O maior competidor não está fora das empresas, mas no seu interior e é precisamente a falta de visão ampla e a ausência de capacidade de entender que o propósito e finalidade estão para lá lucro. De facto, deveremos questionar-nos se as empresas serão lugar de esperança, nos quais se pratica a solidariedade e a subsidiariedade
POR JOÃO PEDRO TAVARES
Diversos e recentes estudos apontam para que 30% dos pobres se encontram a trabalhar, o que é um enorme desafio para o mundo do trabalho e para as empresas em particular. Devem as empresas apontar ao lucro? Ou a um propósito e responsabilidade superior?
Sem dúvida que o lucro é um meio fundamental e imprescindível, mas não é um fim em si mesmo. O propósito último das empresas é criar e distribuir valor de forma justa. E o mundo empresarial tem uma enorme responsabilidade em cumprir este desígnio por um conjunto de fatores:
É o motor da economia e o que mais contribui para o crescimento e desenvolvimento económico tendo, por isso, uma responsabilidade social única;
É o setor da sociedade mais exposto à competitividade e, consequentemente, o que mais ensaia a aplicação da criatividade e da inovação, o desenvolvimento de novos produtos, soluções e tecnologias, para além de ser o que melhor gere o risco e se obriga a critérios de gestão com rigor;
É o maior empregador da sociedade, que necessita de captar talento e capacidade, o maior formador na vida profissional e, também, o maior a contribuir em impostos. E dispõe de pessoas comprometidas e de líderes marcantes que fazem a diferença.
A ACEGE comprometeu-se a dar o seu contributo para ajudar as empresas a levar por diante este desígnio e, por isso, promove e mobiliza a utilização do Semáforo como ferramenta que permite avaliar a situação socioeconómica das famílias dos colaboradores das instituições.
Sabemos que só controlaremos e nos comprometeremos com o que medirmos e que, sem isso, serão apenas puras intenções. Este é apenas um primeiro passo e, temos obtido neste caminho, a par de resultados e respostas satisfatórias, dificuldades e desafios por ultrapassar.
Por tudo isto, não podemos passar ao lado e precisamos de assumir um conjunto de compromissos sabendo que:
Não há pessoas, mas famílias, em situação de carência. A família é um agente a ser valorizado também neste tema;
Para lá do salário mínimo deveremos promover um salário digno para as famílias, sendo a colaboração do Estado fundamental neste contexto;
Queremos medir a exposição e fragilidades das famílias que temos à nossa responsabilidade, desenvolvendo políticas alinhadas para uma maior segurança e proteção;
As empresas devem ser agentes convergentes, ativos e complementares na sociedade no que respeita ao combate à pobreza e proporcionar condições dignas às famílias dos seus colaboradores.
Este é apenas um mapeamento, mas temos por diante todo um caminho por fazer, onde surgirão desafios, dificuldades, armadilhas, urgências que não constam do mapa inicial. Importa por isso que os compromissos não se fiquem pelas intenções e palavras, mas nos levem até ao final.
O maior competidor não está fora das empresas, mas no seu interior e é precisamente a falta de visão ampla, a falta de capacidade de entender que o propósito e finalidade estão para lá lucro. De facto, deveremos questionar-nos se as empresas serão lugar de esperança, nos quais se pratica a solidariedade e a subsidiariedade.
Também não podemos colocar a atuação apenas nos ombros da economia social. Nem esperar que seja o Estado a assumir a totalidade da responsabilidade. Este é o melhor sinal que poderemos dar à sociedade enquanto líderes empresariais: tomar por diante este desígnio e ser um exemplo. Se uma economia é competitiva com base nos baixos salários, é uma pobre economia e temos também desafios para reconfigurar, em conjunto, o tecido empresarial, crescendo na cadeia de valor.
Este é um desafio demasiado grande que pode ir sendo resolvido de forma parcelar. Façamos o que estiver ao nosso alcance. Na verdade, dispomos de todos os meios, competências e capacidades para erradicar a pobreza. Que assim possamos executar o nosso compromisso.
Enquanto existir pobreza, não existirá liberdade nem dignidade. E, com isso, a nossa democracia estará enferma.
Presidente da ACEGE – Associação Cristã de Empresários e Gestores