A ansiedade financeira não deve ser encarada como um fenómeno isolado, mas como um desafio crescente que exige uma abordagem holística. A saúde mental, tal como a saúde física, é um bem comum. Devemos criar um ambiente social que promova o equilíbrio, para que ninguém tenha de viver com medo do amanhã
POR RITA MENDES
Vivemos numa era em que a estabilidade financeira desempenha um papel muito importante no bem-estar. Num contexto económico tantas vezes marcado pela incerteza, pelo aumento do custo de vida e por modelos de trabalho cada vez mais instáveis, a ansiedade financeira deixou de ser uma preocupação individual e silenciosa, transformando-se num fenómeno colectivo, transversal a todas as idades, géneros e classes sociais.
De acordo com dados de um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o cenário deve preocupar-nos a todos: estima-se que, em 2019, mais de 2,25 milhões de pessoas em Portugal sofriam de uma perturbação de saúde mental, com as perturbações de ansiedade a representarem a maior fatia. Este, é por isso, um fenómeno que, cada vez mais, afecta uma grande parte da população portuguesa, evidenciando como a ansiedade financeira, frequentemente associada a estas perturbações, pode ter um impacto profundo na sociedade.
A Ansiedade Financeira no Contexto de Saúde Mental
A preocupação com o dinheiro não se limita a momentos pontuais de stress, como a dificuldade em pagar contas ou lidar com imprevistos orçamentais. Ela manifesta-se de forma persistente, afectando a qualidade de vida, o sono, a concentração, a produtividade e até as relações interpessoais. Em muitos casos, a ansiedade financeira pode tornar-se um medo crónico do futuro ou um sentimento avassalador de vergonha e culpa.
Mas não podemos reduzir a ansiedade financeira a uma questão de má gestão pessoal. Ela é, antes de mais, reflexo de uma estrutura económica e social que promove a desigualdade de oportunidades e a ausência de literacia financeira desde a infância.
A realidade é que a população portuguesa está cada vez mais vulnerável a questões de saúde mental, especialmente no que se refere a transtornos de ansiedade. Segundo a publicação Estatísticas da Saúde, e com base em resultados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR) de 2024, 32% da população com 16 ou mais anos revela sintomas de ansiedade generalizada. O peso da preocupação com o dinheiro está claramente reflectido nestes dados, com níveis elevados de ansiedade a afectarem grande parte da população.
Uma Responsabilidade Colectiva
Enquanto profissionais de saúde mental, contribuímos para que os nossos pacientes compreendam melhor os factores emocionais ligados à ansiedade financeira e encontrem formas de os gerir. Contudo, este trabalho só será verdadeiramente eficaz se existirem condições sociais e económicas que promovam o bem-estar.
A ansiedade financeira não deve ser encarada como um fenómeno isolado, mas como um desafio crescente que exige uma abordagem holística. A saúde mental, tal como a saúde física, é um bem comum. Devemos criar um ambiente social que promova o equilíbrio, para que ninguém tenha de viver com medo do amanhã.
Formada em Psicologia, com especialização em Desenvolvimento Profissional, Rita Mendes alia mais de 10 anos de experiência em Recursos Humanos a uma abordagem próxima no apoio ao crescimento pessoal e profissional de quem acompanha.