Estamos perante uma mudança de paradigma nas expectativas da força de trabalho. As conclusões do Randstad Workmonitor 2025 reflectem uma alteração fundamental naquilo que os trabalhadores mais valorizam nas suas vidas profissionais. A ênfase no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, no alinhamento de valores e na pertença a uma comunidade indica um desejo de experiências de trabalho mais significativas e holísticas. Estas prioridades representam não só uma resposta aos desafios dos últimos anos, mas também uma evolução a longo prazo na forma como os trabalhadores encaram as suas funções e contributos dentro das organizações
POR HELENA OLIVEIRA
É a primeira vez que acontece e apesar de separados por apenas um ponto percentual, os trabalhadores portugueses apontam a importância do equilíbrio entre vida pessoal e profissional (91%) como factor por excelência de motivação na escolha de um novo emprego, deixando a remuneração (90%) ligeiramente atrás. Esta é a principal conclusão do estudo Randstad Workmonitor 2025, que inquiriu 26 mil trabalhadores de 35 países sobre as suas principais aspirações e preocupações.
A nível global, o cenário repete-se com 83% dos inquiridos a escolherem também este equilíbrio como principal motivação, seguindo-se o salário com 82% das respostas, sendo igualmente a primeira vez que tal acontece nos 22 anos em que a empresa de Recursos Humanos publica este estudo. Esta mudança sublinha um desejo crescente entre os trabalhadores de harmonizar a sua vida profissional e pessoal, reflectindo as lições aprendidas durante a pandemia sobre a importância do bem-estar.
Um outro dado importante reside no facto de, a nível global e por faixa etária, a diferença entre ambos os indicadores ser bastante maior para a Geração Z, com 74% a dar mais importância ao equilíbrio entre vida profissional e pessoal do que à remuneração (68%). O apoio à saúde mental também ultrapassou o salário em termos de importância para a geração mais nova do mundo laboral (70%).
Tal como se pode ler no próprio relatório, os resultados para 2025 mostram que “estamos perante uma nova base de referência no local de trabalho, em que o sucesso é definido não só pelo que fazemos, mas também porque o fazemos, como o fazemos e com quem o fazemos”, o que funciona como um grito de alerta para os empregadores que ainda não perceberam que as prioridades da sua força laboral se encontram numa profunda mudança.
Atentemos aos demais resultados.
Personalização ou “porque o fazemos”
De acordo com a Randstad, os trabalhadores procuram um emprego que esteja mais de acordo com as suas circunstâncias, aspirações e valores únicos. A personalização define agora o sucesso na atracção e retenção dos melhores talentos. Por exemplo e a nível global, quase um terço dos trabalhadores já se despediu de um emprego por discordar dos pontos de vista da liderança, em termos éticos e ideológicos, e um número semelhante saiu devido à falta de desenvolvimento pessoal ou de oportunidades de progressão na carreira. Esta constatação demonstra a importância de promover uma cultura em que os valores estejam alinhados, uma vez que os trabalhadores dão cada vez mais prioridade ao propósito e à integridade no seu trabalho. Em Portugal, a percentagem desce para 25% dos inquiridos que afirmaram deixar um emprego se sentissem que não podia confiar na equipa de liderança.
Os dados para Portugal indicam também que a questão da flexibilidade surge como factor de motivação crescente com 42% dos inquiridos a afirmar que não aceitariam um emprego se este não oferecesse flexibilidade em relação ao horário de trabalho e 36% relativamente ao sítio onde trabalham (por exemplo, a partir de casa), resultados que a nível global ascendem a 47% e 39% respectivamente. Adicionalmente e a nível nacional, 24% afirmaram ter abandonado um emprego porque este não oferecia flexibilidade suficiente (31% a nível global).
Os números parecem assim reflectir uma normalização da flexibilidade do trabalho em todas as suas formas, com os empregadores a darem aos talentos mais liberdade para o integrarem nas suas vidas. O Workmonitor defende ainda que as entidades patronais que mais se adaptam aos desejos dos seus trabalhadores podem beneficiar de uma maior confiança, uma vez que 56% dos talentos a nível global afirmam que confiam mais nos seus empregadores se estes oferecerem benefícios de trabalho personalizados, incluindo todas as dimensões da flexibilidade inerente ao mesmo.
Por outro lado, a segurança no emprego apresenta-se como muito importante para 90% dos trabalhadores portugueses. E, caso o dinheiro não fosse problema, 49% dos que integram a geração Z optariam por não trabalhar de todo versus 29% dos baby-boomers (a nível global, 51% e 38%, respectivamente).
Promover um sentido de comunidade ou “com quem o fazemos”
Num aumento substancial em relação a 2024, os dados para este ano da Workmonitor confirmam que a falta de pertença é uma razão para potencialmente abandonar-se um emprego. Para muitos, sentir-se parte de uma comunidade é importante para o seu desempenho, produtividade e equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Os talentos estão a conferir uma prioridade cada vez maior a uma comunidade mais forte no local de trabalho em detrimento de um salário mais elevado, bem como a sentirem-se mais confiantes para abandonar empregos que considerem tóxicos.
Assim, encontrar um sentimento de pertença é cada vez mais fundamental para a retenção de talentos: mais de oito em cada 10 inquiridos a nível global afirmam também que este factor melhora o seu desempenho e o bem-estar no local de trabalho. Muitos procuram crescentemente um sentido de propósito e de conexão nas suas vidas profissionais.
Em Portugal, 46% dos entrevistados afirmaram que deixariam um emprego se não tivessem um sentimento de pertença em relação à empresa (55% a nível global) e uma esmagadora maioria (89%) considera que é possível atingir um melhor desempenho no trabalho se existir um sentido de comunidade com os seus colegas. Ademais, 92% garantem que este sentido de comunidade é importante para a sua saúde mental e bem-estar geral.
Um outro dado importante é o facto de, a nível global, 36% dos inquiridos indicarem que estariam dispostos a aceitar um salário mais baixo se isso significasse trabalhar num ambiente onde tivessem amizades significativas e camaradagem com os colegas. No entanto e também nos 35 países analisados, 63% dos inquiridos afirmam que escondem aspectos de si próprios no trabalho (contra 55% no ano anterior) e 44% abandonaram um emprego devido a uma cultura de trabalho tóxica.
A nível nacional, os inquiridos reportaram que não se importariam de ganhar menos dinheiro se tivessem bons amigos no trabalho (25%), se o trabalho contribuísse mais para as suas vidas sociais (29%) e se sentissem que o seu trabalho estava a contribuir de alguma forma para a sociedade/mundo (31% versus 39% a nível global).
Ganhar novas oportunidades através de novas competências ou “como o estamos a fazer”
Como já é do conhecimento geral, os avanços tecnológicos – em especial no domínio da IA – estão a remodelar o futuro do trabalho a um ritmo acelerado. Os trabalhadores estão conscientes deste facto, com 44% a afirmar que não aceitariam um emprego que não oferecesse oportunidades para desenvolver competências que os preparasse para o futuro. Os dados para Portugal indicam que 29% dos entrevistados demitir-se-iam se não houvesse oportunidades de I&D para preparar a sua progressão na carreira.
Embora 64% dos trabalhadores inquiridos nos 35 países do estudo acreditem que os empregadores melhoraram o apoio à aquisição de competências, são eles próprios que estão a assumir cada vez mais a responsabilidade de as adquirir: 35% estão dispostos a melhorar as suas próprias competências, embora 39% ainda considerem que a requalificação é principalmente da responsabilidade do empregador. Estes dados significam que os trabalhadores estão cada vez mais conscientes da necessidade de se manterem à frente num mercado de trabalho em rápida evolução, o que torna os programas de aprendizagem contínua e de requalificação essenciais para preparar as carreiras para o futuro, ao mesmo tempo que reflectem uma força de trabalho que valoriza a sustentabilidade da carreira a longo prazo e o desenvolvimento de competências.
Em Portugal, a percentagem desce para 54% entre os que afirmam que os seus empregadores estão a ajudar nesta necessária aquisição de novas competências para o futuro das suas carreiras, apesar de 68% terem feito saber que se sentem preparados para utilizar a tecnologia mais recente, como a IA, nas suas funções. Contudo, apenas 17% dos inquiridos a nível nacional dizem ter recebido mais oportunidades de formação ou desenvolvimento nos últimos seis meses.
Ou seja, o estudo da Ranstad chama a atenção para a persistência de lacunas entre o desejo de formação e os que a recebem. Os talentos mais jovens e os gestores estão a colher os maiores benefícios, mas dada a escassez sistémica de talentos, as organizações devem garantir que as oportunidades de qualificação chegam a todos os trabalhadores.
E que lições devem retirar os empregadores destes resultados?
O Randstad Workmonitor 2025 oferece uma mensagem clara aos empregadores: as expectativas da força de trabalho estão a evoluir e as organizações devem adaptar-se para atrair e reter os melhores talentos. Eis as principais conclusões para os empregadores:
- Dar prioridade ao equilíbrio entre a vida profissional e pessoal
É fundamental criar políticas que apoiem modalidades de trabalho flexíveis, como o trabalho remoto ou híbrido. As entidades patronais devem também assegurar cargas de trabalho geríveis e promover uma cultura que valorize o bem-estar dos trabalhadores. A oferta de benefícios como o apoio à saúde mental e opções de licença adicionais pode aumentar a satisfação geral.
- Alinhar os valores organizacionais com as expectativas dos colaboradores
As empresas devem analisar mais de perto a sua missão e os seus valores, assegurando-se de que estes estão em sintonia com a sua força de trabalho. Uma comunicação transparente e uma liderança ética são essenciais para criar confiança e lealdade entre os colaboradores. As iniciativas centradas na diversidade, equidade e inclusão (DEI) também podem reforçar o alinhamento com as prioridades dos colaboradores (apesar de, e por ordem de Trump nos Estados Unidos, muitas empresas estarem a abandonar os esforços neste sentido).
- Promover o desenvolvimento de carreiras
Investir em programas de actualização e requalificação é fundamental para satisfazer as exigências de crescimento dos empregados. Proporcionar oportunidades de mentoria, percursos de carreira claros e opções de mobilidade interna pode ajudar a reter o talento, ao mesmo tempo que promovem uma cultura de melhoria contínua.
- Construir um forte sentido de comunidade
As organizações devem criar ambientes que incentivem a colaboração, a ligação e a pertença. As actividades de formação de equipas, as políticas inclusivas e a promoção de uma comunicação aberta podem ajudar a reforçar as relações no local de trabalho. Os gestores devem receber formação para apoiar e fomentar eficazmente a dinâmica das equipas.
- Adoptar a tecnologia para preparar as carreiras para o futuro
A incorporação de tecnologia como a IA para simplificar as operações e aumentar a produtividade é crucial, mas deve ser complementada com programas de formação para capacitar os funcionários a utilizar estas ferramentas de forma eficaz. Os empregadores que dão prioridade à inovação orientada para a tecnologia, ao mesmo tempo que se concentram no desenvolvimento centrado no ser humano, posicionar-se-ão como líderes nos seus sectores.
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