POR MÁRIA POMBO
A tecnologia veio revolucionar a forma de comunicar, e as mudanças também se sentem ao nível empresarial e mais propriamente entre as organizações e os seus clientes. Interagir com o consumidor final é, actualmente, mais fácil, rápido e económico, graças a mecanismos como as “perguntas frequentes” – ou FAQ, se preferirmos –, as apps e os chats em tempo real, onde até a utilização de vídeo já é possível. Muitos consumidores, de diversas gerações, consideram que os elementos digitais são poderosas e simples formas de comunicar com as empresas, pois permitem obter respostas a diversas questões, em tempo real e sem necessidade de se deslocarem. Adicionalmente, é crescente o número de pessoas que considera o email ou os sites como serviços básicos que as organizações disponibilizam.
E se é verdade que este é apenas o início de um mundo que ainda está por desbravar e conquistar em termos de comunicação e interacção entre as organizações e os seus stakeholders, resta saber se o consumidor final está preparado para dispensar outros meios mais tradicionais, como o telefone ou o contacto presencial nos balcões das empresas.
Ou seja, importa perguntar qual é o verdadeiro impacto que a fácil comunicação, promovida pelos avanços tecnológicos, tem junto do consumidor final e de que modo é que este se sente satisfeito (ou insatisfeito) com uma forma de comunicar mais automática e, consequentemente, menos personalizada. A resposta a esta questão pode fazer a diferença entre uma empresa que apresenta elevados níveis de competitividade, satisfazendo as necessidades dos seus clientes, e uma que opta por vias que agradam menos ao seu público – por se tratar de uma comunicação excessivamente tradicional ou, pelo contrário, por se tornar demasiado tecnológica.
De acordo com um estudo, denominado “The Digital Tipping Point” e produzido pela Verint – uma empresa que ajuda as organizações a procurar soluções para melhorar a experiência dos seus clientes –, e que contou com a participação de 24 mil pessoas e mais de mil organizações de 12 países, a maioria dos inquiridos deseja que o elemento humano continue a fazer parte dos serviços de apoio ao cliente das empresas.
Uma outra conclusão está relacionada com o facto de os clientes que recebem um serviço mais personalizado e humano serem aqueles que se manifestam de forma mais positiva relativamente às empresas que os disponibilizam. Mesmo as gerações mais novas, para quem os meios digitais são imprescindíveis, revelam a necessidade de receberem assistência técnica personalizada e humana por parte das organizações. Contudo, algo parece estar errado quando, mesmo sabendo isto, muitas empresas continuam a apostar cada vez mais em mecanismos automáticos e digitais, o que poderá pôr em risco a sobrevivência dos seus próprios negócios.
O equilíbrio deve ser a alma dos negócios
Se é certo que as empresas que abraçam o mundo digital estão “no caminho certo para o sucesso”, também é verdade que prescindir totalmente da comunicação tradicional pode ser um passo para o fracasso. É que os baixos custos da comunicação digital são um forte incentivo para as empresas, mas o risco de estas perderem clientes – principalmente pertencentes a gerações mais antigas e que estão pouco familiarizados com ferramentas tecnológicas – poderá ser um preço demasiado elevado a pagar. A solução é simples: encontrar o equilíbrio entre os serviços digitais e os meios de comunicação tradicionais, de modo a que os clientes saibam que, do outro lado está uma pessoa e não um robot, independentemente de a comunicação ser feita por email, telefone ou outra qualquer via.
Os autores do documento explicam que “não estamos numa era de polarização, mas sim de uma relação simbiótica entre a comunicação tradicional e a digital”. Isto é, actualmente “todos os canais devem estar presentes” nas empresas, sendo claro que “tal como a televisão não eliminou a necessidade de os consumidores ouvirem rádio, os meios digitais não vão eliminar a importância da comunicação pessoal, quer seja por telefone ou presencialmente”. As empresas têm, portanto, a oportunidade de reavaliarem o modo como interagem com os seus clientes, beneficiando de ambas as formas de comunicação e testando aquelas que melhor se adaptam a si e aos seus clientes.
Analisando os diversos sectores, as plataformas online são bastante populares entre os serviços bancários e na aquisição de cartões de crédito – o que, de acordo com os responsáveis pelo documento, está relacionado com a “maturidade dos serviços online” deste sector. Por outro lado, o telefone é o meio mais utilizado entre as operadoras de seguros, mas também no sector das telecomunicações e nas empresas de fornecimento de electricidade, gás e água.
Regionalmente, entre os participantes dos 12 países analisados, os consumidores do Reino Unido e dos Estados Unidos são aqueles que têm a maior preferência por ferramentas online, ao passo que os franceses, os alemães e os japoneses preferem dirigir-se pessoalmente aos balcões ou às lojas das marcas. Ao todo, 74% dos inquiridos revelam que não gostam de lidar com empresas que não disponibilizam um número de telefone para onde podem ligar. Esta percentagem é mais elevada na África do Sul (83%) mas mesmo em países como a Alemanha, onde a comunicação digital é praticada pela maioria dos cidadãos, esta opção continua bastante elevada (sendo de 64% nesta nação).
Curiosamente, e embora tenham uma grande importância para a captação e retenção de clientes, as redes sociais são a primeira opção para apenas 3% dos consumidores, quando falamos de contactar as empresas. O “cepticismo saudável” é apontado como um motivo que justifica esta fraca preferência dos inquiridos por empresas que disponibilizam apenas atendimento automático, tendo em conta que, quando as contactam por email ou através das plataformas digitais, as suas questões ou reclamações são normalmente ignoradas ou desvalorizadas.
E ainda que exista uma clara necessidade dos consumidores por um serviço humano e personalizado, por parte das empresas as escolhas são – em alguns casos consideravelmente – diferentes. Com 32% e 27%, respectivamente, os live chats e as apps são os canais de comunicação predilectos das organizações que responderam ao inquérito da Verint. Contrastando com as preferências dos consumidores, a maioria das empresas aposta cada vez menos nos meios de comunicação tradicionais e pessoais, encaminhando o mais possível os seus clientes para as respostas automáticas e para as diversas formas de comunicação digital.
A possibilidade de negociarem e de conseguirem um contrato mais favorável é um outro motivo pelo qual os consumidores tendem a preferir o contacto pessoal com muitas empresas. Contudo, apenas 56% das mesmas concordam que o contacto telefónico ou presencial ajuda os clientes a conseguir um determinado serviço por preços mais baixos ou com condições mais favoráveis. Por outro lado, 70% das empresas acreditam que os consumidores preferem utilizar apps, email ou SMS devido ao seu contacto fácil e ao facto de poderem estar em qualquer parte do mundo para o realizarem, sendo esta opinião partilhada por apenas 44% dos clientes.
Complexidade: a linha que separa o tradicional do digital
Em que situações devem, então, as empresas disponibilizar um serviço mais tradicional de apoio ao cliente e quando devem estas optar por mecanismos mais automáticos? O estudo revela que a questão passa por uma variante que faz toda a diferença: o nível de complexidade. Ou seja, quanto mais complexa e delicada é uma situação, maior é a necessidade que o consumidor tem de ser atendido por alguém – e não por alguma coisa -, revelando uma clara preferência pela interacção humana. Por seu turno, quanto mais simples é um problema, maior é a probabilidade de o cliente optar pelo contacto através dos meios digitais e automáticos, cuja resposta é mais rápida e tendencialmente satisfatória.
Como não poderia deixar de ser, as diferenças geracionais são evidentes neste aspecto. Para resolver questões simples, 30% dos baby boomers (que, de acordo com o documento, são os cidadãos que têm entre 51 e 70 anos) e 37% dos membros da silent generation (que são os que têm mais de 70 anos) preferem utilizar o telefone. Sem surpresas, estas são também as duas gerações que mais vezes se dirigem pessoalmente às lojas para tratar de assuntos fáceis. Por seu turno, os membros da geração X (que, para a análise, são os cidadãos que têm entre 36 e 50 anos) também tendem a escolher o telefone (23%) mas, com 17%, o email é uma opção igualmente válida. Também sem grandes surpresas, para os millennials (jovens que têm entre 18 e 35 anos) existe um grande equilíbrio entre a utilização do telefone (18%) e a preferência pelo correio electrónico (17%), para a resolução de problemas simples.
Apesar das naturais discrepâncias acima referidas, existe um ponto que reúne unanimidade entre os inquiridos, independentemente da idade: no que respeita a questionar uma dívida, exigir um reembolso ou pedir assistência técnica urgente, o telefone é a principal escolha de todas as gerações.
Mesmo tendo em conta que os millennials e as gerações seguintes serão os consumidores do futuro – o que leva as empresas a apostar mais na comunicação digital – importa reforçar que nem todos os clientes estão preparados para esta mudança, existindo 64% de inquiridos a afirmar que o apoio telefónico ou pessoal é mais conveniente e oferece um melhor serviço. Complementarmente, 67% dos participantes na análise acreditam que “o serviço online deveria ser mais rápido, mais intuitivo e mais capaz de servir as verdadeiras necessidades dos clientes” – o que ainda não acontece em muitas empresas e pode justificar o cepticismo sentido pelos participantes. Por fim, apenas 44% dos respondentes referem que as opções automáticas proporcionam, no geral, uma melhor experiência ao consumidor, quando comparadas com outros meios.
E proporcionar uma boa experiência aos clientes é um passo enorme para que estes tenham um comportamento favorável em relação às empresas. Recomendar a organização ou marca a amigos, assinar contratos de fidelização ou fazer um novo negócio com a mesma empresa são alguns dos comportamentos mais frequentes dos consumidores que se sentem satisfeitos com o serviço que lhes foi prestado. E não é apenas o contacto humano que o consegue garantir.
Consumidores estão mais exigentes e não querem passar despercebidos
De acordo com o documento, “as expectativas dos consumidores estão a aumentar”, existindo quatro em cada cinco inquiridos a assumir que procuram serviços personalizados e onde os seus interesses são tidos em conta. E este assume-se como um enorme desafio para as empresas, já que para proporcionar uma oferta personalizada, têm que conhecer bem os seus clientes, o que requer tempo e dinheiro. Todavia, da mesma forma que desejam ser reconhecidos como “especiais”, os actuais clientes pretendem igualmente que a sua privacidade seja assegurada e que os dados pessoais que disponibilizam sejam tratados com confidencialidade. Desta forma, tanto ou mais que um bom serviço de apoio ao cliente, onde este se sinta ouvido e esclarecido, as empresas devem garantir que se pautam pelos valores da confiança e da transparência, caso queiram construir boas relações com os consumidores.
No fundo, os clientes temem que as marcas deixem de os considerar “pessoas especiais que pagam por um determinado serviço” e passem a olhar para si como meros números. É que, embora as conclusões deste estudo possam parecer alarmantes para as empresas que estão a apostar mais na comunicação digital, a verdade é que, seja por telefone, por email ou através de outra qualquer via, os clientes procuram sempre uma boa experiência com as organizações, a qual passa por serem tratados com alguma exclusividade.
Importa neste caso referir que, através dos meios digitais, também é possível conseguir um contacto favorável e positivo entre os clientes e as empresas. E quando têm uma boa experiência online com uma marca, os millennials (principalmente) tendem a interagir mais com as empresas nos seus canais online do que os consumidores que conseguiram essa mesma experiência através do telefone ou dirigindo-se pessoalmente a uma loja. Depois de um bom primeiro contacto, 50% dos nativos digitais tendem a falar mais sobre as marcas, nas redes sociais, aumentando a popularidade da mesma junto dos seus amigos. Esta é também a geração que mais facilmente reconhece os esforços das marcas em proporcionar aos clientes uma melhor experiência online.
Ou seja, se as marcas pretendem apostar apenas na comunicação digital, devem estar conscientes de que devem proporcionar um serviço de qualidade e direccionado para os públicos mais jovens. Apesar de a tecnologia ser uma ferramenta que permite chegar a muitas pessoas com custos relativamente baixos, os consumidores estão mais exigentes e conhecê-los deverá ser uma prioridade das organizações, o que requer investimento. As empresas que não estão preparadas para dar este passo – que pode ser maior que a própria perna – deverão, então, continuar a proporcionar também serviços tradicionais de apoio ao cliente, optando pelo equilíbrio entre estes e os meios de comunicação mais automáticos.
No mesmo documento onde analisa as preferências dos consumidores e as escolhas das empresas, no que aos meios de comunicação diz respeito, a Verint apresenta também seis passos que ajudam as organizações a melhorar o seu serviço de apoio ao cliente e a alcançar a satisfação dos consumidores, neste mundo crescentemente digital.
Ouvir os clientes, pondo as suas necessidades e preferências no centro da sua acção é o primeiro conselho. Esta estratégia é fundamental para que uma organização compreenda de que forma consegue estar mais próxima do seu público, adaptando não só os serviços de apoio ao cliente, como também os canais de comunicação, os produtos disponíveis e a própria linguagem utilizada em campanhas de marketing.
Melhorar os serviços digitais, mas sem comprometer as ofertas tradicionais de retenção de clientes, é a segunda dica dada pela Verint. No fundo, e embora seja crescente a importância do meio digital na vida das populações, os clientes querem ter opções de escolha quando contactam com os seus prestadores de serviços. É que o mundo digital permite abrir a porta a novos públicos e ajuda as empresas a automatizar vários serviços, mas o factor humano é a chave para levar os consumidores a serem leais e fieis a uma marca.
Dar aos colaboradores as competências e as ferramentas que lhes permitam oferecer um serviço de qualidade é uma outra estratégia que as empresas devem utilizar para melhorar a experiência dos seus clientes. Com a interacção humana a ter um papel fundamental no alcance da satisfação dos clientes, proporcionar-lhes um serviço personalizado irá estimular um conjunto de comportamentos positivos. Para isso, os trabalhadores necessitam de ferramentas e dados que os ajudem a compreender e a conhecer os seus clientes, a fornecer-lhes um serviço próximo e a fazer os impossíveis para satisfazer as suas necessidades.
O quarto passo que deve ser dado está relacionado com a avaliação da experiência do consumidor que as empresas devem fazer, de modo a compreender o seu nível de satisfação. De acordo com esta estratégia, as organizações devem analisar o percurso dos clientes e os seus comportamentos enquanto consumidores, devendo também ler diversos relatórios onde são apresentados os perfis dos mesmos. Este conhecimento aprofundado acerca do público permite que as empresas possam corresponder de forma mais eficaz aos desejos dos seus clientes, melhorando crescentemente os seus serviços e aumentando os níveis de satisfação.
Ajustar as empresas aos tempos que correm, optimizando os níveis de compromisso e envolvimento dos clientes é o quinto passo para o sucesso, de acordo com a Verint. Num mundo altamente competitivo e onde os consumidores se assumem cada vez mais exigentes, é importante que, em todos os canais de comunicação, as empresas consigam ser eficientes e profissionais. Esta é uma forma de prevenir a existência de queixas e de estimular a interacção com o público. Neste aspecto, as organizações devem utilizar as opiniões dos consumidores para melhorar o serviço que proporcionam. Adicionalmente, estas devem também apostar na constituição de equipas de trabalho que se sintam motivadas e comprometidas com a própria empresa onde trabalham.
Para além de todas as estratégias de comunicação, as empresas devem compreender que a transparência é a chave para ganharem a confiança dos consumidores. Este é o último mas não menos importante passo que as empresas devem dar, se pretendem garantir a satisfação dos seus clientes. Se é verdade que os consumidores querem ser conhecidos pelas empresas, também é verdade que tem vindo a aumentar o medo que têm de sentir a sua privacidade invadida e os seus dados pessoais divulgados. A transparência no que respeita à utilização de dados é essencial para que os clientes confiem nas empresas e aceitem as ofertas que estas têm disponíveis. A opção por processos de autenticação que sejam rápidos e fáceis – como a biometria, que é considerada como um dos métodos mais seguros de identificação – é uma forma de garantir a confidencialidade dos dados e de ganhar a confiança dos clientes.
Jornalista