água, para que nada nos faltasse e para que pudéssemos seguir até ao recinto em segurança. Uma massa imensa de jovens que era acolhida a cada passo que dava.

Já no recinto, consegui passar os vários quadrantes e entrar no quadrante junto ao palco onde estava um grupo de refugiados, que nada mais tinha além da roupa que vestiam. Conhecer a sua resiliência, conversar sobre a realidade das suas vidas e ainda assim ver a enorme alegria por ali estarem, marcou-me profundamente. E mesmo perante a noite fria que se fez sentir e que passaram ao relento, como todos os outros jovens, este grupo, apesar de não ter qualquer tipo de saco cama ou cobertor para se aquecer, nunca perdeu a alegria por estar ali presente. No dia seguinte a emoção foi enorme por estar junto às escadas e poder ver e ouvir o Papa tão de perto. No final, quando nós, os jovens, questionávamos se o Papa iria anunciar as próximas Jornadas, por estar já debilitado, ele, com uma voz forte e firme, anunciou as JMJ de 2002 em Toronto e todos explodimos de alegria!

As últimas Jornadas a que fui, foram as de Colónia onde fiz parte da experiência MAGIS organizada pelos Jesuítas.

Foram as primeiras Jornadas do Papa Bento XVI. A expectativa era muita porque eram as primeiras Jornadas sem o Papa João Paulo II. Bento XVI, no país onde nascera, chegou ao primeiro momento com os jovens de barco, a sorrir e a acenar, e imediatamente todos sentimos que o Amor e a Vontade que nos levavam às Jornadas era o mesmo de sempre. Bento XVI recordou-nos a importância da fé e o grande desafio que ela representa para o mundo de hoje, quando nos disse : “a hora de Jesus é a hora em que o amor vence”. O Papa discursou em vários idiomas, durante o trajeto de barco que fez ao longo do rio na cerimónia de boas-vindas, e na catedral de Colónia, onde estão guardadas as relíquias tradicionalmente atribuídas aos três Reis Magos.

Foram também momentos únicos onde, e pela primeira vez nas Jornadas, tivemos um milhão de jovens em Adoração ao Santíssimo, como se estivéssemos nas igrejas das nossas cidades mas, desta vez, numa Igreja Universal, em oração conjunta.

Em todas as Jornadas em que participei, a presença constante e essencial dos voluntários foi também marcante pela forma como tantos milhares se entregavam diariamente, nos bastidores e nas linhas da frente, somente para servir todos os que participavam, tal como vai acontecer em Lisboa nas próximas semanas. Muitas vezes, apesar da falta de recursos e já muito cansados do calor e do muito trabalho constante, transbordavam de alegria sendo um rosto muito visível Daquele que nos junta neste encontro.

Em Lisboa, toda a cidade se vai transformar e já se tem vindo a modificar para estes dias. Não duvido que teremos o Papa Francisco a sentir-se acolhido com imensa alegria por todos os que o esperam desde o momento em se começou a falar das Jornadas em Lisboa, confirmação dada pelo Papa no Panamá.

Todas as igrejas vão estar abertas e todas as paróquias vão estar ao serviço com milhares de voluntários disponíveis e em alegria. O Festival da juventude vai manter-se vibrante em vários locais da cidade, onde quem passa irá sentir-se chamado a cantar e a dançar. Acredito que os momentos musicais e artísticos de grande qualidade irão trazer ao Papa e às Jornadas uma inspiração única.

Aguardo com ansiedade as mensagens do Santo Padre para estas Jornadas, deste Papa Francisco que tanto nos tem interpelado e desafiado constantemente através das suas encíclicas, discursos e gestos, a caminhar com profundidade, discernimento, amor e atenção a cada pessoa e ao mundo como casa comum.

São muitíssimos os acontecimentos nos dias das Jornadas para que todos se possam sentir em casa. Por exemplo na Universidade Católica terá lugar a “Casa da Economia de Francisco” com diversos encontros interessantes e espaços de conversa.

Lisboa também se vai transformar em movimento, cor, línguas e sons, mas também em tudo o que são transportes públicos, gestão da água, de resíduos. etc.. Dando o seu melhor para que tudo corra da melhor forma, adaptamo-nos todos naturalmente a estas danças intensas com liberdade e Amor de quem acolhe. O Papa Francisco consegue sempre surpreender-nos e nestes dias certamente o fará. Se nos abrirmos a todas as palavras, gestos e momentos, sairemos todos transformados.

Dou muitas graças a Deus pelo caminho das Jornadas Mundiais da Juventude em Roma (1986), Buenos Aires (1987), Santiago de Compostela (1989), Czestochwoa (1991), Denver (1993), Manila (1995), Paris (1997), Roma (2000), Toronto (2002), Colónia (2005), Sydney (2008), Madrid (2011), Rio de Janeiro (2013), Cracóvia (2016), Cidade do Panamá (2019), e agora em Lisboa.

Vivam cada um destes momentos únicos de forma sincera e com entrega, com alegria e gratidão e acreditem que estes ficarão gravados no vosso coração e na vossa vida para sempre.

Mafalda Sarmento

Casada e mãe de 5 filhos. Actualmente faz parte, como investigadora e consultora, do Center for Responsible Business & Leadership, do Yunus Social Innovation Center e é Deputy Director de Sustentabilidade na CATÓLICA-LISBON. É co-fundadora e sócia da Positive Benefits, tendo trabalhado igualmente na Girl Move. No IES-SBS formou e orientou mais de 2 ml empreendedores sociais na Europa e África e é avaliadora de projectos da Fundação La Caixa Iberia.