No início de um novo ano, somos naturalmente levados a refletir sobre o que passou e, mais importante, a olhar para o que está por vir. O Ano Novo traz consigo não só a sensação de um novo começo, mas também a responsabilidade de reavaliar as nossas ações, escolhas e, acima de tudo, o nosso impacto no mundo. Coincide com o Dia Mundial da Paz (1º de janeiro), data que nos convida a pensar em como podemos ser, individual e coletivamente, agentes de transformação positiva
POR MAFALDA SARMENTO
Num mundo marcado por tensões geopolíticas, crises climáticas e instabilidade económica, o setor empresarial encontra-se numa posição única. As empresas não são apenas agentes económicos; são também motores de mudança social e cultural. E, mais do que nunca, precisam de equilibrar três pilares essenciais: propósito, sustentabilidade e competitividade, sem nunca perder de vista um elemento fundamental: os valores humanos que muitas vezes aprendemos dentro das famílias.
A família sempre foi um espaço de encontro, cuidado, resiliência e propósito compartilhado. Nas palavras de José Tolentino Mendonça, “A família é o lugar onde aprendemos o sentido do outro, onde descobrimos que a vida só faz sentido quando é partilhada”.
Este modelo pode, e deve, ser aplicado às empresas. Uma organização que opera como uma “família global” entende que:
- Cada colaborador é mais do que um recurso; é uma pessoa com sonhos, medos e um desejo intrínseco de pertença.
- O sucesso sustentável constrói-se através da cooperação e não da concorrência predatória.
- Relações baseadas na confiança, respeito e cuidado geram não só um ambiente de trabalho saudável, mas também resultados mais sólidos e duradouros.
Estudos da Harvard Business Review mostram que as empresas que cultivam culturas organizacionais baseadas na confiança e no cuidado têm 20% menos de rotatividade de funcionários e 30% mais de engagement.
No entanto, agir como uma “família global” não significa perder o foco nos objetivos estratégicos ou na competitividade. Significa reconhecer que o verdadeiro sucesso vem quando todos se sentem parte de algo maior, quando há um propósito comum que transcende números e relatórios.
Lucro e propósito não são opostos; pelo contrário, reforçam-se mutuamente quando bem alinhados. Empresas que têm um propósito claro, autêntico e bem comunicado não só atraem e retêm melhores talentos, mas também ganham clientes mais leais e conscientes.
Além disso, a confiança nas empresas sofreu flutuações significativas. De acordo com o Edelman Trust Barometer 2024, 61% das pessoas acreditam que as empresas devem liderar mudanças sociais e ambientais significativas – uma expectativa que vai muito além do lucro.
Quando pensamos em paz, muitas vezes associamo-la exclusivamente ao campo diplomático. No entanto, a paz também se constrói no dia-a-dia das empresas. Ambientes de trabalho justos, inclusivos e colaborativos são pequenos microcosmos de paz. As práticas empresariais responsáveis, como a governação transparente, o combate às desigualdades salariais, a igualdade de género e a inclusão, são formas concretas de contribuir para sociedades mais pacíficas.
O Fórum Económico Mundial (2024) reforça que:
- Empresas com liderança responsável e transparente têm 45% mais resiliência em tempos de crise.
- Ambientes corporativos que priorizam o bem-estar mental e emocional dos colaboradores relatam um aumento de 35% na produtividade.
Isto leva-nos a uma importante reflexão: a paz começa onde há justiça. E a justiça começa nas decisões diárias dos líderes empresariais.
A sustentabilidade deixou de ser um tema acessório para se tornar um eixo central de competitividade e inovação. Empresas que integram práticas ESG (Environmental, Social and Governance) não só mitigam riscos, como também se posicionam como líderes em um mercado cada vez mais exigente.
No entanto, a sustentabilidade não pode ser apenas uma estratégia para melhorar a imagem pública ou uma exigência para os investidores. Tem de ser um compromisso genuíno com o futuro — com as gerações vindouras, com as comunidades locais e com o planeta.
As famílias ensinam-nos que amor, cuidado e responsabilidade mútua não são custos, são investimentos. As empresas que operam como famílias entendem que:
- Cuidar dos funcionários é cuidar do próprio negócio.
- Construir relações de confiança fortalece a resiliência organizacional.
- Ser um pacificador no mercado contribui para a estabilidade global.
Como disse recentemente José Tolentino Mendonça:
“Não podemos ser apenas espectadores do mundo. Temos de ser artesãos do futuro, com mãos que saibam unir, reconstruir e partilhar.”
As empresas têm, portanto, a oportunidade — e o dever — de ter uma visão mais ampla do sucesso. Um sucesso que não se mede apenas nos resultados financeiros, mas também no impacto positivo que deixam nas vidas que tocam.
Finalmente, há uma dimensão essencial que não pode ser ignorada: as empresas têm o poder de criar laços que transcendem fronteiras.
No cenário atual de polarização e divisão, as empresas têm o potencial de se tornarem pontes – conectando pessoas, culturas e mercados de forma ética e respeitosa. Ao adotar práticas de comércio justo, apoiar cadeias de abastecimento transparentes e promover um sentimento de pertença, as empresas podem agir como verdadeiras famílias globais, onde o sucesso de uma não depende do fracasso da outra, mas do crescimento coletivo.
“Não podemos resolver problemas globais com soluções fragmentadas. Precisamos de cooperação, solidariedade e coragem coletiva.» (António Guterres, Secretário-Geral da ONU)
O Ano Novo desafia-nos a sermos mais responsáveis e mais humanos. À medida que o Center for Responsible Business & Leadership entra neste novo ciclo, é renovado o compromisso de ser um espaço de reflexão, ação e inspiração para líderes empresariais que acreditam em um mundo melhor – não como uma utopia distante, mas como uma construção diária.
Que cada empresa possa encontrar, no equilíbrio entre lucro, propósito e impacto positivo, o verdadeiro significado do seu sucesso. Que cada decisão tomada em 2025 traga em si o potencial de construir não só melhores resultados financeiros, mas também um mundo mais justo, sustentável e pacífico.
Feliz Ano Novo!
Que 2025 seja um ano de impacto positivo para todos nós.
(Artigo da Newsletter 274 do Center for Responsible Business and Leadership da CATÓLICA-LISBON)
Casada e mãe de 5 filhos. Actualmente faz parte, como investigadora e consultora, do Center for Responsible Business & Leadership, do Yunus Social Innovation Center e é Sustainability Officer da CATÓLICA-LISBON. É co-fundadora e sócia da Positive Benefits, tendo trabalhado igualmente na Girl Move e IES-SBS. É tambem avaliadora de projectos da Fundação La Caixa Iberia e membro da FAM Foundation.