POR GABRIELA COSTA
Em Fevereiro de 2011 a União Europeia regulou os prazos de pagamento a fornecedores, estipulando, na sua Directiva 2011/7/UE, um limite de 60 dias entre empresas privadas e de 30 a 60 dias entre empresas públicas e outros organismos estatais, e estabelecendo medidas de luta contra os atrasos nas transacções comerciais. Esta directiva europeia foi transposta para a legislação nacional em Maio de 2013, através do Decreto-Lei nº 62/2013.
Mas já um ano antes, “um dos mecanismos da troika foi estabelecer compromissos para a administração central e local”, de modo a que “a cadeia de valor continuasse a funcionar”: o Estado já não podia assumir determinadas compras “se não tivesse fundos”, sendo “obrigado por regras a cumprir prazos” de pagamento, como veio a impor a transposição da directiva europeia para a lei interna, defende João Almeida Lopes, presidente da Apifarma.
[quote_center]As grandes empresas podem suportar atrasos nos pagamentos, mas as pequenas não têm essa capacidade – João Almeida Lopes, presidente da Apifarma[/quote_center]
Na sua perspectiva, esta problemática do atraso na liquidação “funciona em cascata”, e prova disso é que os números relativos às empresas “que desapareceram, porque não tiveram capacidade para sobreviver, não são uma fantasia”. Muitas empresas não receberam o dinheiro a que tinham direito e, por sua vez, deixaram de ter liquidez e não conseguiram pagar os salários a tempo e horas, explica.
Este processo faz com que “fiquem afastados do mercado os que não têm capacidade para concorrer”, isto é, gera “uma concorrência que deixa de ser leal”. Para o também vice-presidente da Direcção da CIP, trata-se de um efeito grave, já que “as grandes empresas podem suportar atrasos nos prazos de pagamentos mas as pequenas não têm essa capacidade”. Perante um assunto “tão sério e importante”, que afecta de forma “dramática” sectores como o da saúde (onde o “sub-financiamento do Ministério” obriga à gestão de prazos muito alargados), quer a Apifarma quer a CIP se associaram, desde a primeira hora, à iniciativa da ACEGE, para “batalhar pela necessidade de haver pagamentos pontuais”, conclui João Almeida Lopes.
Identificar estratégias mais competitivas e sustentáveis
Corroborando que este é “realmente um problema em cascata nas empresas” que, em última instância, “acaba por “se traduzir num problema grave para toda a sociedade”, o que exige “um apelo adicional”, o novo presidente do IAPMEI acredita que, “é preciso introduzir mecanismos de Responsabilidade Social nos processos e procedimentos”.
Para Jorge Marques dos Santos, “as PME têm sido protagonistas de dinâmicas de resistência e superação”, concretamente no acesso a crédito ou face a exigentes níveis de competitividade. Mas, na sua opinião, muitas vezes, “as questões não são só financeiras”, mas passam também pela “forma como se organiza a actividade da empresa”.
[quote_center]As PME têm sido protagonistas de dinâmicas de resistência e superação – Jorge Marques dos Santos, presidente do IAPMEI[/quote_center]
Neste âmbito, a ausência de pontualidade constitui “uma reconhecida má prática”, e deve dar “origem a reflexão”, no sentido de “harmonizar” a realidade nacional com “o contexto europeu”. O mais importante, defende, “será divulgar o problema entre todas as partes”, e tentar “identificar estratégias mais competitivas e sustentáveis”, numa abordagem proactiva que o IAPMEI vem adoptando junto das empresas suas associadas, na procura das suas “reais necessidades”, conclui o responsável.
Parceiro do Compromisso Pagamento Pontual também desde o seu arranque, o IAPMEI promove uma “actuação concertada” por parte das organizações, que “reduza as falhas do mercado e permita a “afirmação das empresas” no mesmo. Para tanto, as empresas sabem que “precisam de inovar” e que “as práticas sustentáveis são diferenciadoras”, tal como reconhecem a importância da sua reputação na cadeia de negócio e “as consequências desastrosas” que um erro pode gerar nesta cadeia, explica Jorge Marques dos Santos.
Porque no actual contexto, “vivemos cada vez mais num mundo social”: tudo está “cada vez mais interligado” e “não faz sentido que haja compromissos com os nossos fornecedores, se estes não os tiverem também com os seus”. Em suma, o princípio da pontualidade “tem de funcionar ao longo de toda a cadeia de valor”, para efectivamente contribuir para a diferenciação do mercado. E por isso, apela, vale a pena ‘evangelizar’ as boas práticas que promovem uma mudança cultural na responsabilidade das empresas e do Estado sobre esta matéria.
[quote_center]O exemplo tem de vir de cima, das grandes organizações e dos municípios – Stephan Morais, administrador da Caixa Capital[/quote_center]
Sublinhando que o exemplo da Câmara de Lisboa é “fundamental para mudar o paradigma nacional de atrasos”, o Administrador da Caixa Capital considera que “o exemplo tem de vir de cima, das grandes organizações e dos municípios”, adiantando que se trata de “uma bola de neve que temos de interromper”.
A Caixa Geral de Depósitos também aderiu à iniciativa da Associação Cristã e “está a fazer um grande esforço para ser um exemplo, num contexto de grande contenção, como sabem”, admite Stephan Morais. A Caixa Capital “está no dia-a-dia das empresas” e, neste contexto, o esforço passa por “motivar parceiros “, por exemplo, através da dinamização de formações junto dos clientes e fornecedores, de programas de literacia financeira e da disponibilização de soluções de apoio à tesouraria.
No encerramento do Encontro B2B Lisboa, a ACEGE entregou os diplomas de participação no Compromisso Pagamento Pontual a empresas e entidades recentemente inscritas neste movimento, incluindo empresas municipais, como a EMEL, a EGEAC, a Gebalis e a Carris, entre outras.
Jornalista