Dia após dia, o tempo avança e chega o outono a Portugal. O outono é por definição o tempo da espera ativa. Depois da colheita, semeamos, na expectativa de que o inverno passará e iremos recolher os frutos da sementeira. A espera ativa é um exercício difícil: implica capacidade de espera, paciência, serenidade, persistência, resiliência e, ao mesmo tempo, requer atenção, visão, ação, otimismo, coragem. E não poderia haver analogia mais apropriada à situação económica portuguesa
POR MARIA DE FÁTIMA CARIOCA

Ninguém duvida da iminente recessão. Não é por acaso que a palavra “recessão” teve em agosto, mundialmente, quase 16 milhões de acessos no Google. E Portugal não será exceção. Muitos serão porventura os setores afetados, começando pelos que estão intimamente ligados ao consumo não essencial, como sejam o turismo e certa distribuição. Mas nesta recessão, devido à crise energética que catapultou os custos da eletricidade e dos combustíveis, a indústria e muitas outras atividades serão também fortemente atingidas.

Ora qualquer cenário de recessão implica uma espera ativa. E, por isso, muitos dos líderes das nossas empresas estarão hoje a perguntar-se duas questões. Em primeiro lugar, decidir o que podem fazer para que a sua empresa sobreviva ou, melhor ainda, saia fortalecida da recessão, transformando o que podem ser ameaças em oportunidades. Simultaneamente, entender como liderar a organização sem entrar num quadro de ansiedade obsessiva que tolda o discernimento, mas, pelo contrário, sendo capaz de manter a serenidade que favorece o borbulhar das ideias, a inovação e o bom desempenho. Cada empresa é única assim como as respostas o terão de ser. Inspirada num artigo muito oportuno do IESE que li no AESE Insight, partilho algumas pistas que podem ajudar à reflexão pessoal sobre como preparar-se para a recessão iminente.

  1. Poupar mais. Este é o tempo de aprender a viver com ainda menos recursos. A sobriedade e a eficiência são a chave que determina as mudanças críticas nos hábitos, nos processos e, em última análise, na cultura. Há que rejeitar a inércia do “sempre fizemos assim” e ter a coragem de planear e levar a cabo os ajustamentos necessários de forma ambiciosa.
  2. Manter a calma, estando preparados para o pior … e para o melhor. A melhor maneira de manter a calma é antecipar o que é possível, ou seja, identificar e trabalhar diferentes cenários, com realismo e otimismo (se não acreditamos que venceremos, já perdemos à partida). Para além disso será igualmente crucial manter a flexibilidade para se adaptar a todas as circunstâncias inesperadas que surgirão. Por último, comunicar, de forma muito transparente, com todos os colaboradores, não esquecendo os que trabalham a partir de casa. Partilhar com eles a situação, os sacrifícios que sejam necessários e também os sucessos entretanto alcançados. Tudo e todos fazem parte da vida da empresa.
  3. Identificar as despesas essenciais, aquelas que não se podem ou não se devem deixar de fazer, aquelas das quais não se pode prescindir. Não considerar apenas os custos operacionais, mas identificar também os investimentos que a não serem feitos podem prejudicar gravemente o crescimento, a vantagem competitiva ou o posicionamento da empresa. Há poupanças que matam os negócios e despesas que os salvam. Veja-se por exemplo a Formação que quando oportuna e adequada, pode ser uma excelente alavanca para potenciar um maior fortalecimento da empresa e a satisfação dos colaboradores.
  4. Não perder de vista o longo prazo. O objetivo de todas estas medidas não é apenas a sobrevivência da empresa, mas mantê-la saudável e bem preparada para o pós-recessão. Assim sendo, há que continuar a dedicar atenção à inovação, à evolução tecnológica, à competitividade do negócio no futuro, à sustentabilidade financeira da empresa.
  5. Cuidar das pessoas. Não pode acontecer que os temas financeiros façam esquecer tudo o resto que é importante e faz a empresa: a atração de talento necessário para acelerar a recuperação, a cumplicidade e motivação das equipas que potencia a criatividade, o contributo individual e a colaboração e a cumplicidade e compromisso com clientes, fornecedores e a comunidade que estarão sobre igual pressão.

“A crise brinda desafios, paixão de todo o líder” dizia o Prof. Raul Diniz que muitos conhecem da AESE Business School. E assim é: tempos difíceis sempre foram propensos à emergência da Liderança, pois requerem visão e estratégia. Este outono e o próximo inverno não serão diferentes. Os Líderes, nomeadamente os que dirigem empresas e outras instituições em geral, serão rapidamente chamados a tomar decisões estratégicas determinantes e muitas vezes difíceis, mas serão igualmente chamados a inspirar e contagiar todos à sua volta com a sua capacidade de visão, serenidade, confiança na equipa, resiliência e humildade. E no final, quando o Verão regressar, terão dado por bem empregue tudo o que semearam agora. Com diz o provérbio: “Quem planta no outono, leva um ano de abono”.

Artigo originalmente publicado no Jornal de Negócios. Republicado com permissão.

Professora de Factor Humano na Organização e Dean da AESE Business School