Em 2015, a percentagem de empresas portuguesas que pagaram atempadamente aos seus fornecedores melhorou, face ao ano anterior. Contudo, e apesar da atitude positiva do tecido empresarial, Portugal ainda não conseguiu sair do grupo dos pagadores mais atrasados a nível europeu. Estas são as principais conclusões nacionais de um estudo da CRIBIS D&B sobre o comportamento das empresas de 34 países no que respeita ao pagamento a fornecedores
POR
MÁRIA POMBO

Após um período conturbado em termos económicos, Portugal começa, a pouco e pouco, a dar sinais de recuperação. O surgimento de novas empresas e a diminuição do número de organizações insolventes, por exemplo, reflectem uma atitude positiva e optimista dos portugueses, a qual também pode ser observada em aspectos relacionados com o maior número de empregados contratados e o aumento das exportações. Contudo, as consequências da crise ainda se fazem sentir, obrigando muitas empresas a atrasar os pagamentos aos seus fornecedores.

Estas são algumas das principais conclusões do “Payment Study 2016”, um estudo da CRIBIS D&B – uma organização especializada em recolha e tratamento de dados sobre o sector empresarial – que faz um retrato da evolução do comportamento das empresas no que respeita ao pagamento a fornecedores, entre 2007 e 2015, analisando 34 países (19 dos quais são europeus) e comparando-os entre si. O documento contou com a colaboração da Informa D&B, a qual disponibilizou informação sobre Portugal.

Em 2015, 20,1% de empresas cumpriram os prazos de pagamentos, registando um aumento de cerca de 3% face ao ano anterior. Um outro indicador de que existiu uma recuperação económica está relacionado com o facto de, em 2015, ter aumentado o número de novas empresas – e que foi de 2,4 por cada organização que fechou as suas portas, ou seja, por cada empresa que fechou, mais de duas surgiram no mercado.

Complementarmente, diminuiu o número de insolvências (que reflectem a dificuldade das organizações em pagar aos seus fornecedores) em mais de 6%, relativamente a 2014. Importa salientar que, entre 2007 e 2012, o número de pedidos de insolvência foi crescendo, tendo começado a diminuir apenas em 2013 – este foi, aliás um ano a partir do qual muitas organizações voltaram a ter uma atitude mais optimista e começaram a revelar melhorias em diversos indicadores (nomeadamente no pagamento atempado aos seus fornecedores).

[quote_center]Em 2015, 20,1% de empresas portuguesas cumpriram os prazos de pagamentos[/quote_center]

Contudo, a comparação dos resultados nacionais com a média europeia e com a performance de outros países permite concluir que Portugal continua bastante aquém do esperado, encontrando-se entre os piores da Europa no que respeita ao cumprimento de prazos de pagamentos.

Em 2015, mais empresas portuguesas pagaram atempadamente

Mas comecemos pelas boas notícias… Em conjunto com o aumento, face a 2014, da percentagem de empresas que pagaram a horas (e que passou de 17,4% para 20,1%), registou-se uma diminuição de dois pontos percentuais das empresas que pagaram com atrasos entre 30 e 90 dias (que passou de 11,6% para 9,6%), tendo diminuído também a percentagem de empresas que registaram atrasos nos pagamentos superiores a três meses (decaindo de 12,4%, em 2014, para 11,7% no ano seguinte).

Uma comparação destes números com aqueles que foram apurados em 2007 (ou seja, antes da crise) permite compreender que Portugal já esteve numa posição ligeiramente mais favorável – em 2007, 21,7% das empresas pagavam dentro do prazo, uma percentagem que é 1,6% superior à que foi apurada em 2015. Contudo, no período anterior à crise, 45,3% das organizações portuguesas atrasaram os seus pagamentos em cerca de 30 dias, sendo essa percentagem de 58,6%, em 2015. Complementarmente, 16,1% das empresas, em 2007, pagaram com atrasos entre os 30 e os 60 dias e, no ano passado, essa percentagem foi de apenas 6,1%. Ou seja, embora existam menos empresas a pagar dentro do prazo, também são menos as organizações que pagam com um atraso superior a 30 dias, o que revela algum empenho do tecido empresarial em ultrapassar o menos possível os prazos acordados com os fornecedores.

Independentemente de os resultados alcançados estarem aquém dos de 2007, a recuperação registada face ao ano anterior (2014) permite concluir que, embora com passos de bebé, as empresas nacionais estão no bom caminho, no que respeita ao cumprimento dos prazos acordados com os fornecedores e à recuperação da economia.

São as micro e as pequenas empresas que, com 24% e 21,1%, respectivamente, revelam ser as que mais (e melhor) cumprem os prazos de pagamentos. Paradoxalmente, são também estas que registam as maiores percentagens (6,6% e 4,3%, respectivamente) no que respeita a atrasos superiores a 120 dias. Ao nível das grandes empresas, apenas uma pequena percentagem (6,8%) paga atempadamente, sendo que a larga maioria (78,3%) atrasa os pagamentos em cerca de 30 dias, e apenas uma percentagem mínima (2,4%) paga com atrasos superiores a 120 dias. Independentemente da dimensão das empresas, os atrasos de 30 dias são os mais vulgares, sendo comuns a mais de metade das organizações, desde as mais pequenas às maiores.

[quote_center]As micro e as pequenas empresas são as mais cumpridoras dos prazos de pagamentos[/quote_center]

No que respeita à área de actividade, e com 24,1% de empresas a pagarem dentro do prazo, o sector da Agricultura, Silvicultura, Caça e Pesca é aquele que se assume como o mais pontual, a nível nacional. No pólo oposto, o sector da Construção regista a maior percentagem (20,4%) em termos de atrasos de pagamentos superiores a 90 dias, seguindo-se o do Retalho (com 13,9%) e o das Indústrias Extractivas (com 12,6%).

Em todas as áreas de actividade, a maioria das empresas continua a registar um atraso de pagamentos até 30 dias, sendo o sector dos Transportes e Distribuição (com 61,7%) e o das Indústrias Transformadoras (com 61,2%) aqueles que registam as maiores percentagens de atrasos desta ordem.

Portugal entre os pagadores mais atrasados da Europa

15122016_PagamentosA má notícia é que, apesar da melhoria das empresas portuguesas face a anos anteriores, a média nacional de cumprimento dos prazos de pagamento (20,1%) é bastante inferior à média europeia que, tendo em conta os 19 países apurados na análise, é de 37,5% – uma percentagem que, só por si, está longe de ser satisfatória. O copo meio cheio indica que o balanço é positivo, já que a maioria (52,1%) das organizações europeias paga com um atraso máximo de 30 dias e que apenas 3,5% destas entidades adiam os pagamentos em mais de 90 dias.

Seguindo a tendência registada em edições anteriores sobre este tema, a Dinamarca é a nação europeia que, com 87%, mais cumpre os prazos de pagamento a fornecedores, seguindo-se a Alemanha (com 72,3%) e a Hungria (que conseguiu alcançar os 59,8%). Na cauda da Europa, Portugal, a Bulgária e a Grécia são os países que menos cumprem os prazos, com apenas 20,1%, 21,7% e 22,7% de empresas que, nos respectivos países, pagam atempadamente.

Em termos de pagamentos com atrasos superiores a 90 dias, a Europa tem uma percentagem média de apenas 3,5%, a qual é seguida pela quase totalidade dos 19 países analisados. Fugindo a esta tendência, a Grécia é a nação que, com 19,9% das empresas a pagarem com atrasos superiores a 90 dias, tem maior dificuldade em respeitar este limite, seguindo-se a Polónia (com 14,8%), Portugal (com 11,7%), a Bulgária (que tem 10,3%), a Turquia (que chegou aos 5,3%) e Itália (que, ainda assim, conseguiu estar perto da média europeia, com 4,4%).

Entre 2008 e 2015, e contrariando a tendência europeia de diminuição do número de empresas a pagarem tardiamente, Portugal registou um aumento de 2,8% de organizações que registaram atrasos nos pagamentos superiores a 90 dias.

[quote_center]A maioria das empresas continua a registar um atraso de pagamentos até 30 dias[/quote_center]

Em termos gerais, e analisando todos os países que participaram na análise, a Dinamarca continua no lugar cimeiro dos melhores pagadores, seguindo-se a Rússia (com 72,7%) e a Alemanha (que, com 72,3%, alcançou o bronze). Entre os piores pagadores a nível mundial estão a Nova Zelândia (com apenas 2,3% de organizações a cumprirem os prazos de pagamento), as Filipinas (que registam apenas 2,8%) e a Austrália (que não conseguiu ir além dos 3,5%). Entre os piores está a Tailândia (com 19,5% do tecido empresarial a pagar a horas) e também Portugal (que é considerado o quinto pior pagador neste estudo). Com as maiores percentagens de atrasos superiores a 90 dias, e assumindo-se como exemplos a não seguir, encontram-se a Grécia, Portugal e a Polónia.

Os resultados desta análise são o reflexo de que o tecido empresarial português está a trabalhar para cumprir os prazos de pagamento acordados com os fornecedores. As melhorias existem e demonstram que os esforços para recuperar da crise começam a ter resultados positivos. Contudo, importa não esquecer que Portugal continua a ser um dos piores pagadores, a nível europeu e mundial, revelando que existe ainda um longo caminho a percorrer no que respeita a este tema.


Espanha, França e Alemanha são bons exemplos a seguir

Espanha, França e a Alemanha são três dos principais destinos de exportações portuguesas, e foram analisados neste estudo. O facto de estes serem três dos principais pagadores a Portugal torna-os relevantes, já que deles sai uma grande quantia do dinheiro que tem o nosso país como destino.

Para além da Alemanha, que é considerada uma das nações mais cumpridoras deste estudo, também Espanha e França apresentam percentagens superiores à média europeia em termos de pagamentos atempados: 72,3%, 46,9% e 39,1%, respectivamente. Tal como em Portugal, quanto maior é a dimensão das empresas, menor é a tendência de serem respeitados os prazos de pagamentos, sendo as organizações mais pequenas aquelas que mais respeitam as datas acordadas nos três países – em Espanha, 55,1% de micro empresas e 46,9% de pequenas organizações são pontuais, em França, este comportamento é seguido por 46,1% de micro e 27,6% de pequenas empresas, e na Alemanha cerca de ¾ destas entidades cumprem os prazos.

Com 49,8% de organizações cumpridoras, o sector da Agricultura, Silvicultura, Caça e Pesca é aquele que, em Espanha revela ter o melhor desempenho, e com 34,3% a área dos Transportes e Distribuição é a que apresenta a menor percentagem de cumprimento de prazos. Já em França, é o sector da Construção (com 51,8%) que dá o bom exemplo, sendo as Indústrias Extractivas aquelas que, com apenas 24%, se assumem ser um modelo a não seguir. E nenhum destes ultrapassa os 77,2% de organizações dos Serviços Financeiros que, na Alemanha, pagam atempadamente, nem sequer os 68,3% das Indústrias Transformadoras, o sector pior classificado neste país.

Qualquer uma destas nações é um bom exemplo para Portugal, podendo ser um modelo a seguir pelo nosso país no que respeita à elevada percentagem de empresas que pagam atempadamente aos seus fornecedores.


Jornalista