Na sequência do que tem vindo a acontecer em várias nações europeias, Portugal assinou recentemente a “sua” Carta para a Diversidade, que pretende promover junto de empresas e organizações a criação de condições que facilitem a compreensão e o respeito pelas características individuais de cada colaborador, tornando mais igualitária a sociedade. Em linha com o trabalho já iniciado pela Comissão Europeia, este documento resulta de uma parceria entre o GRACE e a Fundação Aga Khan. Desafiar a população a encarar a diferença como um desafio, e não como um risco, é um dos principais objectivos desta Carta
POR
MÁRIA POMBO

Com o objectivo de promover a criação e desenvolvimento de políticas e medidas que potenciem a diversidade no seio das empresas e organizações de diversos sectores, independentemente de terem ou não fins lucrativos, foi recentemente assinada a Carta Portuguesa para a Diversidade. Este documento conta com a subscrição de variadas entidades empregadoras sediadas no nosso País e é o resultado de uma parceria entre o Grupo de Reflexão e Apoio à Cidadania Empresarial (GRACE) e a Fundação Aga Khan. O esforço conjunto de tornar a sociedade portuguesa mais igualitária e inclusiva conta ainda com o apoio do Alto Comissariado para as Migrações (ACM), do Instituto Nacional para a Reabilitação (INR), da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) e da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE).

Os promotores do documento entendem que promover a diversidade é estimular “o reconhecimento, o respeito e a valorização da(s) diferença(s) entre as pessoas, relativamente ao sexo, identidade de género, orientação sexual, etnia, religião, credo, território de origem, cultura, língua, nacionalidade, naturalidade, ascendência, idade, orientação política, ideológica ou social, estado civil, situação familiar, situação económica, estado de saúde, deficiência, estilo pessoal e formação”.

De acordo com o texto da Carta, este princípio representa uma mais-valia para as próprias organizações, tendo em conta que estimula a inovação das mesmas, bem como a atracção e retenção de talento, aumentando a satisfação pessoal e o empenho dos colaboradores. O facto de uma empresa contar com uma equipa que tem diversos backgrounds e perspectivas, e cujas diferenças e semelhanças são utilizadas em prol de uma organização, aumenta exponencialmente a sua competitividade face à concorrência.

Criar condições que facilitem a compreensão, o respeito e a promoção da diversidade, reconhecendo e valorizando as peculiaridades de cada colaborador, e promover a igualdade de tratamento e oportunidades em todas as fases, desde o processo de recrutamento até à progressão para cargos de chefia, são algumas das cláusulas presentes na Carta e com as quais as organizações aderentes se comprometem.

Valorizar as características únicas e o mérito de cada colaborador, permitindo não só o crescimento económico da organização como também a satisfação e o desenvolvimento pessoal e intelectual, tanto de colaboradores como de clientes, fornecedores e parceiros, num compromisso assumido com a própria sociedade, são igualmente compromissos que figuram neste documento. Por fim, as empresas e organizações sociais devem analisar e partilhar as actividades desenvolvidas e os resultados atingidos no âmbito desta Carta, promovendo assim, junto das restantes entidades signatárias e da própria sociedade, a reflexão, aprendizagem e desenvolvimento de mecanismos que impulsionam a diversidade.

Este esforço conjunto, que pretende ir para além da criação e adopção de medidas avulsas de inclusão, procura mudar realmente a forma de agir e pensar das organizações. Através de variadas iniciativas, do reconhecimento de boas práticas e da concepção de ambientes efectivamente inclusivos e favoráveis a todas as pessoas, este documento constitui-se como o início de um percurso que, de acordo com os seus signatários, promove a verdadeira diversidade.

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Rumo a uma sociedade mais justa e inteligente

Com esta Carta, Portugal estabelece o seu compromisso de lutar contra a discriminação e construir uma sociedade mais justa, coesa e heterogénea, contribuindo para o crescimento inteligente e sustentável, tanto da sociedade portuguesa como da própria UE. O nosso País segue, assim, os passos já dados pela Comissão Europeia, a qual disponibiliza diversos documentos que podem ser utilizados pelos Estados-membros para encorajar e orientar a implementação das diversas medidas.

Num guia prático para implementar a Carta, a Comissão Europeia explica pormenorizadamente a importância da diversidade e descreve todos os passos que as empresas devem dar para a promover, sublinhando que este princípio tem por base “a tolerância, o respeito e a consideração que cada organização tem perante as características particulares de cada colaborador, valorizando as suas competências e não discriminando em função do género, da orientação sexual, da incapacidade, da idade, da religião ou da raça”.

[pull_quote_left]O facto de uma empresa contar com uma equipa que tem diversos backgrounds e perspectivas aumenta exponencialmente a sua competitividade[/pull_quote_left]

No entanto, e conforme as especificidades regionais, cada nação pode acrescentar parâmetros que considera discriminatórios e contra os quais pretende lutar: França, por exemplo, assinou a sua carta, comprometendo-se a garantir que nenhum colaborador das organizações aderentes será discriminado também em função da sua opinião política, aparência, nome ou local de residência.

Adicionalmente, e porque se trata de um projecto ambicioso, o mesmo guia sugere que cada país escolha uma direcção e um objectivo principal, reforçando que é preferível dar um pequeno passo e obter resultados, alargando progressivamente o foco de acção, a seguir diversas direcções e não obter qualquer resultado satisfatório.

Tal como Portugal fez recentemente, ao longo dos últimos anos outros 15 países europeus (de que são exemplo França, Espanha, Reino Unido e Dinamarca) já assumiram o compromisso de promover a diversidade, empenhando-se em contribuir para uma sociedade mais inclusiva, ética e sustentável. Nas organizações empresariais e societárias dessas nações, a redução do número de reclamações internas e externas, bem como da rotatividade do pessoal, e o aumento do empenho dos trabalhadores são alguns dos efeitos positivos já apurados.

Complementarmente, verificou-se uma melhoria ao nível do atendimento e satisfação dos clientes e em termos de atitude e conduta interna, registando-se também um fortalecimento da ligação entre as diversas actividades praticadas pelos trabalhadores e a estratégia da empresa, e ainda uma melhoria das abordagens de marketing.

Uma Europa multicultural que exige múltiplas medidas

07042016_Diversidade2A CSR Europe, a principal rede europeia de empresas para a Responsabilidade Social Empresarial, associou-se igualmente a este movimento. Num artigo recente, Davide Cesário Castro, membro desta rede, explica que, na mudança de milénio, “a crise económica originou uma rápida transformação demográfica na União Europeia, marcada por abundantes fluxos migratórios e a qual resultou num conjunto de desafios e oportunidades de inovação”, obrigando os governos dos diversos países a adoptarem novas políticas e medidas não discriminatórias. Transformada num continente multicultural, a Europa exige, assim, que os governos e as empresas de cada país adoptem medidas promotoras de diversidade e de heterogeneidade, como aquelas que estão definidas na Carta acima apresentada.

Por outro lado, Joana Vassilopoulou, professora universitária de Estratégia e Responsabilidade Social Corporativa na Kent Business School, explica que “muitos responsáveis pelo recrutamento de novos funcionários seleccionam os candidatos à sua imagem, vendo a diferença como um risco e não como um desafio”, considerando que “poderá ser mais fácil trabalhar com pessoas que partilham os mesmos ideais e pontos de vista”.

[pull_quote_left]Tal como Portugal fez recentemente, outros 15 países europeus já assumiram o compromisso de promover a diversidade[/pull_quote_left]

A especialista em responsabilidade social corporativa explica ainda que “este preconceito implícito não existe apenas na fase do recrutamento mas também no quotidiano de diversas organizações, afectando a progressão na carreira e os benefícios salariais dos colaboradores”. No entanto, uma das principais consequências desta atitude é o facto de a mesma “impedir que seja extraído de cada trabalhador todo o seu potencial”, prejudicando a própria empresa.

Promover a diversidade não é, então, apenas “fazer o bem” mas também, e principalmente, permitir que esse “bem” seja benéfico para a empresa. Diminuir o preconceito face à diferença aumenta a satisfação dos colaboradores com a organização onde trabalham e impulsiona o compromisso que sentem ao representá-la. Complementarmente, o facto de haver uma equipa com diversas experiências de vida e pontos de vista aumenta a probabilidade de criar um produto ou ideia completamente inovadores e diferentes dos que existem até ao momento. Todos juntos, estes factores permitem que a empresa ou organização aumente o lucro, a credibilidade e o grau de competitividade face às restantes, e que a sociedade se torne mais justa e inclusiva.


“Um marco histórico para o país e para a sociedade”

Enquanto promotor deste movimento em Portugal, o GRACE sublinha a importância de contribuir para uma sociedade que promove a aceitação da diferença e da individualidade de cada pessoa, consciente do longo caminho que ainda há a percorrer.

Portugal faz agora parte do grupo de países que assumiram o compromisso de respeitar, valorizar e optimizar a diversidade, seguindo as recomendações e esforços da Comissão Europeia, e é com grande satisfação que o GRACE integra e lidera este processo desde o primeiro momento.

A assinatura da Carta Portuguesa para a Diversidade por parte de 80 organizações públicas e privadas representa um marco histórico para o País e para a sociedade, na medida em que promove a aceitação de cada pessoa, da diferença e da individualidade que cada cidadão encerra, como factor de desenvolvimento colectivo e um potencial para as empresas e outras organizações.

Há um longo caminho a percorrer, mas a Carta representa um passo importante para o aproveitamento das potencialidades da diversidade nas organizações!

GRACE – Grupo de Reflexão e Apoio à Cidadania Empresarial


Jornalista