Uma equipa do Fundo Monetário Internacional (FMI) publicou a 18 de Janeiro um relatório sobre Portugal no qual a conclusão essencial é que “mais crescimento é um assunto de urgência” e onde apresenta quatro cenários de longo prazo até 2030 em função do impacto do que designa por reformas estruturais
O relatório foi publicado num “Selected Issues Paper” do FMI (Country Report 13/19), autorizado pelo Departamento Europeu do Fundo, mas responsabiliza apenas a equipa que o produziu composta por Manuela Goretti, Huidan Lin, Stephane Roudet, Marcos Souto, Ivanna Vladkova Hollar, Andrea Lemgruber, Mauricio Soto e Alvaro Piris. Coincidiu com a publicação pelo FMI do documento final sobre a 6ª revisão regular do programa de resgate pela troika e do relatório sobre a Consulta ao abrigo do Artigo IV (Country Report 13/18), mas tratam-se de documentos distintos. Neste artigo, apenas, abordamos a primeira parte do relatório que se intitula “How Fast Can Portugal Grow”. Três indicadores fulcrais Três indicadores fulcrais são sublinhados no estudo: o comportamento do hiato do produto (mede a diferença entre o PIB efectivo e o PIB potencial em % deste último); a evolução do índice de produtividade total dos factores (conhecido pelo acrónimo em inglês FTP, e que mede a quantidade de produto que se obtêm com uma unidade ponderada de todos os factores de produção) que dá uma ideia da produtividade de uma economia; e a trajectória do desemprego estrutural (que engloba todos os que não realizam qualquer actividade, devido à falta de emprego que advém de mudanças estruturais da economia, não sendo, por isso, uma situação da responsabilidade directa dos indivíduos). O hiato negativo do produto (ou seja, abaixo do potencial) subiu para 4% em 2012, um nível similar a 2009. Segundo as previsões do FMI, no “World Economic Outlook” de Outubro passado, este hiato negativo deverá ampliar-se para 4,6% em 2013. O hiato do produto só deverá aproximar-se do potencial em 2017, segundo o estudo que estamos a analisar. O desemprego estrutural está em 13% (ou seja, mais de 80% do desemprego total) e o crescimento da FTP é negativo (ou seja, decresceu), situação que se vive desde o ano 2000. O período de crescimento mais alto da produtividade da nossa economia foi entre 1986 e 1992, com este índice a subir 2,25%, em média anual. Mas exceptuando essa fase depois da adesão à CEE, a FTP decresceu entre 1974 e 1979 (no período politicamente conturbado a seguir à Revolução do 25 de Abril), atingiu o ponto mais baixo em 1984 (com um decréscimo de 4%), e continuou a decrescer a partir de 2000. O relatório aponta para um desemprego estrutural de 14% da população activa em 2016 (que será praticamente todo o desemprego). Desajustamento estrutural da economia portuguesa A essas tendências globais, de fundo, juntaram-se aspectos induzidos durante os períodos de pré-adesão após a adesão à moeda única. Segundo esta equipa do FMI manteve-se um “mercado laboral inflexível” (afectando sobretudo os sectores de bens transaccionáveis, ou seja os que podem ser vendidos nos mercados internacionais), uma falta de concorrência no sector de bens não transaccionáveis, uma tendência para o sobreendividamento e a alavancagem financeira que beneficiou o crescimento em certos sectores da economia (construção, imobiliário e retalho) em detrimento de outros e com prejuízo para o investimento (cujo crescimento anual declina desde 1997 e se contraiu desde o início da Grande Recessão mundial), bem como “uma política orçamental pró-cíclica”. No entanto, muitos destes aspectos, como a relação entre a alavancagem financeira e a quebra de investimento durante o período da “bolha” financeira anterior ao rebentar da Grande Recessão, ou as políticas pró-cíclicas de resposta à crise financeira recente não foram uma originalidade portuguesa. Mas sim a tónica dominante em todo o mundo desenvolvido. Em suma, o relatório sublinha que o enquadramento institucional e as respostas das políticas públicas em Portugal “foram inadequadas para absorver os vários choques sofridos pela economia neste período”, o que foi agravado por um fosso amplo no campo do capital humano que “impediu o país de subir na cadeia de valor acrescentado global”. Incertezas que permanecem As exportações têm contribuído em 50% para o ajustamento rápido do défice externo que caiu a pique de 12,5% do PIB em 2008 para 2,87% em 2012, segundo as estimativas do “World Economic Forum” (WEF), e poderá descer ainda mais, em 2013, para 1,696%, segundo as previsões do WEF. A robustez da procura externa, bem como a capacidade de diversificação do tecido exportador português são, por isso, questões sensíveis, para mais numa economia que é moderadamente aberta, onde as exportações ainda só pesavam 36% do PIB em 2011 (no caso da Irlanda pesavam 107% do PIB). A questão que se debate é se esta correcção agora conseguida, em circunstâncias extraordinárias, é durável, numa situação em que 40% é derivada da compressão brutal das importações, em virtude da contracção do mercado interno e do investimento no quadro da recessão e desalavancagem em curso. A equipa do FMI, na segunda parte deste relatório onde se avalia a competitividade portuguesa, inclina-se para responder que sim, que será durável, ainda que admitindo que “é demasiado cedo para tirar conclusões definitivas”. Um dos problemas que permanece, mesmo em relação às empresas mais produtivas e dinâmicas no mercado externo, é “o risco de uma redução abrupta generalizada da disponibilidade de crédito, um risco que permanece elevado”, o que implica “a necessidade de apoio continuado de liquidez”, para contrabalançar a necessidade de desalavancagem por parte da banca portuguesa, como é referido na terceira parte deste relatório sobre a desalavancagem do sector empresarial português. Quatro cenários de longo prazo
A leitura deste relatório permite algumas conclusões provisórias:
*Jorge Nascimento Rodrigues é editor de www.gurusonline.tv, www.janelanaweb.com e geoscopio.tv. É igualmente Editor Executivo da Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão e colaborador do semanário Expresso. Artigo originalmente publicado no Expresso Online. Republicado com permissão. |
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