O Relatório sobre Riscos Globais 2025 do Fórum Económico Mundial traça um quadro preocupante dos desafios que o mundo enfrenta num futuro próximo. Desde as ameaças imediatas relacionadas com as tensões geopolíticas até aos perigos iminentes da inacção climática e da má utilização tecnológica, o relatório destaca as vulnerabilidades interligadas que moldam o nosso destino coletivo. À medida que as nações se debatem com estes riscos crescentes, o relatório serve tanto de alerta como de roteiro para os líderes globais promoverem a resiliência num mundo cada vez mais volátil
POR HELENA OLIVEIRA
O Relatório sobre Riscos Globais 2025 do Fórum Económico Mundial (FEM) fornece uma análise abrangente das ameaças mais prementes que o mundo enfrenta a curto, médio e longo prazo (em 2025, 2027 e 2035). Na sua 20ª edição e com base no Inquérito sobre a Perceção dos Riscos Globais (GRPS, na sigla em inglês), que recolheu informações de mais de 900 peritos do meio académico, empresarial e político, o relatório destaca mudanças significativas nas percepções dos riscos globais. Estes riscos sublinham as crescentes complexidades e interdependências da sociedade moderna, exigindo uma acção global urgente e coordenada.
No geral e para 2025 [v. Gráfico 1], os conflitos armados entre estados surgem como o principal risco identificado por quase um quarto dos inquiridos, o que reflecte o aumento das tensões geopolíticas e a fragmentação a nível mundial.
Por outro lado, a desinformação e as notícias falsas lideram os riscos a médio prazo (são o principal risco identificado para 2027) e podem alimentar a instabilidade e minar a confiança na governação, complicando a necessidade urgente de cooperação para enfrentar crises partilhadas. Adicionalmente e mais uma vez, os riscos ambientais dominam o horizonte a 10 anos [v. Gráfico 2 abaixo], liderados por fenómenos meteorológicos extremos, perda de biodiversidade e colapso dos ecossistemas, ocupando a 2ª posição em 2025. Os riscos sociais, como a desigualdade, encontram-se igualmente posicionados no top 10 deste ano. Já os riscos económicos desceram na classificação desde o ano passado, com a inflação e a probabilidade de uma recessão económica a deixarem de ser os principais motivos de preocupação entre os decisores e os especialistas. Mas, como se pode ler no relatório, não existe lugar para a complacência: se nos próximos meses se assistir a uma espiral de tarifas e outras medidas restritivas do comércio a nível mundial – tal como é esperado – as consequências económicas poderão ser significativas.
Segue-se o Gráfico 1 representativo dos 10 principais riscos identificados pelos respondentes do GRPS para este ano:
Principais riscos para 2025, 2027 e 2035 em análise
Como já enunciado, e pela primeira vez, os conflitos armados surgiram como o principal risco para 2025. Cerca de 25% dos inquiridos identificaram as guerras, incluindo o terrorismo, como a ameaça mais significativa a curto prazo. Esta mudança sublinha o aumento das tensões geopolíticas e a fragmentação das relações internacionais. As crescentes disputas sobre reivindicações territoriais, o acesso a recursos críticos e as divisões ideológicas estão a alimentar conflitos que perturbam as cadeias de abastecimento globais, deslocam populações e desestabilizam regiões. O conflito na Europa de Leste, a guerra no Médio Oriente ou no Sudão são apontados como exemplos particularmente preocupantes desta tendência.
Por seu turno, os eventos climáticos extremos continuam a ser uma preocupação crítica, ocupando a segunda posição no top 10 dos riscos globais em 2025. O ano de 2024 marcou o ano mais quente de que há registo, exacerbando a frequência e a gravidade das catástrofes naturais. Os furacões catastróficos, os incêndios florestais sem precedentes e as inundações devastadoras causaram perdas económicas e humanas significativas. As comunidades vulneráveis, em particular no Sul Global, são desproporcionalmente afectadas, o que realça a necessidade urgente da acção climática para mitigar as catástrofes ambientais. Medidas de adaptação inadequadas e financiamento insuficiente para a resiliência climática amplificam estes riscos.
Por seu turno, a proliferação de informações falsas continua a ameaçar a coesão social e a governação (1º lugar em 2027). Com os avanços da tecnologia, nomeadamente da inteligência artificial, a difusão de conteúdos enganosos tornou-se mais generalizada, minando a confiança do público e exacerbando as divisões. A manipulação deliberada da informação para obter ganhos políticos ou financeiros tem consequências de grande alcance, minando as instituições democráticas e alimentando o extremismo. O relatório apela a uma ação colectiva para fazer face a esta “infodemia”, colocando a tónica na literacia mediática e nos quadros regulamentares. [v. artigo nesta edição: “Fim da verificação de factos: o futuro da verdade na era digital”]
Em relação a 2027 e no horizonte a 10 anos, o relatório do WEF prevê uma mudança no panorama dos riscos, com os desafios a longo prazo a tornarem-se mais pronunciados:
As preocupações ambientais dominam as perspectivas a médio e longo prazo. Prevê-se que os fenómenos meteorológicos extremos constituam o risco mais significativo, sublinhando os desafios persistentes colocados pelas alterações climáticas. A subida do nível do mar, as secas prolongadas e a intensificação das tempestades ameaçam deslocar milhões de pessoas, perturbar os sistemas alimentares e afetar as infra-estruturas. O relatório salienta a necessidade de uma abordagem global da governação ambiental, incluindo a cooperação internacional e a inovação no domínio das energias renováveis.
A perda de biodiversidade e o colapso dos ecossistemas é outro dos grandes riscos identificados a médio e curto prazo. Segundo o relatório, a degradação dos ecossistemas naturais ameaça não só a estabilidade ambiental, mas também os sistemas económicos e sociais que dependem da biodiversidade. A desflorestação, a poluição e a sobre-exploração dos recursos naturais estão a provocar taxas de extinção de espécies sem precedentes. Este risco sublinha a interligação entre a saúde ecológica e a prosperidade humana, uma vez que os serviços dos ecossistemas – como a polinização, a purificação da água e o sequestro de carbono – são essenciais para sustentar a vida na Terra.
Os resultados adversos das tecnologias de IA encontram-se igualmente bem representados nos riscos a médio e longo prazo. À medida que a inteligência artificial se integra cada vez mais em vários sectores, aumentam as preocupações com os seus potenciais impactos negativos. Prevê-se que questões como a deslocação de postos de trabalho, dilemas éticos e a má utilização das tecnologias de IA se tornem mais proeminentes até 2027. Por outro lado, o relatório alerta para uma potencial “divisão da IA”, em que o acesso desigual a tecnologias avançadas agrava as desigualdades sociais e económicas. Além disso, a utilização da IA como arma e o desenvolvimento de sistemas autónomos representam riscos de segurança significativos
Principais riscos projectados para a próxima década (V. Gráfico 2):
O relatório que, como já enunciado, se baseia nos pontos de vista de mais de 900 especialistas em riscos globais, decisores políticos e líderes da indústria inquiridos em Setembro e Outubro de 2024, traça um quadro muito claro da próxima década. Os inquiridos estão muito menos optimistas quanto às perspectivas para o mundo a longo prazo do que a curto prazo. Quase dois terços dos inquiridos prevêem um cenário global turbulento ou tempestuoso até 2035, impulsionado, em particular, pela intensificação dos desafios ambientais, tecnológicos e sociais.
Mais de metade dos inquiridos prevê uma crescente instabilidade dentro de dois anos, o que reflecte a fragmentação generalizada da cooperação internacional. As projecções a longo prazo apontam para desafios ainda maiores, uma vez que se espera que os mecanismos de colaboração enfrentem uma pressão crescente. Os riscos societais, como a desigualdade e a polarização da sociedade, ocupam um lugar de destaque tanto na classificação dos riscos a médio como a longo prazo. As crescentes preocupações com as actividades económicas ilícitas, o aumento do peso da dívida e a concentração de recursos estratégicos evidenciam vulnerabilidades que poderão desestabilizar a economia mundial nos próximos anos. Todas estas questões correm o risco de exacerbar a instabilidade interna e minar a confiança na governação, complicando ainda mais os esforços para enfrentar os desafios globais.
Todos os riscos da classificação aumentam a sua gravidade a longo prazo, reflectindo as preocupações dos inquiridos quanto ao aumento da frequência ou da intensidade desses mesmos riscos à medida que a próxima década se desenrola. Segue-se o Gráfico 2 dos 10 principais riscos identificados para os próximos 10 anos:
Implicações e Recomendações
O cenário de risco em evolução exige abordagens proactivas e de colaboração para atenuar eficazmente estas ameaças. Para o Fórum Económico Mundial, há que investir com urgência em várias áreas, destacando-se as seguintes acções:
Reforçar a cooperação global
Numa era marcada pelo aprofundamento das divisões, a promoção da colaboração internacional é crucial para enfrentar eficazmente os desafios transnacionais. O FEM sublinha que os líderes têm uma opção: promover a colaboração e a resiliência ou enfrentar uma instabilidade crescente. O reforço das instituições multilaterais, a promoção do diálogo e a criação de confiança entre as nações são essenciais para prevenir e resolver conflitos.
Investir na resiliência climática
Com os riscos ambientais na linha da frente, é imperativo investir em infra-estruturas e políticas sustentáveis para combater as alterações climáticas. Isto inclui a transição para fontes de energia renováveis, a protecção dos habitats naturais e a promoção de práticas sustentáveis. As parcerias público-privadas e os mecanismos de financiamento inovadores podem acelerar os esforços de adaptação às alterações climáticas, nomeadamente nas regiões vulneráveis.
Reforçar a integridade da informação
Para combater a propagação da desinformação, há que promover a literacia mediática, apoiar o jornalismo independente e desenvolver tecnologias para detectar e combater as informações falsas. Isto é essencial para manter a coesão social e a confiança nas instituições. A colaboração entre as empresas tecnológicas, os governos e a sociedade civil pode ajudar a criar um ecossistema digital mais seguro.
Desenvolvimento ético da IA
À medida que as tecnologias de IA avançam, é vital estabelecer directrizes éticas e quadros regulamentares para garantir que estas são desenvolvidas e utilizadas de forma responsável. Tal inclui abordar o enviesamento/preconceitos nos sistemas de IA, garantir a transparência e proteger os direitos individuais. As normas internacionais para a governação da IA podem ajudar a mitigar os riscos e promover o acesso equitativo aos benefícios tecnológicos.
Abordar a biodiversidade e a perda de ecossistemas
A proteção da biodiversidade exige uma acção corajosa e coordenada. Os governos, as empresas e as comunidades devem dar prioridade aos esforços de conservação, reduzir os resíduos e promover práticas sustentáveis de utilização dos solos. O FEM apela a um maior investimento em soluções baseadas na natureza e à aplicação de acordos internacionais, como o Quadro Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal.
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