Para os pais e estudantes, a escolha da escola “aparece como um instrumento de dinamização da qualidade” e de “diversidade e multiculturalidade” da oferta educativa. Para os professores, garante a escolha “de diferentes métodos de ensino” segundo as suas convicções, a mobilidade em termos de emprego e o mesmo regime profissional, em escolas privadas ou estatais. Em entrevista ao VER, o professor Frans de Vijlder defende que na Holanda, país pioneiro no princípio da liberdade de educação, a evolução do sistema educativo ao nível da autonomia financeira, pedagógica e curricular das escolas tem sido acompanhada por uma crescente responsabilização das mesmas
O Fórum para a Liberdade de Educação (FLE) trouxe a Portugal, no passado dia 29 de Fevereiro, dois especialistas em direito da educação e em financiamento de políticas sociais, que vieram explicar a estrutura e as regras de funcionamento do sistema educativo holandês. No encontro “Educação na Holanda – Um modelo social de serviço público com fornecimento privado”, promovido pelo FLE, Paul Zoontjens, do Conselho de Educação da Holanda e Frans de Vijlder, professor na Universidade de Arnhem-Nijmegen, corroboraram a ideia “existente em Portugal” de que neste país o sistema público tem conseguido manter a sua qualidade, podendo concluir-se, segundo o FLE, que “isso se deve a uma enorme flexibilidade e avaliação rigorosa do sistema e ao inexistente preconceito entre escola estatal e privada”. Na Holanda o financiamento é atribuído à escola que melhor presta o serviço público, conforme a convicção dos pais, mesmo que se trate de uma escola privada. A aceitação de que as escolas não são neutras e que os professores devem ter liberdade para expressarem as suas convicções, exigindo igualdade de tratamento entre escolas e professores, levou a uma grande dinamização e variação de escolas, concluíram ainda os especialistas. No entanto, e segundo sublinha o FLE, “embora apenas um terço dos holandeses se auto-interpretem como crentes, dois terços colocam os filhos em escolas religiosas, porque querem dar uma educação aos filhos assente em valores”. Valores que apelam à liberdade num sistema “muito claro e simples no seu funcionamento”, defende a organização. Gestão cabe às escolas Dando resposta às necessidades educativas, ao longo do tempo, as regras de financiamento foram actualizadas, reformularam-se políticas educativas de controlo de qualidade, institucionalizaram-se regras para a formação e avaliação de professores e desenharam-se novos instrumentos para maior transparência do sistema. Neste percurso, o Estado libertou-se da gestão das escolas para se concentrar na aferição da qualidade educativa e na supervisão do sistema educativo no seu todo. Em 2008, o Governo implementou o programa “Continuing Improving”, que tem como objectivo transformar as más escolas em boas escolas e as boas em escolas ainda melhores, incidindo sobretudo na aplicação de novas regras para a contratação e formação de professores e no reforço da transparência e prestação de contas. Em entrevista ao VER, Frans de Viljder, professor de Governance e de Dinâmicas de Inovação nos Sectores Sociais, na Universidade de Arnhem-Nijmegen (Holanda), sublinha que embora a implementação da liberdade de educação naquele país tenha sido consagrada para a pacificação das diversas religiões, “o princípio tem vindo a ser adaptado e foram sendo introduzidos mecanismos que demonstram as preocupações de equidade no sistema. Com uma ponderação no financiamento a alunos de extractos sociais mais baixos ou com necessidades especiais”. A Holanda dispõe de um dos mais antigos sistemas nacionais educativos do mundo baseados na liberdade de educação. Quais são as principais características deste sistema educativo e que evolução teve, em quase 150 anos?
Este sistema, mantendo os seus pilares, tem evoluído no sentido de uma crescente autonomia financeira, pedagógica e curricular das escolas, acompanhada de uma, igualmente, crescente responsabilização das escolas. O facto de o Estado/Governo, atribuir esta autonomia e responsabilização, leva por exemplo a que o hoje existam os corpos administrativos e de gestão das escolas, que são responsáveis pela concretização dos ambiciosos planos estabelecidos para as suas escolas e que aparecem como as entidades negociadoras com os professores e sindicatos. Esta camada de administrações escolares permite que o Governo se concentre cada vez mais na qualidade e na avaliação de escolas, e que possa introduzir, de forma flexível e atempada, instrumentos que melhoram a transparência e a escolha da mesma. E quais são as grandes vantagens dessa escolha, nomeadamente para os estudantes, para os pais e para os professores? Para os professores, garante que estes encontram escolas onde podem ensinar de acordo com as suas convicções e com livre expressão das suas opiniões, aumenta a possibilidade de trabalharem em escolas com maior diversificação e de escolherem diferentes métodos de ensino. Por fim, garante aos professores das escolas privadas e estatais o mesmo regime profissional, aumentando, assim a sua mobilidade em termos de oferta de emprego. De que dados dispõem que corroborem o princípio de que a liberdade de educação é um meio de aumentar a competitividade entre os sistemas escolares? É assim que na Holanda, no sistema de serviço público que é composto por 2/3 de escolas privadas, encontramos escolas de serviço público que seguem diferentes métodos de ensino, que oferecem diferentes currículos (alguns mais vocacionados para as artes, outros para as ciências ou para o desporto) e até muitas escolas bilingues: as mais comuns são holandês/inglês, esperando-se para breve a abertura da primeira escola holandês/chinês. Ou seja, na Holanda o sistema de serviço público consegue preparar os seus jovens para um ambiente internacional, sem ser preciso o recurso às chamadas escolas de elite. Em consequência, na Holanda não existe espaço para um mercado de escolas privadas, no sentido de escolas que recebem propinas e que podem fazer lucro, porque as escolas públicas competem entre si.
Como comenta a afirmação, “originalmente, a liberdade de educação na Holanda não se baseou tanto em princípios liberais de equidade, mas antes na liberdade religiosa” (Patrinos, 2002)? Hoje, os holandeses apreciam o seu sistema de ensino, e encaram a escolha como um direito inquestionável, aceitando com naturalidade que a concorrência entre escolas as obriga a melhorar continuamente e a encontrar uma identidade própria. Numa Europa a braços com tantas dificuldades e com um sistema de Segurança Social em perigo, quais são os argumentos de peso que sustentam os benefícios da liberdade de educação? Como sabe, Portugal vive a pior recessão dos últimos trinta anos. As escolas privadas são dispendiosas e recebem poucos financiamentos estatais. Já as públicas têm de lidar com orçamentos baixos, um número crescente de alunos e professores desmotivados. Não se podendo comparar as situações portuguesa e holandesa, o que aconselharia Portugal a fazer em matéria de educação? Depois, legislaria no sentido de um reforço da gestão e administração das escolas, que passariam a tratar de toda a gestão de pessoal nas mesmas. Incentivar estas administrações escolares para fazerem a distinção entre bons e maus professores dignificaria socialmente a profissão e seria um estímulo para que estes se sintam incentivados. Se o custo por aluno for correctamente estabelecido e as medidas de prestação de contas e transparência rigorosas, o sistema de serviço público melhorará e no seu todo poderá ficar mais barato do que o actual. Quais são as principais características do programa holandês “Continuing Improving”? Ao mesmo tempo o Estado tem de melhorar os sistemas de avaliação da qualidade, de supervisão e monitorização das escolas e de apoio às que estão em dificuldade. É impressionante verificar a rápida boa resposta das escolas: todos os anos temos escolas com resultados a matemática e a português abaixo do mínimo nacional. É-lhes apresentado um plano de recuperação, estudado para cada uma delas, que as escolas aceitam e cumprem com altas expectativas e com a consciência de que, se no prazo de dois anos não regressam a resultados positivos de forma sustentada, o Estado terá de as encerrar. Graças a esta medida, muito poucas escolas têm sido encerradas e mantemos boas escolas. A Internet está a alterar, para o bem e para o mal, as capacidades cognitivas das crianças. Muito especialistas dizem agora que os sistemas educativos terão de ser actualizados drasticamente, para corresponder às novas realidades que definem este novo ambiente intelectual. Qual é a sua opinião?
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Jornalista