Os gestores estão a enfrentar desafios sem precedentes que ameaçam tanto o seu bem-estar como a eficácia organizacional. De acordo com um relatório que analisou a capacidade para uma boa gestão da mudança, os gestores enfrentam exigências emocionais 59% mais elevadas do que os colaboradores individuais e têm quase 40% mais probabilidades de enfrentar exigências quantitativas excessivas. É alarmante o facto de terem também menos 12% de probabilidades de receber apoio dos seus próprios líderes quando necessário. Esta “lacuna de apoio” não só põe em perigo a saúde dos gestores, como também compromete a capacidade de resistência e o desempenho das equipas que lideram
POR HELENA OLIVEIRA

A mudança sem precedentes tornou-se o novo normal, impulsionada pela transformação digital, pela pressão económica e por outras forças do mercado. Esta realidade captou a atenção dos líderes, estando a gestão da mudança actualmente entre as três principais prioridades dos directores de Recursos Humanos a nível mundial. A urgência é bem fundamentada – apenas 8% das organizações relatam confiança na gestão eficaz da mudança, enquanto 70% das iniciativas de mudança não atingem os seus objectivos.

Para além do impacto na empresa, uma mudança mal gerida gera graves custos humanos através do aumento do risco de depressão e da intensificação das pressões psicossociais, como a sobrecarga de trabalho, a diminuição do controlo e a ruptura dos sistemas de apoio que afectam particularmente os bons gestores. O relatório “State of the Workforce Report Winter 2025:Ch-ch-ch-ch-Changes: Workforce Change Readiness and Psychosocial Riskda meQuilibrium [meQ], uma organização que utiliza a ciência preditiva para dar aos líderes uma visão clara do desempenho dos seus colaboradores, analisou os resultados de 6724 trabalhadores, gestores e executivos de topo de RH a fim de fornecer informações práticas para criar resiliência à mudança e proteger o bem-estar dos trabalhadores neste ambiente dinâmico.

E uma das principais conclusões do relatório diz respeito ao facto de a escassez de gestores poder estar a agravar-se. Um outro estudo, intitulado “Mental Health at Work: Managers and Money”, da HKG, [HR, Payroll, & Workforce Management Solutions] citado pela Fast Company, conclui que para além das expectativas mais elevadas em relação ao seu desempenho, os gestores têm exigências emocionais 59% mais elevadas do que os membros da sua equipa, muitas vezes, enfrentam estes riscos elevados de forma isolada, sendo 12% menos provável que recebam apoio quando precisam. Os riscos são também precursores conhecidos do burnout, da falta de empenho e da desistência. A UKG concluiu que quase metade dos gestores intermédios admite a probabilidade de se demitir no prazo de um ano devido ao stress.

Porque é tão difícil realizar uma gestão da mudança eficaz?

O estudo em causa mostra um padrão hierárquico claro na forma como os diferentes níveis organizacionais percepcionam e respondem à mudança. Os executivos de topo de RH demonstram consistentemente a orientação mais positiva para a mudança, apresentando as pontuações mais elevadas em termos de clareza de objectivos (82,6%), “compostura” emocional (83,3%) e percepção dos benefícios pessoais da mudança (63,4%).

Já os gestores da amostra da meQ ocupam uma posição intermédia, apresentando atitudes moderadamente positivas, mas com pontuações notoriamente mais baixas do que os executivos de RH em todas as medidas, com quase um quarto (24%) a referir que a mudança os deixa inseguros quanto à forma de proceder.

Os colaboradores individuais da amostra meQ apresentam a orientação mais reservada em relação à mudança, bem como os níveis mais elevados de ansiedade, com 34% a expressarem incerteza sobre como proceder durante as mudanças e revelando uma menor abertura às mesmas. Esta forte divisão na prontidão para a mudança apresenta riscos significativos para a sua implementação, uma vez que os próprios trabalhadores encarregados de a executar na linha da frente – colaboradores individuais e as suas chefias diretas (os gestores) – parecem ser os menos equipados para navegar com êxito no processo de transformação.

Os principais resultados do estudo concluem que:

  • Existe um perigoso desfasamento entre líderes e demais trabalhadores no que respeita à preparação para a mudança

Os líderes de topo demonstram uma elevada confiança na gestão da mudança, enquanto os colaboradores individuais revelam uma ansiedade e incerteza significativas. Esta diferença cria um risco real, uma vez que os responsáveis pela execução das mudanças se sentem menos preparados para as gerir. Os dados mostram que a desconexão se manifesta em métricas concretas: 34% dos colaboradores individuais expressam incerteza quanto à gestão da mudança, em comparação com taxas muito mais baixas entre os gestores responsáveis pelas mesmas.

  • A geração Z apresenta desafios crescentes no bem-estar da força de trabalho e na gestão da mudança

À medida que a Geração Z ocupa uma parte cada vez maior da força de trabalho, apresenta padrões preocupantes nas métricas de bem-estar e de preparação para a mudança. Os dados revelam que os trabalhadores da Geração Z têm 64% mais probabilidades de se debaterem com a (falta de) motivação matinal, 25% mais probabilidades de declararem estados de esgotamento e 50% mais probabilidades de sofrerem um elevado stress no trabalho, em comparação com os colegas mais velhos.

Este stress acrescido estende-se à gestão da mudança, em que a Geração Z revela uma ansiedade de mudança 34% superior e uma estabilidade emocional 25% inferior durante as transições organizacionais. Esta lacuna pode comprometer o sucesso das iniciativas de transformação em segmentos crescentes da organização. A elevada turbulência emocional manifestada pela geração mais jovem nos locais de trabalho durante os processos de mudança, caracterizada por uma capacidade 25% inferior de manter a calma inicial em comparação com os trabalhadores mais velhos, levanta dúvidas quanto à sua capacidade de executar a mudança de forma eficaz, mesmo quando entram no mercado de trabalho em maior número, na medida em que os seus elevados níveis de ansiedade e a volatilidade emocional podem minar esta potencial vantagem. À medida que esta geração continua a aumentar a sua presença na força de trabalho, a sua luta acentuada contra o stress e a incerteza relacionados com a mudança representa um risco crescente para os esforços de transformação organizacional que não pode ser ignorado. Ou seja, apesar de demonstrarem uma maior capacidade de ver benefícios para si próprios na mudança, os seus níveis elevados de ansiedade e os desafios mais amplos de bem-estar representam riscos crescentes à medida que se tornam um segmento maior da força de trabalho.

  • Os gestores desempenham um papel importante tanto na preparação para a mudança como na mitigação do risco psicossocial

Os dados mostram claramente que os gestores que lideram com empatia e dão prioridade ao bem-estar da equipa aumentam significativamente a preparação para a mudança, bem como a segurança psicológica. Os trabalhadores que se sentem fortemente apoiados pelos seus gestores têm 44% mais probabilidades de verem o lado positivo da mudança organizacional e 40% menos de verem a mudança como desnecessária. O impacto no risco psicossocial é ainda mais significativo: estes trabalhadores têm duas vezes mais probabilidades de perceber que os conflitos são resolvidos de forma justa e 2,6 vezes mais probabilidades de receber ajuda quando necessário. O efeito protector estende-se à gestão do volume de trabalho, sendo 40% menos provável que os trabalhadores devidamente apoiados comuniquem um ritmo de trabalho excessivo. Estes resultados sublinham a importância da eficácia dos gestores na criação de equipas resistentes e preparadas para a mudança, reduzindo simultaneamente os factores de stress no local de trabalho.

  • Apesar do seu papel crucial, os gestores enfrentam um “défice de apoio” preocupante

Para além das expectativas mais elevadas em termos de resultados, os gestores enfrentam exigências emocionais 59% mais elevadas do que os colaboradores individuais. Os gestores enfrentam frequentemente estes riscos elevados de forma isolada, sendo 12% menos provável que recebam apoio dos seus próprios líderes quando necessário. Isto cria um risco em cascata, em que os responsáveis pela redução do risco psicossocial nas suas equipas estão, eles próprios, expostos a uma maior exposição sem o apoio adequado.

  • O risco psicossocial é endémico na força de trabalho, com mais de metade dos trabalhadores a referir pelo menos um risco psicossocial significativo no local de trabalho

De acordo com o estudo, existem lacunas particularmente preocupantes nos sistemas de apoio básicos: 52% dos inquiridos referem dificuldades em obter ajuda por parte dos seus supervisores quando necessário e 43% consideram que o trabalho não é distribuído de forma justa. Os gestores enfrentam pressões desproporcionadas e têm quase 40% mais probabilidades de referir exigências quantitativas excessivas do que os não gestores.

  • A preparação para a mudança está fortemente ligada a cinco factores específicos de resiliência

Uma análise dos dados de resiliência revela que a prontidão para a mudança não é simplesmente um produto da resiliência geral, mas que é impulsionada por factores de resiliência específicos e treináveis que as organizações podem desenvolver sistematicamente. Os dados mostram cinco capacidades-chave que distinguem os indivíduos preparados para a mudança, com o “Controlo das Emoções” a emergir como o diferenciador mais forte, com níveis 43% mais elevados entre o grupo preparado para a mudança. Quase tão importantes são o “Envolvimento” e a “Positividade”, com uma pontuação 42% e 41% superior, respectivamente, entre os indivíduos preparados para a mudança. Fortes capacidades de “Gestão do Stress” (38% superior) e um “Propósito Claro” (34% superior) completam os factores críticos. Ter a noção desta realidade é particularmente valioso para as organizações, uma vez que aponta para áreas específicas e accionáveis para programas de formação e desenvolvimento que podem melhorar significativamente a prontidão para a mudança na sua força de trabalho.

Em sentido inverso, O contraste mais dramático surge na ansiedade de mudança, em que os indivíduos com baixa resiliência têm aproximadamente o dobro da probabilidade de ficarem inseguros quando são mencionadas mudanças e aproximadamente 148% mais probabilidade de se sentirem aborrecidos com anúncios de transformação organizacional.

Os dados também sugerem que os indivíduos com elevada resiliência estão significativamente melhor equipados para a implementação da mudança; têm 81% mais probabilidades de ter objectivos claros durante os processos de mudança e 72% mais probabilidades de ver benefícios pessoais no mesmo. Talvez o mais revelador seja o facto de as pessoas altamente resilientes terem 59% mais probabilidades de antecipar positivamente a mudança. Estes padrões implicam que a resiliência não se limita a lidar com a mudança, mas sim que molda fundamentalmente toda a orientação de uma pessoa para a mesma, desde as reacções emocionais à preparação estratégica e à capacidade de encontrar oportunidades pessoais na transformação.

O custo elevado de ser um bom gestor

Como já referido anteriormente, os gestores têm um papel duplamente crucial no que respeita à força de trabalho. Os bons gestores protegem as suas equipas de pressões indevidas, mas também adoptam um papel proactivo na procura do bem-estar e do desempenho da equipa. As vantagens deste jogo “bidirecional” são evidentes. Sentir-se fortemente apoiado pela chefia tem um efeito profundo na experiência dos factores de risco psicossocial dos trabalhadores em todas as dimensões avaliadas pelo estudo.

O impacto é particularmente notório nas áreas da confiança e da justiça organizacional: os trabalhadores que se sentem fortemente apoiados pelas suas chefias têm 63% mais probabilidades de confiar nas informações de gestão face aos seus pares que não sentem o mesmo (70,2% vs 39,2%), 69% mais probabilidades de reportar confiança horizontal entre colegas (76,1% vs 45,1%) e mais do dobro das probabilidades de considerar que os conflitos de trabalho são resolvidos de forma justa (71,5% vs 35,1%).

Este sentimento reforçado de justiça organizacional estende-se à distribuição do trabalho, em que os trabalhadores fortemente apoiados têm 97% mais probabilidades de se aperceberem de uma atribuição justa das tarefas (60,6% vs 30,8%). Adicionalmente, o  estudo “Mental Health at Work: Managers and Money” concluiu que os gestores têm tanto impacto na saúde mental das pessoas como o seu cônjuge (ambos 69%), e ainda mais impacto do que os seus médicos (51%) ou terapeutas (41%).

Todavia, e também como já referenciado, no estudo da meQuilibrium, quando se comparam as experiências dos gestores e dos não gestores em matéria de factores de risco psicossocial, surge um paradoxo surpreendente. Embora os gestores declarem ter 88% mais influência sobre as suas decisões profissionais do que os não gestores (47,5% vs 25,3%), esta maior autonomia tem um custo elevado.

Ou seja, os gestores apresentam uma exposição significativamente mais elevada a riscos psicossociais no ambiente de trabalho: têm 59% mais probabilidades de declarar que o seu trabalho é emocionalmente exigente e enfrentam exigências quantitativas consistentemente mais elevadas, tendo 37% mais probabilidades de declarar que o tempo disponível para as tarefas é insuficiente e 34% mais probabilidades de declarar que precisam de trabalhar a um ritmo muito rápido.

O menor apoio percebido por parte da liderança tem, sem surpresa, um impacto negativo no bem-estar dos gestores e está associado a um maior stress e risco de burnout. Os dados revelam também que, em comparação com os não gestores, os gestores têm 36% mais probabilidades de declarar que se sentem esgotados e 24% mais probabilidades de declarar que consideram abandonar o seu emprego nos próximos 6 meses.

Desta forma, e para navegar nas complexidades do local de trabalho actual, é imperativo que os líderes organizacionais reforcem os sistemas de apoio aos gestores, garantindo que estes estão equipados para lidar com as pressões da mudança e manter o bem-estar das suas equipas.

Editora Executiva

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