A Finlândia, a Noruega, a Dinamarca e a Islândia são os países mais felizes do mundo, tanto para os seus cidadãos nativos como para os imigrantes que neles vivem. Estes são os resultados animadores do World Happiness Report 2018, que analisa o nível de felicidade da população originária de 156 países e dos novos residentes de 117 nações, apresentando a sua percepção acerca da saúde, riqueza, corrupção, apoio social, liberdade e generosidade. Para os nativos, o Burundi, a República Centro-Africana, o Sudão do Sul, a Tanzânia e o Iémen são os piores países para viver, sendo que a Síria, Togo, o Ruanda, a Costa do Marfim e os Camarões estão no fim da tabela para os migrantes. Sem surpresas
POR
MÁRIA POMBO

A Finlândia, a Noruega, a Dinamarca, a Islândia e a Suíça são os países mais felizes do mundo, contra o Burundi, a República Africana Central, o Sudão do Sul, a Tanzânia e o Iémen, que se assumem como os mais infelizes, de acordo com a percepção dos seus cidadãos nativos. Por seu turno, também a Finlândia, a Dinamarca, a Noruega, a Islândia e, desta feita, a Nova Zelândia são os melhores países para viver, e a Síria, Togo, o Ruanda, Costa do Marfim e Camarões são os piores, aos olhos dos imigrantes.

Estes são os principais resultados da mais recente edição do World Happiness Report 2018. Este ano, para além de apresentar apenas o nível de felicidade dos nativos de cada país, como é habitual, o relatório relaciona-o com as migrações entre nações, ou seja, com o modo como os imigrantes em diversos países se sentem, numa abordagem que se explica pelo facto de a globalização proporcionar uma mais fácil movimentação de pessoas que procuram, afinal, uma vida melhor. Mas será que a encontram? Será que são mais felizes? Tentando responder a estas e a outras questões, o estudo foi realizado por diversos peritos independentes e contou com o apoio da Sustainable Development Solutions Network (SDSN) e do Global Happiness Council (GHC). O mesmo aprofundou o grau de felicidade de 156 países, aos olhos dos seus nativos, e de 117 nações, de acordo com os seus imigrantes.

Na realidade, estudar a felicidade da população, a nível mundial, é uma tarefa cada vez mais útil, não só para os líderes – empresariais e de governo – como também para os próprios cidadãos. O World Happiness Report 2018 dá conta da percepção que a população tem acerca do estado da saúde, da riqueza, da corrupção, do apoio social, da liberdade e da generosidade existentes no seu país e nas demais nações, comparando os resultados mais recentes (apurados entre 2015 e 2017) com os que foram observados entre 2008 e 2010, recorrendo também a dados disponibilizados pela Gallup e pela ONU.

Incluir a percepção dos imigrantes neste estudo pode ajudar os cerca de 700 milhões de cidadãos (estimados) que desejam sair dos seus países de origem a escolher o local com o qual mais se identificam ou que lhes poderá dar uma vida melhor. Importa salientar que, sem grandes surpresas, os países que têm os imigrantes mais felizes não são os mais ricos, mas sim aqueles que oferecem um melhor apoio em termos sociais e institucionais, sendo a aceitação dos estrangeiros, por parte dos cidadãos locais, o seu principal potenciador de felicidade. Para além do nível de salários e oportunidades que oferecem, os autores do documento explicam que, à partida, os cidadãos devem optar por escolher países que sejam mais felizes que o seu. Esta não é uma garantia de nada mas é um bom indicador.


Finlandeses são os mais felizes do mundo

Mas passemos à percepção dos nativos dos diversos países. No geral, os lugares do topo continuam a ser ocupados pelos mesmos países que figuravam no ranking de 2017, tendo basicamente mudado de lugar. Uma das novidades é a Finlândia, que estava em quinto lugar, estar agora em primeiro, o que se explica pelo facto de os cinco países mais bem cotados – Finlândia, Noruega, Dinamarca, Islândia e Suíça – terem pontuações muito semelhantes (acima dos 7,48 pontos, em 8, obtendo bons resultados em todas as variáveis que foram analisadas (rendimentos, saúde, apoio social, liberdade, confiança e generosidade).

Contudo, e apesar da consistência que se verifica nos lugares cimeiros, observam-se algumas alterações nos restantes países, principalmente se compararmos com os resultados da análise apresentada em 2011 e que contou com inquéritos feitos entre 2008 e 2010. Vejamos. Entre 2011 e 2018, 58 países registam melhorias significativas, e 59 nações apresentam valores piores, ao passo que apenas 24 países não apresentam alterações. A Europa Ocidental foi uma das principais zonas afectadas, com 12 países a registarem perdas e apenas três a apresentarem melhorias significativas.

Togo, Letónia, Bulgária, Serra Leoa e Sérvia são as nações onde se registam as principais melhorias em termos de felicidade dos cidadãos, entre os dois períodos analisados (2009-2010 e 2015-2017). Importa explicar que Togo foi a nação que, em 2015, obteve a pior cotação, tendo subido 17 posições desde então. No pólo oposto, a Ucrânia, a Síria, a Venezuela, o Iémen e o Malawi são os cinco países que apresentam as quedas mais acentuadas desde 2011.

Portugal encontra-se no meio da tabela e ocupa o 77º lugar, de 156 países analisados. De acordo com a análise, o PIB per capita e o apoio social são os indicadores mais “fortes” e aqueles que mais contribuem para este resultado, seguindo-se a esperança de vida e a liberdade para tomar decisões. Os autores do estudo explicam ainda que Portugal, a par com a Grécia, Itália e Espanha foi um país que sofreu bastante com a crise financeira, revelando uma ligeira melhoria face a 2011 – a qual não foi alcançada pelas restantes três nações, sendo que a Grécia faz parte do grupo dos 20 países que registam as quedas mais acentuadas.

Como foi explicado anteriormente, para além de analisar o grau de felicidade dos cidadãos em geral, os autores do documento procuraram também compará-lo com o nível de felicidade sentido pelos cidadãos que nasceram num país diferente daquele onde vivem. Esta escolha foi feita com base no facto de existirem, em 2015, cerca de 244 milhões de migrantes (mais 91 milhões do que em 1990), o que equivale a 3,3% da população mundial, e de se prever que sejam perto de 700 milhões aqueles que gostariam de viver noutro país mas não têm coragem de mudar ou não sabem como fazer. Para além disso, existem países que têm percentagens de imigração de 39% a 50% (como é o caso do Luxemburgo, da Região Administrativa Especial (ERA) de Hong Kong e de Singapura), existindo outros que ultrapassam os 68% (como o Qatar, o Kuwait e os Emirados Árabes Unidos).

Uma conclusão interessante aponta para o facto de quatro dos cinco países mais felizes para a população originária dos mesmos coincidirem com a escolha da população migrante (o que será analisado em baixo).


Tolerância é benéfica tanto para nativos como para imigrantes

De acordo com o documento, da dezena de países mais felizes para os imigrantes, nove fazem parte da lista do top 10 para a restante população (ou seja, para os cidadãos nativos), sendo que a média de estrangeiros que neles residem ronda os 17%. A Finlândia, a Dinamarca, a Noruega, a Islândia e a Nova Zelândia são aqueles que os imigrantes consideram mais felizes. A Suíça que, no ranking geral ocupa a quinta posição, dá lugar à Nova Zelândia, ocupando o nono lugar, aos olhos dos imigrantes.

No pólo oposto e sem surpresas, a Síria, Togo, o Ruanda, a Costa do Marfim e os Camarões são os piores para os imigrantes. As pontuações dadas pelos imigrantes que vivem nestes países são de menos de metade daquelas que foram dadas aos países mais felizes. Complementarmente, dos piores 10 países, fazem ainda parte o Sudão do Sul, a Guiné, a Geórgia, o Benim e a Nigéria. Como não é novidade, tratam-se de nações marcadas por conflitos armados e por carências de diversa natureza (como saúde, educação e comida).

O facto de existir uma concordância entre os cidadãos locais e os imigrantes no que respeita à escolha dos países mais felizes para viver explica-se através da combinação de diversos factores. Por um lado por serem países atractivos para os estrangeiros, e por outro pela forma como os cidadãos locais acolhem aqueles que vêm de fora, o que facilita a integração dos novos habitantes sem que a qualidade de vida daqueles que já lá viviam seja afectada. Por exemplo, Helsínquia, Copenhaga e Reykjavik são cidades onde tanto os locais como os imigrantes se consideram felizes porque, durante décadas, os seus habitantes desenvolveram níveis de confiança, cooperação e inovação que são elevados o suficiente para satisfazer as necessidades de todos (nativos e estrangeiros).

Uma nota curiosa aponta para o facto de um número significativo de países (cerca de 45, em 117 analisados) obterem uma nota ligeiramente mais alta neste ranking do que no geral. Por exemplo, a Finlândia tem 7,66 pontos, dados pelos seus imigrantes, e 7,63 pontos, de acordo com os seus nativos; já Portugal tem 5,68 pontos, de acordo com os residentes estrangeiros, e recebe apenas 5,41 pontos por parte dos cidadãos que cá nasceram. Esta não é uma situação problemática e explica-se pelo facto de, tendo essa possibilidade, os migrantes escolherem destinos que lhes ofereçam uma melhor qualidade de vida, valorizando ainda mais os factores (como a segurança, por exemplo) que não tinham no seu país de origem e que passam a ter no país que os acolhe.

O documento também conclui que as migrações são uma excelente oportunidade para ligar os humanos entre si, aumentando os níveis de solidariedade e tolerância, bem como a partilha de conhecimento. Mas e como é sabido, se os fluxos migratórios não forem controlados e geridos, poderão ter o efeito contrário, que é o de destruir a confiança e aumentar os comportamentos anti-imigração. Complementarmente, importa não esquecer que as migrações entre países podem significar um mundo de oportunidades, mas também um conjunto de custos e riscos, e que os migrantes que se integrarem melhor e mais facilmente serão também, à partida, os mais felizes, sem prejudicar a felicidade da população originária dos seus países de acolhimento.

É que para apurar o “sucesso” das migrações é necessário observar os três tipos de pessoas que são, de algum modo, afectadas pelas mesmas. Por um lado, importa olhar para os próprios migrantes, que correm o risco de sofrer discriminação e variadas privações e para quem tudo é novo (inclusive a língua, em muitos casos). Por outro lado, interessa observar aqueles que são deixados para trás e que, apesar de muitas vezes receberem dinheiro por parte dos que partem, também sofrem com a separação e com a falta do apoio que tinham e deixaram de ter.

Por fim, os que vivem nos países de acolhimento também são afectados, vendo-se forçados a partilhar o seu espaço com novos e desconhecidos residentes: neste caso, as consequências são mais graves se se tratarem de fluxos migratórios de grande dimensão, se os migrantes forem pessoas com baixa escolaridade, se tiverem a mente mais fechada do que a dos habitantes locais e se chegarem ao novo país sem vontade de se relacionarem com os locais e de se integrarem na população. Uma atitude mais tolerante também por parte do país de acolhimento será igualmente benéfica tanto para os migrantes como para os nativos.


Unbehagen ou a Alemanha do mundo

Uma característica do World Happiness Report 2018 é o facto de, por falta de dados, não incluir a percepção dos refugiados na sua análise, sendo a Alemanha a única excepção. Este é o único país que conta com informação suficiente acerca dos refugiados e conclui-se que estes são 0,4 pontos menos felizes que os restantes imigrantes que vivem nesta nação. Contudo, e como já eram cidadãos extremamente infelizes, os autores do documento revelam que a migração é claramente benéfica para eles.

E, na realidade, também é para os próprios alemães, como explica um artigo recentemente publicado pelo The Economist. Após uma crise política provocada recentemente pelo facto de, na cidade de Essen, três quartos dos utilizadores de um banco alimentar serem cidadãos de outras nacionalidades – dando origem a protestos racistas – Angela Merkel referiu que “não é bom distinguir entre os alemães e os outros”, tendo utilizado um termo – Unbehagen – que não tem uma tradução clara mas que podemos definir como inquietação ou desconforto.

Como sabemos, a chanceler alemã foi desde sempre uma das principais defensoras da abertura de fronteiras aos refugiados, indo mesmo contra o sentimento de muitos alemães que – até por motivos históricos – têm defendido o oposto. Entre 2015 e 2016, a Alemanha recebeu mais de um milhão de refugiados. Actualmente, o termo Unbehagen não significa apenas desconforto. Ao invés, traduz-se numa nova tendência que reflecte o processo de transformação que o país está a atravessar, estando a passar de uma sociedade fechada para outra mais aberta e plural. Esta evolução traduz-se não só numa maior aceitação de cidadãos de outras nacionalidades, como também numa maior tolerância em relação à diferença no geral, tendo feito igualmente progressos ao nível da igualdade de género.

Em jeito de conclusão e pegando numa ideia dos autores do World Happiness Report 2018, “a felicidade não é algo escasso e, ao contrário do ouro, pode ser criada para todos e pode ser partilhada sem que acabe para aqueles que dão. E cresce até quando é partilhada”.


Jornalista