A terceira conversa Next decorre entre Patrícia Liz, CEO da Savills, e Salvador Mathias, National Account Manager na Makro. Há diferenças nas responsabilidades e nas funções que ficamos a conhecer nesta conversa, mas também muitas ideias comuns. Carmo Teixeira Diniz, moderadora, cita uma passagem do livro O Amor como Critério de Gestão, de António Pinto Leite, como mote para hoje: «Sabemos que na sociedade em que estamos inseridos, o gestor é muitas vezes descrito como um homem – não uma mulher – de grande visão e completo conhecimento do que é importante, capaz de tomar decisões instantâneas sem hesitações nem insegurança; está disposto a exercer uma autoridade sem limites, contando com a adesão disciplinada e cega de todos os seus colaboradores. Acreditamos que há uma forma diferente de gerir e de liderar, tendo como principal critério o amor». Maria do Carmo entrega então a palavra aos interlocutores, perguntando-lhes se põem em prática este critério
POR PEDRO COTRIM

Patrícia Liz: Faço sempre por isso, sempre com a humildade de saber escutar. Procuro, há muitos anos, e sempre com a inspiração da ACEGE, dos grupos Cristo na Empresa, com a inspiração de Deus, conseguir levar a cabo essa missão. Diria que ser praticante, neste sentido, é complexo, é exigente; há frequentemente escolhas difíceis, mas há que pensar sempre nas pessoas, na dignidade do trabalho e noutros princípios que ultrapassam a maximização do lucro. Evidentemente que não me oponho ao lucro; quando alcançado de forma criteriosa, permite às pessoas prosperarem. As decisões podem não ser sempre as mais visíveis nem as mais rápidas; são as que nos podem realmente fazer ser justos.

Sou empresária e gestora há 25 anos. Houve momentos difíceis em que na minha empresa tivemos de decidir em direcção contrária a colegas e sócios internacionais. No começo da crise do subprime, pediram-nos para despedir pessoas. É preciso saber dizer que não, ter a coragem de dar a nossa opinião sobre o rumo. Respondi que deveríamos então começar os despedimentos por mim pelo Paulo, o meu marido – estávamos, como estamos hoje, na gestão desta empresa. Não se fez o despedimento, fomos criativos, mas a crise do subprime durou quatro anos e castigou o sector. Procurámos reduzir as nossas despesas mantendo as nossas pessoas. Sabemos que o despedimento fácil em momentos difíceis complica a retoma da actividade e dos resultados. Hoje em dia é felizmente um tema que se suscita e também surge obviamente fora da esfera cristã. Assumo a minha fé perante quem comigo trabalha, mas mesmo quem não seja crente encontra muitos motivos na dignidade humana para levar estes critérios por diante.

Salvador Mathias: Concordo absolutamente, Patrícia. Faço um enquadramento com o que disse o António Pinto Leite no congresso da ACEGE. É preciso desmistificar que este amor seja uma coisa «fofinha»; não significa que sejamos compassivos, queridos. Significa tratarmos os outros – e os outros são todos – como gostaríamos de ser tratados. Os colaboradores, as pessoas das nossas e equipa e outras, os chefes, os accionistas, os clientes e todos os concorrentes. Quando olhamos para a gestão, pode parecer-nos um mundo um bocado frio, apenas preocupado com a maximização dos lucros, com a optimização dos custos, com muitos outros racionais calculistas com impactos na concorrência, e que depois levam a que as empresas não vivam sozinhas e que não possam tomar decisões sozinhas; só que o panorama mudou muito nos últimos anos, conforme a Patrícia afirmou. Percebemos que somos nós que temos de aplicar e incorporar este amor, não pondo de lado os lucros nem afastando as questões sobre a sua distribuição no ecossistema da empresa. No final do dia, é o lucro que permite que a empresa sobreviva e que apresente resultados. Estes critérios não têm nada de mutuamente exclusivo, porque não é bom que as pessoas vão para o desemprego.

Patrícia Liz: A comunicação das decisões é complexa, mas necessária. Não se pode partilhar tudo, precisamente pelo entendimento de cada um, mas temos de ser muito transparentes e muito claros em algumas decisões que tomamos. Na Savills temos uma prática de distribuição de uma parte significativa dos lucros pelas pessoas e de seguida pelos accionistas. Se não tivermos o cuidado de apresentar os critérios, as pessoas podem sentir-se prejudicadas; é muito fácil gerar-se alguma confusão. Para nós tem sido sempre relativamente simples dar esta explicação, dentro da simplicidade complexa do carácter desigual dos prémios.

O espírito de grupo que se ganha na empresa como cultura empresarial é muito vincado. O próprio critério de distribuição, por muito subjectivo que possa ser – e nós temos critérios subjectivos e objectivos baseados em resultados – permite explicar porque foram assim tomadas as decisões. Normalmente, isto é compreendido. Há pessoas que manifestam desagrado quando recebem uma notícia, mas percebem a situação e saem satisfeitas com a decisão, pois está estruturada de forma a ser entendida. Temos tido sempre um ambiente excepcional e uma grande percepção de justiça. Tem a ver com a clareza dos critérios e do modo como os comunicamos. Isto é essencial e as pessoas entendem a explicação estruturada.

Salvador Mathias: Essa questão da transparência é importantíssima, e acima de tudo, esta questão do amor não tem apenas a ver com a liderança. No final do dia, falamos muito sobre o facto de passarmos muito tempo na empresa. Lidamos mais tempo com as pessoas da empresa que com as pessoas em casa, e cabe-nos a nós, líderes, tratar desta outra casa e das pessoas que lá moram. O livro O Amor Como Critério de Gestão refere a liderança, e o código de Ética da ACEGE também o afirma: a empresa é uma comunidade humana, onde as pessoas têm o mesmo objectivo, e, alicerçado na política de recursos humanos e de remuneração que mencionaste, têm os mesmos interesses. No final do dia, importa que a empresa prospere. É importante a comunicação para que tudo funcione. Para mim o mais importante é o amor, é perceber o outro lado, é a humanidade. As transparências são essenciais para perceber o caminho comum. Se não houver medo, haverá empresas «best place to work».

Patrícia Liz: Sem dúvida, Salvador, que é necessário fomentar tudo isso, pois ninguém está sozinho. Muitas vezes é responsabilizando, percebendo quais as pessoas mais receptivas e passando este tipo de mensagens. A proximidade ajuda a que tudo funcione de outra forma. Tudo isso é amor como critério de gestão. As decisões, quando se querem justas e concretas, não são simples. Eu diria que dão mais trabalho do que olhar apenas para os números.

Salvador Mathias: Claramente. E ainda mais importante no teu caso, numa liderança com o teu marido de um grande grupo de pessoas, com decisões que eu ainda não tenho de tomar, mas que espero um dia vir a tomar. Muitas delas são difíceis e é esta mensagem que temos de passar. A liderança, à luz do amor e da humanidade, não é uma «coisa fofinha e ingénua» e contra o lucro: assenta no longo prazo e por vezes as pessoas não a entendem muito bem. As decisões não vão evitar sofrimento, mas os líderes serão cada vez mais pessoas mais completas, e não como as que a Carmo referiu inicialmente do líder à moda antiga. Eu acho que as lideranças têm caminhado para a diversidade, também porque os homens e as mulheres trazem valências diferentes para a liderança. Têm sensibilidades diferentes e visões diferentes do mundo, e parecendo que não, é uma riqueza inigualável. Há também muito mais preocupação com o bem-estar. Não se faziam inquéritos sobre satisfação interna. As pessoas percebem que podem falar e que alguns pedidos podem ser atendidos. Não é possível pôr toda a gente a ganhar muito mais…

Patrícia Liz: Tentar sempre a coerência. Tenho presente o princípio de Santo Inácio de Loyola: «em tudo, amar e servir». De facto, a dignidade das pessoas no trabalho e naquilo que é o reconhecimento, não tanto na parte financeira, mas naquilo que é dignificar e as pessoas estarem felizes onde estão e sentirem-se reconhecidas em determinados momentos. Estive cinco anos na direcção de uma escola internacional. Em determinado momento, percebeu-se que a fundadora já estava um pouco ultrapassada, sendo que tinha tido um óptimo desempenho no passado. Estávamos em reunião executiva e descurava-se o que fora o trabalho excepcional daquela pessoa – era um daqueles momentos em que uma sala inteira pede para se resolver uma situação tensa de recursos humanos. Quem contestou inicialmente a pessoa acabou por homenageá-la dignamente. Quando se vai na onda, e no mediatismo do nosso dia-a-dia, estas situações acentuam-se. Na dignificação das pessoas, é importante tomar cuidado e ter coragem. O legado que pessoas mais sénior deixam nas empresas e que é absolutamente de respeitar.

Salvador Mathias: No caso das multinacionais, este facto ainda é mais visível, pois as pessoas, desde muito cedo, passam quase a ser descartáveis, pois todos o nosso time frame. Nós, católicos, ainda temos uma motivação interna para sermos cada vez melhores, mas também um escrutínio cada vez maior pelos outros porque não temos nenhuma vergonha em assumir a nossa fé. Obriga-nos à rectidão e a sermos coerentes, e tem tudo a ver com a integridade na vida e com os valores essenciais em que acreditamos. As pessoas estão cansadas da falta de integridade e de coerência, da política às grandes empresas. Quando temos ética, amor e consistência, acabamos por ter algum caminho e deixar um legado, apesar das nossas falhas.

Carmo Teixeira Diniz: Não queria estar a interromper esta conversa tão orgânica, mas gostava de voltar a um ponto abordado pela Patrícia. Gostava de saber do teu lado, Salvador, de que forma é que conseguimos inspirar os outros a praticarem também o amor. Como católicos, temos esse tal escrutínio e essa motivação interna para o fazermos. Mas para as pessoas que estão à nossa volta, sejam da nossa equipa ou não, como é que as podemos inspirar a praticar o amor como critério de gestão? Queria também saber alguns exemplos concretos do teu lado, Salvador, conforme a Patrícia já expôs. Alguma história que queiras partilhar connosco?

Salvador Mathias: Em termos de inspiração, vai depender sempre da forma que cada um é. Nem todos somos aqueles líderes que dizem frases incríveis e em que as pessoas ficam a pensar. Tem a ver com integridade e justiça/transparência. Se formos esta pessoa, que não diz uma coisa e faz outra, que tem integridade dentro e fora da empresa, definimos os nossos limites e os limites às pessoas que trabalham connosco. As pessoas vão acabar por respeitar as decisões, não gostando de todas. Graças a Deus, nunca passei por um despedimento, mas por vezes são essenciais para a viabilidade das empresas e para a viabilidade dos postos das pessoas que ficam. Acima de tudo, é conseguir actuar consistentemente de forma natural e íntegra.

Partilho uma história que me chega pela liderança lateral: quando, entrei na antiga empresa onde estive, havia mudanças gigantes. Uma pessoa com 20 anos de casa estava um bocado encostada à parede por várias razões. Quando me recebeu, encarou-me como uma ameaça. Era da minha equipa, mas era meu par. Foi este trabalho, que acho que em mim é natural, de conseguir influenciá-lo positivamente, que acabou por ganhar a confiança dele. Hoje em dia somos muito amigos, e é uma pessoa que tem idade para ser meu pai. Acabou por sair da empresa a bem. Continuamos a falar com frequência. Ajudei-o na prossecução da sua vida profissional, sobretudo em termos de tecnologia.

Posso dar-te também o exemplo da empresa em que estou agora. Sabemos que as multinacionais têm uma grande sede de resultados. Trabalho na área comercial há dez anos e por isso vivo diariamente com esta pressão; há que saber filtrá-la para as equipas. Uma das coisas em que sou muito rígido é nos horários de trabalho. Não gosto de estar a receber mails às 11 da minha equipa porque a essa hora deviam estar a trabalhar. Tenho pessoas da minha equipa que me dizem «nos primeiros dois meses tiveste algumas intervenções que nos desagradaram, pois não nos conhecias bem». Mas há uma que ficou. Os telemóveis têm um botão para desligar. Há sempre trabalho para fazer até à meia-noite e ninguém vai morrer porque não atendeste uma chamada ou porque não respondeste a um email às onze. Mudando esta mentalidade, que no final do dia trata-se de amor, porque são compreensão e humanidade, as pessoas vão tentar seguir este modelo.

Patrícia Liz: Eu venho da geração dos workaholics. O esforço que faço é no sentido dessa disciplina. Contudo, sempre que via pessoas a ficarem até mais tarde, mesmo que por hábito, sugeria-lhes que fossem para casa. Na Savills temos vindo a evoluir no sentido da flexibilidade. Hoje as pessoas estão numa espécie de indisciplina nos horários, muito por causa da covid. Convidamos as pessoas a serem mais disciplinadas no sentido em que muitas vezes há que fazer um esforço. Na Savills há departamentos muito diversos: há, por exemplo o departamento de arquitectura, com criatividade abundante e projectos que implicam trabalho ao fim-de-semana – temos de servir bem os clientes. Mas há formas de equilibrar: por exemplo, alargar as férias ou ter uns dias de descanso a seguir a uma entrega de obra ou a uma tarefa que exija mais esforço. As pessoas sentem estes ajustamentos de preocupação constante pelo próximo, por aquele que ajuda a empresa. Nós temos um grupo de trabalho na direcção da empresa muito bom e continua a melhorar. Tenho um corpo directivo excepcional – não há uma pessoa menos comprometida com a empresa. São pessoas a quem faz sentido este tipo de gestão e que gerem as suas pessoas e as suas equipas também neste sentido – já não preciso de me preocupar com este tipo de cuidado com as pessoas, no sentido do seu equilíbrio de família, trabalho, lazer ou descanso.

Temos uma sociedade em que os supermercados estão abertos muitas horas por dia e aos domingos à tarde – podiam perfeitamente encerrar, que nós arranjaríamos formas de resolver a nossa vida. É preciso arranjar formas de conseguir contornar as situações. Creio que a procura do equilíbrio seria a solução. O equilíbrio de pagar a tempo aos meus fornecedores, a necessidade de ter uma equipa oleada que fecha trabalhos rapidamente e que permita facturar, ter coragem de pedir dinheiro aos nossos clientes na altura certa para podermos pagar atempadamente a quem nos permite prestar um serviço de excelência. Este equilíbrio é constante, internamente e externamente. As pessoas há uns anos saíam daqui às 11 da noite ou de madrugada se tivéssemos um projecto muito absorvente. Hoje sair tarde é 9 ou 10, o que já é demasiado e que é felizmente a excepção. Se percebemos que não sucede uma vez por acaso e que passa a ser a regra, a equipa já não está dimensionada. Mais uma vez surge a responsabilidade de percebermos que talvez nos anos seguintes não vamos ter a rentabilidade que tivemos anteriormente, mas teremos uma equipa mais satisfeita e uma capacidade de motivar e de crescer que não tem de ser no futuro imediato. É preciso coragem e paciência para tomar as devidas decisões sem esperar que a rentabilidade seja sempre a mesma. Por vezes, a sede de um resultado imediato num ano pode comprometer um resultado futuro. Outras vezes a gestão de topo não explica bem às gestões intermédias: é necessário construir para o futuro com sustentabilidade.

Acredito, também pelos anos que já se passaram, e pelas sucessivas transformações da empresa, de pequena a média, de local a global, que tenho de olhar mais para a frente – também resulta fazer as nossas equipas acompanharem esta visão. Digo sempre que espero que muitas das pessoas que trabalham comigo ambicionem o meu lugar; se assim não for, eu não consigo evoluir.

Salvador Mathias: Mencionaste muito bem esta diferença geracional. É essencial termos também, conforme eu dizia há pouco, que o amor era fazermos aos outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem a nós, quando as gerações são diferentes, quando as culturas são diferentes, porque no final do dia eu também já sinto diferença para os miúdos que estão agora a começar a trabalhar. Consigo assim imaginar o que se sente com mais quinze ou vinte anos de experiência que eu. É este tipo de liderança que me permite mudar comportamentos dentro das equipas, explicando que as gerações são diferentes e que têm preocupações diferentes. Claro que os mais novos chegam e não vêm mudar as empresas do avesso, mas vão ser cada vez mais representativos. Eu tenho pessoas dos 28 aos 60 na minha equipa, e muitas vezes as pessoas mais velhas são líderes das mais jovens, e eu estou sempre a dizer que talvez não seja tanto assim. No final do dia, toda esta dinâmica acaba por trazer muitas vantagens para tudo o que podem aportar. Ainda o que mencionaste em termos de produtividade, e é por isso que nós temos picos de trabalho. As nossas famílias também sabem que assim é. O importante é gerir a nossa família de acordo com estas necessidades, e quando estamos de férias estamos mesmo de férias, e quando estamos à noite em casa estamos mesmo à noite em casa. Não estarmos num meio termo é muito importante.

Patrícia Liz: E desengane-se quem quiser combater esta postura flexível que os jovens trazem. Não escondo que também é desafiante porque não se podem comprometer as necessidades. Há um certo facilitismo que tem de ser abordado por quem está nisto há mais anos e já viveu momentos muito diferentes. Muito dos que assistem agora à nossa conversa lembrar-se-ão que antes da crise do subprime as pessoas quase entravam nas empresas a dizer o que queriam. O mercado de trabalho estava fortíssimo como está agora. Com a crise, tudo mudou. Vi pessoas com muita experiência a aceitarem trabalhos que pouco tinham que ver com a sua formação, afirmando que apenas queriam um emprego. É preciso ir percebendo estes ciclos e o que é necessário fazer para que as coisas entrem em equilíbrio. O que vemos nos EUA sobre a necessidade de atrairmos novamente as pessoas para o escritório é uma nota muito importante para nos pôr em alerta. Creio que na Europa se fez um pouco melhor – muitas empresas regressaram ao escritório mais cedo, mas nunca será como antes. Na Savills promovemos a flexibilidade dos horários remotos. Também damos poder aos nossos directores para decidirem a gestão das suas equipas, no sentido de haver equilíbrio – de não estarem muitas pessoas a partir de casa nem muitas pessoas no escritório ao mesmo tempo. Também se deverá promover a ideia de haver um dia em que estão todos.

Eu tenho ideia de ver sempre muitas pessoas no escritório. Investimos muito num espaço, em Setembro de 2021, mudámos de instalações e para um espaço em que as pessoas gostam muito de estar no trabalho – há as phone booths, anfiteatros para as reuniões, um belo terraço. É um investimento que as pessoas sentem que é para elas. E dizemo-lo com toda a convicção, dizemo-lo de coração e tudo isto empurra a empresa para a frente. Nos momentos de adversidade, importa agarrar nas nossas equipas no sentido de lutar contra isto e não sentido do lamento. Esta crença das pessoas que trabalham connosco motiva e cria este espírito de grupo muito importante. À medida que as equipas crescem, se nós conseguirmos ir criando esta força anímica, é muito mais fácil a transmissão da mensagem entre todos. Há uma cultura que se enraíza e que não queremos que se perca.

Carmo Teixeira Diniz: Aproveitando esta menção da Patrícia às adversidades, queria explorar aqui o ponto dos obstáculos, e se têm algum exemplo de um obstáculo que tenha sido ultrapassado. Gostava de abordar um pouco mais os tempos de crise: de que forma é que o amor como critério de gestão se aplica em tempos mais difíceis.

Salvador Mathias: Tenho uma frase que trouxe para esta conversa e que veio da Company of Prayer: as escolhas verdadeiramente difíceis não se centram no certo versus o errado; centram-se no certo versus o certo. São dilemas genuínos precisamente porque cada lado está enraizado em valores intrínsecos: a verdade versus a lealdade, o indivíduo versus a comunidade, o curto prazo versus o longo e a justiça versus a misericórdia. Felizmente que a situação mais complicada que enfrento é o facto de haver o aniversário de uma filha de alguém num dia em que é importante estar a equipa toda reunida e outros do mesmo género. Graças a Deus que não me deparei ainda com uma daquelas decisões difíceis como as que a Patrícia enfrenta.

Patrícia Liz: Nos tempos mais difíceis da crise do subprime, que nos obrigaram a muito ânimo e criatividade, decidi ficar com um colégio da zona de Caxias que estava para fechar. O proprietário pergunta-me se, estando eu no imobiliário, conhecia algum investidor para comprar a propriedade, fechando o colégio – estavam com muito poucos alunos. Decidi ficar com o colégio e levar o projecto para diante. Foi uma decisão de âmbito comunitário quando já estávamos num momento de relançamento do mercado. É curioso, porque na altura supus estar a salvar seis ou sete empregos. Reabri o colégio com 27 crianças quando tinha capacidade para setenta. Percebi depois que algumas pessoas ficaram gratas por manterem o emprego, mas outras prefeririam que eu tivesse fechado o colégio para que tivessem direito ao seu subsídio de desemprego. Também há esta visão. Na altura tive de batalhar; mas, mais uma vez, com consistência, fui levando as coisas para diante. Consegui não despedir aquela pessoa, uma das que estava a ser mais problemática, e decido continuar a dizer à pessoa que acreditasse e que estava ali por bem. Talvez nem um ano depois, aquelas pessoas estavam a receber um prémio pela produtividade e pelo esforço que tinham feito naquele ano. Ficaram surpreendidas, pois não era prática no ensino. Esta pessoa veio pedir-me desculpa pelo sucedido. «Nunca esperei», disse-me. «Por nunca esperar é que teve a atitude que teve». Com isto fui ganhando as pessoas. O proprietário faleceu e em 2020. Os treze empregos e a prosperidade que consegui em seis anos tiveram de chegar ao fim, mas foram tempos felizes, de trabalho e concretização, e ainda hoje temos um grupo de whastapp em que vamos dando notícias uns aos outros.

Carmo Teixeira Diniz: É um gosto ouvir-vos, mas o tempo esgota-se! Peço-te, Salvador, um recado para a geração líderes mais velhos. Faço o mesmo pedido à Patrícia em relação aos Next.

Salvador Mathias: O meu pedido não se dirige apenas aos séniores. Peço a todos os líderes que sejam mais humanizados para haver empresas mais produtivas. Que haja sempre cultura para este amor.

Patrícia Liz: Recomendo muita astúcia, muita determinação. As empresas nunca têm o futuro garantido se as pessoas não estiverem atentas e dispostas a colaborar em tudo o que puderem. Os jovens têm novas ideias, têm uma frescura muito importante. Nunca deixem de a trazer.

Sobre os oradores:

A Patrícia Liz tem mais de 30 anos de carreira. Iniciou a sua atividade profissional em multinacionais de renome na área do mobiliário de escritório, incluindo a líder mundial Steelcase, altura em que iniciou o curso universitário de Relações Internacionais em regime noturno. No entanto, a sua paixão passava pela Gestão, pelo que decidiu, mais tarde, enveredar pelo curso de Gestão de Marketing no IADE. Em 1996, Patrícia é convidada a assumir o cargo de Diretora Comercial/Marketing da Regus e, em 1998, abraça um projeto de Restruturação, e certificação da qualidade ISO 9002 de uma empresa ligada ao gás natural – Construgás. Em finais de 1999, criou o seu próprio negócio de consultoria e otimização de espaços, a Melo e Liz Design, acumulando poucos anos depois a Direção Comercial da Cosmopolita, mediação imobiliária. Em 2007, estas duas empresas fundiram-se com a líder ibérica em consultoria imobiliária, Aguirre Newman, e a Patrícia assume a função de Managing Partner. Paralelamente, em 2014, integrou o grupo de fundadores da Oeiras International School, onde desempenhou funções na direção executiva durante 5 anos e decide recuperar um colégio que estaria em vias de encerrar em Caxias, a sua área de residência. Actualmente, é CEO na Savills Portugal, Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral da APEMIP e Membro da Direção Executiva da ACEGE.

O Salvador Mathias tem 34 anos, é casado e pai de duas filhas, sendo que a terceira nascerá em breve. É licenciado em Gestão pela Católica e Mestre em Marketing e Estratégia também na Católica e na Licenciado em Gestão na CLSBE e Mestre em Marketing e Estratégia na CLSBE e BI Norwegian SBE. Atualmente trabalha na Makro como National Account Manager e tem especial interesse por assuntos relacionados com gestão, empreendedorismo e inovação. É também responsável ACEGE Next.