POR MÁRIA POMBO
As alterações climáticas são um dos maiores flagelos que o planeta Terra enfrenta actualmente. Esta ideia, que poderia ter sido retirada de um qualquer estudo ou artigo científico sobre o tema, é também aquela que melhor resume este artigo. De facto, e de acordo com a plataforma Climate Central, uma organização especializada em alterações climáticas e no seu impacto na sociedade, “a maior ameaça para a humanidade não é o aumento do número de máquinas, mas sim as alterações climáticas, as temperaturas extremas e outros factores ambientais”.
Num artigo publicado pela mesma organização, escreve-se que “as armas de destruição em massa, os episódios de temperaturas extremas, as crises relacionadas com a água, os desastres naturais e as falhas em termos de adaptação às alterações climáticas são, em 2017, os principais riscos para o planeta”, estando directamente relacionados com o aquecimento global. Complementarmente, o aumento de ataques terroristas e as migrações involuntárias em grande escala são igualmente fenómenos onde o sobreaquecimento global tem influência, ainda que de forma indirecta. Isto revela que, se por um lado existem vozes que afirmam que as alterações climáticas são uma fraude e uma invenção humana, os episódios que negam esta teoria são – infelizmente – mais recorrentes, evidentes e, acima de tudo, graves.
Por todo o mundo, os Verões serão cada vez mais quentes e a tendência é que o aumento da temperatura continue a subir de ano para ano e a “alta velocidade”, especialmente se a poluição atmosférica continuar a aumentar e se a utilização de carbono não for travada. O grave de tudo isto é que não é apenas o planeta – ou “os outros” – que sofrem com a utilização de combustíveis fósseis. Actualmente, mais de metade (cerca de 54%) da população mundial vive nos centros urbanos e as perspectivas apontam para que, em 2050, 2,5 mil milhões de pessoas escolham as cidades para viver. Ora, se estes são os locais que mais sofrem com esta tragédia e aqueles onde os perigos são mais iminentes, as consequências do aquecimento global não serão vividas pela natureza, mas sim por todos nós.
Para ilustrar esta questão, e em conjunto com a Organização Meteorológica Mundial, a Climate Central criou um mapa interactivo onde estima qual será a temperatura de diversas cidades, em 2100, comparando-as entre si. No mapa, é possível observar as temperaturas esperadas se não forem tomadas medidas que originem a redução drástica das emissões de gases poluentes, mas também a temperatura estimada caso aconteça o contrário e o aquecimento global for travado. Em alguns casos, as mudanças são tantas que o próprio clima deixará de ter as características que tem actualmente (o que já está a acontecer) – e de que é exemplo a cidade de Ottawa, no Canadá, cujas temperaturas rondam os 24ºC, mas que poderá vir a ter temperaturas semelhantes a Belize (31,3ºC), onde o clima é tropical.
De acordo com o mesmo mapa, Lisboa (que não é, de todo, a cidade mais quente do País) tem, actualmente e em média, temperaturas na ordem dos 27ºC, e terá, em 2100, temperaturas semelhantes a Sevilha, que ultrapassam os 31ºC. Contudo, a boa notícia é que, se alguma coisa for feita para travar as emissões de gases poluentes – ou para promover a sua emissão moderada –, dentro de 83 anos, as temperaturas poderão não ultrapassar os 29ºC, à semelhança do que se verifica, hoje em dia, em Madrid.
Se nada for feito, e com aumentos de temperatura entre os 8ºC e os 8,4ºC, Sofia (na Bulgária), Skopje (na Macedónia), Belgrado (na Sérvia) e Madrid (em Espanha) são as cidades onde o aquecimento estimado será maior, em 2100, estas serão obrigadas a tomar medidas extremas para que a população consiga sobreviver ao calor. Se, pelo contrário, forem tomadas medidas que originem o corte de emissões de gases poluentes, estima-se que a subida das temperaturas será de cerca de metade, rondando aumentos na ordem dos 4ºC.
Junho: um mês que ficará para a história
Num outro documento, a Climate Central explica ainda que Junho foi um dos meses mais quentes dos últimos tempos, tendo originado a tomada de medidas para enfrentar o calor ou remediar os seus danos. Um pouco por todo o continente europeu, diversas foram as situações em que as temperaturas, mais elevadas que o normal, fizeram vítimas mortais e obrigaram ao realojamento de centenas de pessoas, já para não falar nos hectares que foram devastados por fogos e nos recursos (naturais, materiais e humanos) que foram necessários para combater a onda de calor que invadiu a Europa.
[quote_center]As alterações climáticas são “a maior ameaça para a humanidade”[/quote_center]
O mesmo documento refere que, através da tragédia de Pedrógão Grande – cuja origem “não foi imediatamente clara” mas que se suspeita de uma trovoada seca –, Portugal foi palco do “pior fogo florestal em mais de um século”, e que o fumo provocado pelas suas labaredas “foi catapultado para a atmosfera e sentido a muitos milhares de quilómetros de distância, em várias zonas da Europa”.
Complementarmente, em declarações ao New York Times, o presidente da Quercus afirmou que, no nosso país, “os incêndios reflectem uma situação de negligência e uma abordagem errada da silvicultura”, a qual levou à “substituição em grande escala de pinheiros por eucaliptos em áreas ao redor de Pedrógão Grande”, sendo que estes “contêm um óleo que arde muito facilmente”. João Branco declarou ainda que “o governo prometeu melhorar as políticas florestais de Portugal, mas tudo continua na mesma”. Ao mesmo órgão, Don Whittemore, especialista no comportamento dos incêndios no estado do Colorado, explicou também que “a ideia de que os bombeiros poderão apagar, suprimir ou tornar seguro um incêndio é cada vez menos credível”.
As 64 vítimas mortais, os mais de 200 feridos e os cerca de 500 desalojados demonstram que, de facto, algo deve estar a falhar no nosso país e revelam que é a sobrevivência humana que está em causa, quando se fala de alterações climáticas, sendo necessário prevenir estas situações. Contudo, não se trata apenas de perdas humanas, mas também de danos em termos económicas, já que tiveram que ser accionados mecanismos de protecção civil, e foram necessários reforços – entre bombeiros e meios aéreos e terrestres de combate às chamas – vindos de França e Espanha para que as consequências não tivessem sido ainda piores, e será agora necessário reconstruir tudo o que o fogo destruiu.
Contudo, Portugal não foi o único país a sofrer com o aumento das temperaturas, no mês que, pelos piores motivos, ficou para a história de todos nós. Em Espanha, onde as temperaturas também foram mais elevadas que o habitual, um fogo obrigou à evacuação de mais de 1500 pessoas. Por seu turno, Inglaterra registou as mais elevadas temperaturas, desde 1976, e França e a Holanda foram obrigadas a accionar “planos de acção contra o calor” (importa salientar que a noite de 21 de Junho foi a mais quente de sempre, em França). Na Suíça, uma onda de calor alarmou a população e na Bélgica o calor obrigou ao racionamento de água, em algumas regiões.
É na prevenção que está o ganho
As justificações para a onda de calor que invadiu a Europa são variadas, estando essencialmente relacionadas com o aumento substancial da emissão de gases com efeito de estufa (a qual origina, precisamente, a subida das temperaturas). Isto significa que se as emissões de gases com efeito de estufa continuarem a aumentar, num futuro não muito longínquo as temperaturas demasiado elevadas, verificadas em Junho, passarão a ser comuns, nos próximos Verões.
À medida que a intensidade e a frequência dos eventos de calor acentuado aumentam, muitos países da Europa têm feito esforços para reduzir a vulnerabilidade ao calor extremo, dando às populações a possibilidade de sobreviverem e de evitarem as suas consequências. Um exemplo disso, apontado pelos autores da análise acima citada, foi a implementação, pelo governo francês, de um plano nacional de “combate” às altas temperaturas, após uma onda de calor registada em 2003. Este plano inclui cuidados de saúde, centros públicos de arrefecimento, visitas domiciliares a idosos que vivem sozinhos e outras acções que ajudam a reduzir a mortalidade provocada por este fenómeno. Embora os resultados deste plano não sejam ainda conhecidos, o documento indica que é grande a probabilidade de o mesmo ter evitado variados danos, nomeadamente em termos de mortalidade e problemas de saúde causados pelo calor.
Se, como refere a Climate Central, “as armas de destruição em massa, os episódios de temperaturas extremas, as crises relacionadas com a água, os desastres naturais e as falhas em termos de adaptação às alterações climáticas são os principais riscos para o planeta”, a utilização moderada de combustíveis fósseis e a diminuição da emissão de gases poluentes assumem-se como algumas das principais estratégias para os evitar. Fazer a transição para a utilização de energias renováveis, reciclar e reutilizar materiais, e prevenir a ocorrência de catástrofes como os incêndios (através, por exemplo, da limpeza das matas) são algumas das “fórmulas” para que o exacerbado aumento das temperaturas seja evitado, prevenindo-se assim a existência de danos futuros, em termos humanos, ambientais e também económicos.
Jornalista