O teletrabalho contribui para o desenvolvimento sustentável: os empregados deixam de utilizar o carro ou os transportes públicos e a pegada ecológica reduz-se. Uma empresa pode promover o teletrabalho e as suas vantagens ecológicas para atrair novos candidatos com consciência ambiental. Uma empresa que esteja empenhada no desenvolvimento sustentável terá uma boa imagem junto dos seus futuros candidatos. Há muitas variáveis e a pergunta manifesta-se novamente: terá vindo mesmo para ficar?
POR PEDRO COTRIM

A literatura estabelece uma ligação positiva entre o desempenho social e financeiro das empresas. É uma lei do bom retorno e não há volta a dar. Como se costuma afirmar na ACEGE a respeito dos pagamentos pontuais, é um «círculo virtuoso», uma evidente relação win-win. De acordo com a OMS, o bem-estar no local de trabalho consiste num «estado de espírito dinâmico, caracterizado por uma harmonia satisfatória entre as capacidades, as necessidades e as aspirações do trabalhador, por um lado, e as limitações e possibilidades do ambiente de trabalho, por outro».

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. O trabalho foi longamente encarado apenas como um meio de subsistência, uma forma de sustento em que o bem-estar pouco ou nada importava. Hoje em dia, tornou-se uma parte muito importante da sociedade e os trabalhadores tentam sentir-se bem na sua pele; é uma das componentes essenciais da nossa identidade. Uma das primeiras perguntas que se faz ao outro, quando o conhecemos, é «o que é que faz?»

Bem sabemos que «o polícia», «a motorista», «a médica», «o padeiro» ou «o mecânico» fazem parte do tecido nosso de cada dia; o trabalho é-nos tão intrínseco que dá sentido à nossa vida e permite-nos sentirmo-nos úteis à sociedade. A questão do bem-estar e da qualidade de vida no trabalho está plenamente revestida de significado.

Muda-se o ser, muda-se a confiança, que se parece ter regenerado em quem trabalha devido à pandemia: surgiu o teletrabalho, uma figura jurídica previamente existente que se tornou imperativa. Salvaram-se muitas vidas com o teletrabalho; pode salvar-se muita saúde mental com esta ferramenta.

Genericamente, a quem é concedido o teletrabalho concede-se grande responsabilidade. O tempo de trabalho não tem de ser absolutamente escrutinado se as tarefas forem bem cumpridas e em tempo devido.

A outra face da moeda: o teletrabalho não parece muito propício à criação de equipas. Por conseguinte, pode ser mais difícil a integração numa equipa que esteja inteiramente neste regime. Com má gestão, o teletrabalho pode inclusivamente ser prejudicial à coesão da empresa.

Uma vez que todo o mundo é composto de mudança, observemos mais atentamente estas premissas.

O recrutamento é um processo complexo e os empregadores têm de ser capazes de se evidenciar na conquista de novos talentos. A própria marca e as redes sociais podem ajudar na captação, mas procuram-se outros benefícios. Hoje em dia, o teletrabalho é parte integrante do que se considera qualidade de vida. Há um carácter acentuado de nomadismo nas novas gerações; se for concedido o teletrabalho, será mais fácil conquistá-las. Não viram as costas ao trabalho; nada disso. Os ‘mais jovens’ procuram significado. Cada vez mais se recusam a trabalhar sob quaisquer condições e a qualquer custo, mas não se recusam a trabalhar. Esta nuance é fundamental.

Há muitas profissões em que o teletrabalho não pode ser executado. Contudo, se houver essa possibilidade, atribui-se intrinsecamente uma responsabilidade essencial ao trabalhador: se for autorizado a teletrabalhar; tomando sempre novas qualidades, sente-se valorizado e compreende que se confia nele, esforçando-se mais para mostrar que os seus superiores têm razão na adjudicação da confiança.

O «círculo virtuoso» em acção: a melhoria da qualidade da vida profissional dos trabalhadores fá-los sentir melhor, o que aumenta a sua produtividade. Sabendo que tem esta vantagem, o colaborador envolve-se mais. Sentir-se bem no trabalho envolve o interesse pelo que se faz, a remuneração, questões de saúde e segurança, de ambiente de trabalho, as relações entre colegas e com a hierarquia: obviamente que um dos factores mais invocado é o interesse pelo trabalho, mas o sentimento de pertença a uma empresa ou organização é igualmente essencial. Para se sentirem realizados no trabalho, os trabalhadores precisam de saber que são úteis: a necessidade de reconhecimento é fundamental para encorajar os trabalhadores: inclui a remuneração, particularmente importante, mas também o encorajamento verbal. 

Continuamente vemos novidades, e as recompensas, qualquer que seja a sua forma, são uma novidade sempre essencial. A empresa deverá assegurar de que são significativas para os trabalhadores e que são entregues de forma atempada e adequada. Por exemplo, um bónus pelo cumprimento de uma quota de vendas ou uma promoção por um desempenho excepcional devem ser entregues logo após a realização. As recompensas atrasadas não motivam os empregados a melhorar o seu desempenho, sendo diferentes em tudo da esperança.

Uma relação de trabalho serena é essencial para uma boa qualidade de vida no trabalho. Cada colaborador deve poder beneficiar de uma certa autonomia e, ao mesmo tempo, ter a possibilidade de confiar na sua hierarquia. Um quadro de trabalho bem definido, os valores da empresa e gestores responsáveis são a garantia de uma melhor qualidade de vida no trabalho. É igualmente importante manter boas relações com os colegas e as conversas informais nas pausas fazem parte do espírito de equipa. Em caso de teletrabalho, os eventos adquirem uma nova importância. Obrigar uma presença semanal ou em dias certos do mês pode ser uma boa estratégia de consolidação.

Há mesmo muito nestas equações. A qualidade da vida profissional, o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, o tempo de deslocação, as perspectivas de carreira e a segurança do emprego e do mal ficam as mágoas na lembrança. Desta noção de equilíbrio se põe novamente a questão do teletrabalho, e também novamente põe a questão da confiança da administração nos seus trabalhadores e na sua capacidade de autonomia para lhes permitir trabalhar neste regime.

O teletrabalho contribui para o desenvolvimento sustentável: abandona-se o carro ou os transportes públicos, reduzindo obviamente a pegada ecológica. Uma empresa pode promover o teletrabalho, juntamente com as suas vantagens ecológicas para atrair novos candidatos com consciência ambiental e terá assim uma boa imagem. Há outra vantagem não despicienda: a facilidade logística perante o tempo atmosférico. Com o mau tempo, as cidades tornam-se caóticas. Vimos claramente o que sucedeu nas inundações deste Inverno; segundo os cientistas, são decorrentes das alterações que temos obviamente que combater. As bonanças estão quase nos outroras e e do bem (se algum houve) as saudades.

Já se verificou igualmente que o teletrabalho contribui para a redução do absentismo e dos atrasos. É verdade que o teletrabalho evita engarrafamentos e os atrasos devidos aos transportes públicos e o tempo cobre o chão de verde manto, mas há que estabelecer limites claros: teletrabalho não significa menos trabalho. Deverá trabalhar-se o mesmo número de horas que se trabalharia se se estivesse no escritório. O teletrabalho pode ainda facilitar a adaptação à empresa e a integração. No caso de doença, pode inclusivamente haver indicações médicas para trabalhar em tempo parcial ou em regime de teletrabalho.

Há ainda o mercado imobiliário, que continua inflacionado, ao contrário do tempo em que já coberto foi de neve fria; é cada vez mais complicada a subsistência das empresas menos implantadas. Trata-se de mais uma excelente razão para utilização das novas tecnologias de informação e comunicação. A opção pelo teletrabalho não tem obviamente de ser efectuada por defeito. Dependendo do sector e da actividade da empresa, as instalações podem ser indispensáveis. Por exemplo, as actividades que exigem a recepção de clientes são obrigadas a dispor de instalações. No entanto, tal não impede que os trabalhadores com um emprego que não exija a sua presença no local possam trabalhar em regime de teletrabalho. Poderão dizer, contrariados e entre paredes, «em mim converte em choro o doce canto deste meu apaziguamento».

No caso do trabalho presencial, sendo permanente ou flutuante, podem organizar-se as instalações de modo a que haja uma rotação de locais de trabalho. Um escritório pode não ser atribuído a uma pessoa, mas a várias. Quando alguém fica em teletrabalho num qualquer dia da semana, outra pode sentar-se no seu lugar. Exige coordenação, mas reduz o espaço necessário. Outra possibilidade é criar gabinetes temporários para as pessoas que não estão frequentemente presentes nas instalações.

Vejamos novamente a partir do outro lado: o isolamento é uma das maiores desvantagens do teletrabalho; pode ser difícil para algumas pessoas e manifesta-se sobretudo em quem faz exclusivamente teletrabalho. A solução talvez seja transformá-lo no afamado ‘híbrido’ em apenas uma parte da semana. O resto do tempo no escritório e permitirá o reencontro com o mundo ‘real’.

Gerir uma equipa cujos membros estão em teletrabalho pode ser mais complexo do que gerir uma equipa que comparece num mesmo local de trabalho; a comunicação pode ser menos cristalina e transparência terá de ser total, seja em relação ao horário ou às tarefas propriamente ditas. A administração deve apresentar total disponibilidade para as questões dos colaboradores. Marcar eventos em que todos terão de comparecer pode igualmente ser uma boa opção.

Marcar reuniões periódicas ou intercâmbios também pode ser uma boa iniciativa afora este mudar-se cada dia. Estes momentos dedicados a trocas de impressões permitirão a toda a equipa debater os assuntos. Se se encontrarem problemas ou se houver dúvidas durante o período de teletrabalho, os trabalhadores sabem que podem esperar por esta reunião para as apresentar.

O teletrabalho não serve obviamente a toda a gente. Obviamente, os trabalhadores precisam de ter algumas competências específicas; terão de ser rigorosos, embora o teletrabalho permita grande flexibilização; terão de respeitar determinados horários (auto-impostos ou impostos pela empresa) para poder trabalhar o número de horas previsto no contrato.

Também implica autonomia, com o trabalhador a ser capaz de se desenvencilhar sozinho e de contactar as pessoas indicadas, se necessário. Exige também disciplina e capacidade de concentração: o empregador deverá assegurar-se de o seu empregado não se distrairá facilmente com o que se passa em casa: a televisão, o telefone, os filhos, as tarefas domésticas e tudo o resto: Outra mudança faz de mor espanto / Que não se muda já como soía:

Também será essencial separar a sua vida privada da sua vida profissional: o empregado deve estabelecer limites e não as confundir. Deve saber parar de trabalhar na altura certa e começar a trabalhar também na altura certa.

É importante ter cuidado para não deixar o teletrabalho invadir a esfera privada. Algumas más práticas podem instalar-se rapidamente, como leitura de e-mails antes de ir para o trabalho ou a finalização de um ficheiro quando se chega a casa. No teletrabalho estas situações tornam-se ainda mais baralhadas, porque a linha que separa a vida privada da vida profissional se torna realmente muito ténue.

O teletrabalho coloca um ainda um problema de segurança para as empresas. No escritório, é provável que exista software antivírus, redes protegidas ou ficheiros encriptados. Se se trabalha a partir de casa, a empresa terá de garantir que todos os dados que se utilizam também estão bem protegidos.

É o novo mundo. Foi cantado por Camões, por Bob Dylan e por tantos outros vates. Habitualmente antecipam-se ao tempo e cantam louvores e deslouvores. Pede-se a gestores e aos trabalhadores que os ouçam.