A importância do carácter na liderança, o poder do arrependimento (sim, leu bem), o propósito enquanto alma das empresas de excelência, a identificação do talento e a descoberta do potencial oculto são os temas das obras que seleccionámos para leitura de férias. Se ao longo de todo o ano nos cruzamos com estas temáticas, é bom ter tempo para mergulhar nas mesmas e fazer uma reflexão sobre o seu verdadeiro significado
POR HELENA OLIVEIRA

The Character Compass: Transforming Leadership for the 21st Century

Mary Crossan, Gerard Seijts & Bill Furlong

De acordo com Mary Crossan, Gerard Seijts e Bill Furlong, “o carácter é fundamental para uma tomada de decisões e um funcionamento eficazes”. Mais especificamente, “molda uma série de coisas, incluindo aquilo em que reparamos no contexto em que operamos; a forma como gerimos o mundo à nossa volta; o que reforçamos através das nossas recompensas e castigos; quem envolvemos nas conversas e como as conduzimos; o que valorizamos; como interpretamos o feedback; o que escolhemos para agir; como lidamos com conflitos, desilusões e contratempos; os objectivos que estabelecemos para nós próprios; como comunicamos; e assim por diante.”

Dando como exemplo os desastres de liderança a que fomos assistindo nas últimas décadas, como a Enron, a Wells Fargo, a Volkswagen ou a Boeing, os autores deste livro recordam que o facto de testemunharmos o impacto global da crise financeira de 2008-2009, levou-nos a colocar a “Liderança em Julgamento” para analisar o que nos estava a escapar. E ao fazerem a pesquisa para o livro, os vários debates realizados com executivos de todo o mundo revelaram que os problemas que eles apontavam nestes vários exemplos não eram falhas de competência, mas sim falhas de carácter.

No entanto, como a ciência do carácter não constituía um tema a analisar, não havia acordo sobre o que o definia, se podia ser desenvolvido e como podia ser incorporado nas organizações. E foi na tentativa de compreender a anatomia do carácter que os autores resolveram escrever estas páginas.

Apoiando-se nos filósofos antigos e na investigação académica moderna, juntamente com uma abordagem a milhares de executivos, os autores conseguiram identificar uma estrutura robusta do carácter de um líder composta por 11 dimensões interligadas e um conjunto de comportamentos que podem ser observados, avaliados e desenvolvidos.

Enquanto o estudo da liderança se tem concentrado na compreensão da personalidade, das competências e do estilo, a ciência do carácter traz uma perspectiva fundamentalmente diferente. Com um conjunto definido de comportamentos associados que estabelecem os comportamentos como virtuosos, o estudo do carácter não se limita a compreender as diferenças individuais (personalidade), a habilidade ou a capacidade que trazem para uma tarefa (competências), ou a forma como demonstram a sua liderança (estilo). Em vez disso, o carácter tem a ver com os elementos fundamentais que influenciam tanto o julgamento como o bem-estar. Daí ser imprescindível a uma boa liderança. Leia este interessante livro sobre a ciência do carácter e saiba identificar falhas ou comportamentos virtuosos na empresa que lidera.

The Power of Regret: How Looking Backward Moves Us Forward

Daniel Pink

Daniel Pink é autor de vários livros bestsellers que investigam os comportamentos humanos, incluindo a importância do timing, o mecanismo por detrás da motivação e a sociologia da venda de coisas. O seu novo livro, The Power of Regret: How Looking Back Is Moving Us Forward assenta sobre a ideia errada do credo “Sem Arrependimentos”, defendendo que dar destaque ao fracasso e ao arrependimento é crucial no mundo dos negócios.

Para este livro em concreto, Pink conduziu o denominado World Regret Survey que, ao longo de 18 meses recolheu “arrependimentos” de cerca de 19 mil pessoas em 105 países (o inquérito ainda está aberto).

Toda a gente se arrepende, explica Daniel Pink. “É uma parte universal e saudável do ser humano. E compreender como funciona o arrependimento pode ajudar-nos a tomar decisões mais inteligentes, a ter um melhor desempenho no trabalho e no percurso académico e a dar um maior significado às nossas vidas”.

Com base em pesquisas da psicologia social, da neurociência e da biologia, Pink desmascara o mito da filosofia de vida “sem arrependimentos”. E, utilizando a maior amostragem de atitudes americanas sobre arrependimento alguma vez realizada, bem como o seu próprio World Regret Survey – que recolheu “arrependimentos” de todo o mundo – Pink expõe os quatro principais arrependimentos que cada um de nós tem:

Arrependimentos “fundacionais”: envolvem falhas na responsabilidade, consciência ou prudência, muitas vezes relacionadas com a saúde, finanças ou educação. Os exemplos incluem não poupar dinheiro suficiente, negligenciar a saúde ou não completar os estudos;

Arrependimentos por “ousadia”: estes arrependimentos resultam de oportunidades perdidas devido ao medo ou à hesitação. Muitas vezes envolvem não correr riscos na carreira, nos relacionamentos ou no crescimento pessoal. Os exemplos incluem não perseguir um emprego de sonho, não falar abertamente ou não iniciar uma relação.

Arrependimentos morais: Envolvem acções que violam os padrões éticos de uma pessoa, levando a sentimentos de culpa ou vergonha. Os exemplos incluem mentir, fazer batota ou magoar outros intencionalmente.

Arrependimentos relacionaiss: Trata-se de arrependimentos sobre relações que se deterioraram ou terminaram devido a negligência, mal-entendidos ou falta de esforço. Os exemplos incluem a perda de contacto com amigos, distanciamento familiar ou relações românticas falhadas.

Estes arrependimentos profundos oferecem uma visão convincente sobre a forma como vivemos e como podemos encontrar um melhor caminho a seguir.

O livro ajuda-nos a compreender o papel crucial que o arrependimento desempenha nas nossas vidas, desde o desenvolvimento de amizades, à tomada de decisões responsáveis sem esquecer a ponderação de riscos. Também destaca o tipo de arrependimento mais profundo e sugere variadas formas de fazermos as pazes com as nossas próprias desilusões e erros.

Tal como muitas emoções negativas, o arrependimento é muitas vezes visto como um sentimento puramente indesejável – um sentimento que devemos anular sempre que possível. No entanto, os psicólogos demonstraram que pode ser uma emoção eminentemente útil. “Seria uma péssima ideia eliminar o arrependimento da nossa vida”, afirma Aidan Feeney, professor de psicologia na Queen’s University Belfast. “É um mecanismo para aprender a melhorar a tomada de decisões – um sinal de que talvez seja necessário repensar toda uma estratégia.”

“Devemos ver o arrependimento como se fosse um professor a tentar dizer-nos algo importante”, afirma Pink, num livro especialmente dedicado aos líderes empresariais.

Deep Purpose – The Heart and Soul of High-Performance Companies

Ranjay Gulati

Poucos temas empresariais têm suscitado mais cepticismo nos últimos anos do que a noção de propósito empresarial, e por boas razões. Demasiadas empresas utilizam o propósito, ou a sua denominada “razão de ser”, como um veículo promocional para se sentirem virtuosas e parecerem bem aos olhos do mundo exterior. Algumas têm apenas ideias nebulosas sobre o que é o propósito e confundem-no com estratégia e outros conceitos como “missão”, “visão” e “valores”. Mesmo os líderes mais bem-intencionados não compreendem todo o potencial do propósito e dedicam-se a ele de forma superficial e sem entusiasmo.

Ranjay Gulati é professor de administração de empresas na Harvard Business School. O seu foco de investigação consiste em questões de liderança, estratégia e organização em empresas de elevado crescimento. O seu último livro explora a forma como todos nós podemos utilizar o poder do propósito para desbloquear o potencial escondido em nós próprios e nas nossas empresas.

Dados gerais indicam que mais de 90% das empresas apresentam uma declaração de propósito nos seus websites. E, quase sempre, essas declarações são vazias. Alguns líderes pronunciam-nas porque sentem que têm de o fazer, outros usam-nas como um manto de virtude para mascarar maus comportamentos.

Todavia, os líderes de empresas extraordinárias tratam o propósito como algo mais do que meras palavras, constituindo este uma verdadeira fonte de significado para a organização. Evocando uma visão do futuro que inclui e transcende o sucesso económico, o propósito inspira estratégias, influencia decisões e desperta as boas relações com clientes, empregados e outras partes interessadas. Serve de bússola para os executivos de topo e para os princípios que os regem. É também um sistema operativo que ajuda a construir relações de confiança.

Ao investigar o funcionamento das empresas com propósitos profundos, o professor de Harvard defende que o propósito catalisa o sucesso empresarial de várias formas.

Em primeiro lugar, o propósito é direccional. Em tempos turbulentos, funciona como uma estrela-guia, ajudando os líderes a definir estratégias mais precisas e a canalizar a inovação.

Em segundo, é reputacional. Permite às empresas criar confiança e lealdade junto dos clientes que admiram as organizações que tornam públicos os seus compromissos e os seus ideais.

Em terceiro lugar, o propósito é relacional. Quando as empresas adoptam o propósito como um sistema operacional, criam credibilidade, confiança e relações duradouras com parceiros estratégicos e fornecedores.

Por último, o propósito é motivacional. Os funcionários que vêem o trabalho como uma vocação altamente pessoal sentem-se motivados a dar o seu melhor. Quando as empresas “elevam” o trabalho, os empregados não ficam apenas “satisfeitos” ou “empenhados”, mas sim inspirados.

Por definição, o propósito obriga a pensar a longo prazo e em direção a uma visão de um futuro idealizado. Ao perseguir esta visão, os líderes com propósitos profundos comprometem-se a servir um conjunto de partes interessadas – não apenas investidores, mas também empregados, comunidades, o planeta, etc..

Nos próximos anos, garante o autor, as empresas que permitirem que os colaboradores liguem o seu propósito de vida ao propósito organizacional terão uma vantagem importante na atracção e retenção dos melhores talentos. Se é um líder, tome nota. E se é um colaborador, não se acomode: procure oportunidades em empresas com um propósito genuíno.

Talent: How to Identify Energizers, Creatives, and Winners Around the World

Daniel Gross & Tyler Cowen

Neste livro os autores começam por abordar uma questão central: num mercado saturado, como identificar o potencial não cultivado nos outros?

O livro reconhece um desafio comum para qualquer pessoa que se esforce por construir uma empresa, recrutar outros para uma causa ou medir as aptidões individuais. Como Cowen e Gross defendem, a identificação de talentos é tanto arte como ciência. Os autores citam modelos mentais das suas próprias experiências, bem como métodos observados de indivíduos que alcançaram um sucesso notável através da sua capacidade de identificar e desenvolver os talentos dos outros.

E ao reflectirem sobre as suas próprias experiências, tentam modelar quadros fiáveis para avaliar e prever tanto o talento como o potencial. Fornecem igualmente recursos, exemplos e estudos de caso para ajudar os não iniciados a observar “marcadores” de talento, a fazer as perguntas certas e mais úteis nas entrevistas e a quantificar o talento de forma mais precisa e contextual.

Cowen aborda o tema com uma formação enriquecida pelos seus conhecimentos de economia, bem como pela sua experiência na selecção de estudantes e empregados no ensino superior. Por seu turno, Gross traz uma visão orgânica da sua experiência como empresário, investidor e pioneiro no desenvolvimento de talentos. Estas perspectivas combinadas oferecem um casamento único entre a ciência e a arte. Por um lado, a ciência oferece muitas ferramentas úteis e práticas para categorizar traços que se correlacionam com o talento, ao mesmo tempo que esbarra em limitações legítimas. Da mesma forma, os autores revelam que, para além da ciência, existe um ofício cuidadoso e importante – a arte – para identificar de forma mais previsível o talento não pronunciado. Saiba como ambas se relacionam.

Hidden Potential

Adam Grant

Em “Hidden Potential”, Adam Grant, o famoso psicólogo organizacional e professor na Wharton Business School, autor de vários bestsellers, adopta uma abordagem única para explorar o conceito de “potencial”. Em vez de introduzir novas investigações ou conceitos inovadores, Grant junta habilmente estudos e ideias existentes, criando um argumento convincente para se descobrir o potencial oculto. O livro serve de guia sobre a forma como os indivíduos podem extrair mais de si próprios e dos outros, e sobre os sistemas que têm potencial para uma aplicação mais alargada.

As principais conclusões do livro incluem a perspectiva de que “o potencial não é determinado pelo ponto de partida, mas pela distância percorrida”. Grant explora igualmente o conceito de desconforto como catalisador do crescimento, exortando os indivíduos a aceitarem-no e a procurarem-no como um marcador de progresso.

A distinção entre personalidade e carácter é outro ponto central do livro, com o autor a sublinhar que a personalidade é uma predisposição, enquanto o carácter é a capacidade de dar prioridade aos valores em detrimento dos instintos.

Por seu turno, a motivação, de acordo com Grant, é alimentada por um sentimento de progresso, defendendo desvios para novos destinos quando somos confrontados com desafios. No domínio da liderança, o autor sublinha a importância de amplificar as vozes, mostrando a diferença entre os líderes fracos que as silenciam e os líderes fortes que acolhem e apreciam a dissidência. Grant conclui com uma perspetiva profunda sobre o sucesso, afirmando que este transcende a mera realização de objectivos e reside na vivência dos valores de cada um. Defende que aspirar a ser melhor todos os dias e libertar o potencial oculto são os valores mais elevados que se podem abraçar.

Em particular, o livro debruça-se sobre os seguintes pontos principais:

Mentalidade de crescimento: Grant enfatiza a importância de uma mentalidade de crescimento, a crença de que as capacidades e a inteligência podem ser desenvolvidas através da dedicação e do trabalho árduo. Isto contrasta com uma mentalidade fixa, em que os indivíduos acreditam que os seus talentos são inatos e imutáveis.

Prática deliberada: o livro realça a importância da prática deliberada – uma prática centrada, consistente e intencional, destinada a melhorar aspectos específicos do desempenho. O autor ilustra como o domínio é alcançado não através da mera repetição, mas através de esforços direccionados para a melhoria.

Resiliência e determinação: a resiliência e a perseverança são cruciais para a realização do potencial. É discutido o papel da coragem, da paixão sustentada e da perseverança para objectivos a longo prazo – e como a recuperação de reveses é essencial para o crescimento.

Mentoria e apoio: a influência de mentores, formadores e redes de apoio é também sublinhada. Grant mostra como a orientação e o incentivo de outras pessoas podem ajudar os indivíduos a reconhecer e a desenvolver o seu potencial.

Inovação e criatividade: Grant explora a forma como a criatividade e a inovação são componentes-chave da realização do potencial e fornece estratégias para fomentar o pensamento criativo e ultrapassar os obstáculos à inovação.

Propósito e motivação: encontrar um sentido de propósito e uma motivação intrínseca leva as pessoas a ultrapassar os seus limites. Grant discute como o alinhamento dos objectivos pessoais com um propósito maior pode aumentar a motivação e a persistência.

Superar preconceitos e estereótipos: o livro aborda o impacto dos preconceitos e estereótipos da sociedade no potencial percepcionado. O professor da Wharton School of Business sublinha ainda a importância de desafiar e ultrapassar estas barreiras para criar oportunidades equitativas para todos.

Em termos gerais, “Hidden Potential” oferece uma visão refrescante do desenvolvimento pessoal e profissional, dando ênfase às competências que podem ser aprendidas, à motivação sustentada e às oportunidades sistémicas. Com milhões de exemplares vendidos das suas obras anteriores, o último livro de Grant incentiva os leitores a olharem para além da genialidade inata e das realizações monumentais, defendendo o foco na viagem de crescimento e progresso.

Imagem: © Ben White/Unsplash.com

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