Em tempos conturbados, apostar nas competências dos trabalhadores e na transmissão de conhecimento poderá traduzir-se em ganhos de eficiência adicionais para a empresa. Apesar de não existir ainda, em Portugal, um universo alargado de organizações que apostam em universidades corporativas, o cenário tem-se vindo a ampliar nos últimos anos. A Heidrick&Struggles explica a evolução do conceito, a importância que este pode assumir nas empresas e os passos que devem ser dados para a sua implementação
POR HELENA OLIVEIRA
A General Electric e a General Motors, só para dar dois dos exemplos mais significativos, foram das primeiras organizações a apostar nas chamadas universidades corporativas. A nível global, como tem sido a evolução deste conceito?
O fenómeno das Universidade Corporativas (UC) tem-se ampliando nos últimos 15 anos, através da desmultiplicação e aprofundamento das actividades dos departamentos de formação. É um conceito que tem ganho bastante expressão, nomeadamente em empresas que se caracterizam por serem detentoras de um know-how específico. A evolução dos departamentos de formação, atingiu estágios de maturação que geraram massa crítica para o surgimento e consolidação do fenómeno das universidades corporativas.
A partir de um foco no levantamento de necessidades, delinearam-se catálogos e conteúdos para minimizar gaps. Estes conteúdos passaram a ser alinhados aos processos de avaliação de desempenho, propiciando uma visão mais contínua de melhoria das competências e do desempenho. Com isto, intensificou-se o ênfase nos programas de desenvolvimento, instaurando-se uma visão de longo-prazo e de processo contínuo de desenvolvimento. Esses programas também evoluíram, passando de um foco exclusivamente técnico para um foco mais comportamental e vivencial.
Com o aumento da competitividade e a crescente procura pela diferenciação de conhecimentos, iniciou-se a procura de ganhos de eficiência, centrando-se os esforços na avaliação dos investimentos na formação e qual o seu retorno para a empresa.
O conceito de Universidade Corporativa surge, assim, graças à uma maturação dos departamentos de formação, com o objectivo de transferir as estratégias de negócio para o interior do sistema de desenvolvimento, reforçando a aprendizagem contínua e gestão de conhecimento como factores de sustentabilidade e como forma para reforçar a cultura empresarial. Permite, igualmente, uma maior optimização de custos, com uma maior aderência às necessidades de negócio, alavancando o crescimento sustentado e a promoção da cultura de empresa.
E em Portugal? Como começou o “movimento” e que principais transformações são passíveis de assinalar no panorama nacional das UC nos últimos anos?
Desde 2004 que temos em Portugal empresas que apostaram na criação de Universidades Corporativas e assiste-se cada vez mais a um movimento voltado para a criação de circuitos internos de passagem de conhecimento e reforço de cultura empresarial. Assistimos, nas grandes empresas, a colaboradores que são detentores de conhecimentos específicos associados à sua área de negócio core, sentindo-se cada vez mais a necessidade de transferir esse conhecimento a toda a rede organizacional. As organizações portuguesas e os seus sistemas de formação foram influenciados simultaneamente por quatro grandes forças que, ao confluir, sustentaram o fortalecimento do fenómeno das Universidades Corporativas: a emergência da economia do conhecimento e necessidade de actualização e aprendizagem acelerada e contínua (Learning Organization); os novos modelos de educação com maior ênfase na aprendizagem prática e contínua e na auto-responsabilização; a influência das novas tecnologias de informação e comunicação sobre as iniciativas de formação e desenvolvimento; e, por fim, a maior frequência e rapidez das reestruturações internas nas empresas, levando à necessidade de criar e manter uma identidade, a par de um compromisso corporativo sólido. Essa tendência crescente a nível nacional pode ser vista como uma consequência do crescente reconhecimento pelas organizações do poder da aprendizagem e do conhecimento como factores de vantagem competitiva para a sustentabilidade do negócio.
Como nem sempre são coincidentes, qual a definição mais correcta de uma universidade corporativa?
A Universidade Corporativa é uma entidade que promove o desenvolvimento dos diversos stakeholders da organização, de forma a propiciar o atingir dos objectivos da empresa, através da criação de uma cultura de aprendizagem e gestão do conhecimento. A Universidade Corporativa é um modelo de educação corporativa, que desenvolve competências críticas através de programas de formação e desenvolvimento, alinhados com a estratégia da empresa. Assim, promove-se internamente um sistema de educação sustentável que propicia o desenvolvimento de competências consideradas críticas para a viabilização da estratégia de negócio.
Que grandes forças se conjugaram para fortalecer o fenómeno das universidades corporativas?
Sem dúvida que a gestão interna do conhecimento foi uma dessas forças: a internalização do conhecimento próprio de cada empresa e a criação de redes sustentadas de transmissão desse mesmo conhecimento. Outra força é o próprio desenvolvimento de competências, fomentando a estimulação de competências soft e hard críticas para a viabilização da estratégia, de forma sistemática e contínua. Em ligação a esta força, acelerar a melhoria do desempenho ao mobilizar os colaboradores a colocar as estratégias de aprendizagem em aplicação. Outra força muito importante foi a comunicação da missão, visão e estratégia da empresa de forma eficaz, com vista a reforçar e perpetuar comportamentos alinhados à cultura e aos valores corporativos.
Que “peso” poderá representar a existência de uma UC na estratégia de uma empresa?
Podemos enunciar a gestão mais eficaz do investimento em educação, com valor acrescentado para os resultados do negócio; os impactos substanciais na imagem da organização como empregador; o aumento do envolvimento dos colaboradores e significativas melhorias na retenção, atracção e desempenho e consequentemente o “peso” da maior competitividade e sustentabilidade empresarial. A existência de uma Universidade Corporativa pode ser vista como uma consequência do crescente reconhecimento pelas organizações do poder da aprendizagem e da gestão do conhecimento como factores de vantagem competitiva.
E quais os seus principais factores de sucesso?
O envolvimento da alta direcção é um factor crítico de sucesso, de forma a potenciarmos o alinhamento estratégico necessário. Os programas devem ser concebidos a partir das competências críticas do negócio. Deve existir fluidez nos canais de comunicação e feedback estabelecidos com os vários stakeholders envolvidos no projecto, criando deste modo, um verdadeiro alinhamento organizacional, reforçando a inserção na cultura empresarial. Deve existir um foco na eficiência operacional, com a combinação de metodologias e tecnologias que permitam uma gestão eficaz. E um dos factores críticos de sucesso mais negligenciados, prende-se com a avaliação da eficácia dos programas desenvolvidos, sendo fulcral a definição de indicadores de resultados que nos permitem redefinir, moldar e reestruturar o rumo da própria Universidade Corporativa.
Em Portugal, que empresas têm verdadeiras universidades corporativas (e não meros programas de formação)?
Da experiência que temos no mercado, podemos citar a Universidade BES, focada no desenvolvido de expertise técnico e comportamental e a Universidade EDP, com escolas de Directivos a funcionar associadas às áreas de negócio do Grupo.
Por outro lado, assente em três pilares – avaliação, formação e progressão, é possível referenciar a Escola de Negócios do Grupo Lena, que visa possibilitar a auto-formação, reforçar a cultura corporativa e desenvolver competências individuais num curto espaço de tempo. Na Mota-Engil, existe a Active School criada em 2008, que assegura a competitividade e a solidez do Grupo Mota-Engil, através do desenvolvimento de competências e transferência de conhecimentos, assim como a disseminação dos valores e a da cultura do Grupo. Também na Vortal, existe uma academia dedicada ao desenvolvimento do capital humano no domínio da gestão, da negociação e venda de bens e serviços apoiados por plataformas electrónicas. Referimos também a empresa Urbanos como exemplo de uma Universidade que se foca na retenção dos melhores colaboradores, promovendo competências específicas que permitem melhorar o desempenho dos mesmos.
Como pode a Heidrick&Struggles contribuir para o desenvolvimento de uma UC?
A H&S ao conhecer as principais tendências encontradas nos mercados internacionais e nacionais, e da experiência adquirida face ao ciclo integrado de gestão do activo humano, nomeadamente no desenvolvimento de competências estratégicas, trabalha com os seus clientes desde o desenho do projecto de uma Universidade Corporativa com a definição de todos os componentes necessários, até a sua implementação e monitorização.
Neste domínio, o nosso valor acrescentado vai para além do diagnóstico e levantamento de necessidades e respectivo plano de formação normalmente construído nas empresas. Procuramos conceptualizar soluções formativas e desenvolvimento que complementem a oferta da Companhia.
Os nossos programas decorrem da nossa análise de potencial e, no seu expoente máximo, podemos apoiar os nossos clientes na conceptualização e implementação da sua Universidade Corporativa. Procuramos sempre a definição de um modelo adequado às condições de cada empresa, tendo como referência as principais tendências de actuação nesta área, nunca esquecendo o ajustamento à realidade, à cultura e à estratégia de cada empresa. Somos consultores de negócio e colocamos “as lentes de Recursos Humanos”, onde o nosso enfoque é impactar positivamente os resultados dos nossos clientes através de uma gestão eficaz de talento. Estamos focados na valorização do activo humano com alavanca de crescimento sustentado da organização. A universidade corporativa é um meio que contribui para um fim: cultura enraizada, treino de hard e soft skills, fornecimento de instrumentos para aumentar a produtividade dos colaboradores e obter maior proficiência e maior achievement de objectivos individuais e corporativos.
De uma forma resumida, construímos a ponte entre o desenvolvimento do capital humano e das estratégias de negócio da empresa, fomentando a gestão do conhecimento interno e o foco permanente na aprendizagem contínua e desafiante.
Componentes cruciais para a criação de uma universidade corporativa |
A partir da definição do modelo robusto e sólido, a consolidação da Universidade Corporativa pode ser atingida de várias formas, de acordo com as prioridades do negócio. A ampliação de conteúdos, públicos, parcerias e infra-estrutura, são alguns dos diferentes caminhos possíveis para atingir esse estágio de maturidade. Portanto, na definição da estratégia de implementação, deve-se ter em mente perspectivas de curto, médio e longo prazo.
Todavia, e seguindo as melhores práticas nacionais e internacionais, são vários os componentes que devem ser considerados desde o primeiro momento de discussão da implementação de uma Universidade Corporativa:
- Definir objectivos, missão e pilares da UC, alinhando o seu posicionamento com os objectivos do negócio;
- Definição de Governance com a associação das principais responsabilidades;
- Identificação dos públicos/segmentos que se pretende atingir e que tipos de conteúdos serão trabalhados, bem como que metodologias e meios de ensino se podem adoptar;
- Identificação das parcerias que podem ser realizadas e que podem aportar mais valor;
- Definição da infra-estrutura física e tecnológica necessária para a gestão da UC, assim como a estratégia de financiamento e a responsabilidade pela gestão orçamentária da Universidade;
- Mapeamento dos indicadores para acompanhar o investimento efectuado e avaliação do impacto nos resultados internos e externos;
- Estabelecimento de estratégias de comunicação e marketing para a Universidade Corporativa.
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