Em 1980, quando Reginald Brack começou a gerir a Time Inc., a gigante das revistas estava, acima de tudo, assente no antiquíssimo esquema dos favores a amigos. Segundo ele, não era exagero afirmar que as pessoas esperavam ascender na empresa pelo facto de terem nascido numa família importante, por terem ido para uma escola da Ivy League, por pertencerem ao country club certo ou por se movimentarem na alta-roda de Nova Iorque
POR PEDRO COTRIM
O crescimento no negócio das revistas de referência dependia da apresentação de novos produtos, de sensibilidade a respeito de tendências de consumo, de boas decisões editoriais e de atenção sobre a publicidade aos clientes. Brack acreditava que se a Time Inc. continuasse baseada na cultura de clientelismo que tinha desenvolvido iria acabar por se dissolver. Precisava de se assegurar que o crescimento da empresa seria conduzido por todas as pessoas com capacidades operacionais. A cultura de country club não podia ter lugar numa empresa moderna e bem gerida.
Quando assumiu o cargo de presidente da Time Inc., a empresa era conhecida pelo seu apego aos grupos de antigos alunos. Brack foi o primeiro CEO que não tinha andado numa escola da Ivy League. O esquema de família e amigos era absolutamente dominante.
Antes de assumir o cargo, o sucesso dependia muito mais dos dotes no golfe e de quem se estava próximo do que das capacidades e atributos das pessoas. Um resultado que é uma realidade chocante: em 1986, na sede, não havia uma mulher num cargo mais elevado que o de chefe de divisão.
A cultura tinha de ser alterada – a tarefa mais difícil que pode ser pedida a uma empresa – e tinha de ser mudada para uma orientação em relação ao desempenho. Na altura em que estão a suceder, não se pensa nas decisões empresariais, uma vez que as mudanças aparecem naturalmente em resultado dos processos. Contudo, o trabalho que foi feito para criar a cultura de desempenho e o foco nos clientes mantiveram-se separados. Brack ficou chocado à medida que ascendia na empresa e via a forma como as pessoas eram seleccionadas para os lugares. Confessa ter estado perto de abandonar a empresa em muitas ocasiões, pois, segundo ele, algumas pessoas em lugares chave não mereciam qualquer confiança.
Decidiu desenvencilhar-me da cultura da promoção de amigos e instaurou um procedimento no qual exigia que qualquer nomeação tivesse sempre de ser avaliada com rigor e que uma lista de pelo menos oito candidatos tivesse sempre que ser tida em conta. A primeira grande incumbência nas suas novas funções foi a da substituição do editor da Life Magazine. Muitas pessoas foram ter com Brack afirmando, «Sabe, prometeram-me o lugar» ou «Soand-So (um CEO anterior) prometeu-me que seria editor». Brack respondia «Muito bem, está na lista. Veremos».
Seguiu-se em frente e aplicou-se este novo processo. No final sobravam 10 candidatos. Houve uma reunião executiva para discutir a decisão e escolheu-se uma mulher para o cargo. Quando saíram da reunião, um dos colegas disse a Brack: «Reg, sabes o que acabaste de fazer? Acabaste de escolher, pela primeira vez, uma mulher para o cargo de editor da Life Magazine». Brack respondeu-lhe: «A sério?? Nem sequer foi um factor a ter em conta!».
Na Time continuou-se a colocar mulheres em lugares cruciais por serem as pessoas mais indicadas para eles, não por uma tentativa de diversificação. Uma posterior CEO foi uma mulher chamada Ann Moore; foi Brack quem a colocou no seu primeiro lugar de gestão quando a nomeou editora da Sports Illustrated for Kids.
Até aí, a empresa era um grupo de brancos protestantes. Tudo mudou quando se tornou numa empresa orientada para o desempenho. Reginald Brack ficou alguns anos no quadro de representantes da National Urban League e foi presidente durante quatro anos. Afirmou ter aprendido mais sobre a comunidade Afro-Americana sobre «diversidade» do que poderia aprender em seminários, o que o ajudou imensamente a mudar a cultura de empresa na Time Inc. Estava comprometido em permitir que as pessoas de cor pudessem competir de igual para igual com todos os outros com base no mérito.
Durante o seu mandato como Diretor Executivo, Brack desempenhou um papel importante na expansão da presença da Time Inc. e na diversificação da sua oferta de meios de comunicação social. Supervisionou a expansão da empresa para a televisão por cabo, incluindo a criação da CNN (Cable News Network) em 1980. Brack também liderou a aquisição pela Time Inc. de várias revistas e empreendimentos editoriais, como a Sports Illustrated e a HBO (Home Box Office).
No fundo, em vez de uma cultura baseada no amiguismo, instituiu-se um processo justo que permitia contratar e promover os melhores candidatos. Quando se mudam as práticas de contratação e de retenção, é preciso estar preparado para o reverso da medalha, que é deixar que as pessoas saiam, afirmou numa ocasião.
Para Reginald Brack, a única forma de poder dormir à noite era ter a certeza absoluta de que se fazia da forma mais clemente possível e de que se fornecia a maior rede de segurança que se conseguisse. Muitas pessoas que tinha despedido fora posteriormente ter com ele e disseram-lhe «Foi muito mau e estou muito zangado, mas tenho de aceitar que foi feito com justiça e compaixão». E é tudo o que se pode esperar, segundo Brack. Foi sempre uma coisa difícil, porque havia naturalmente centenas e centenas de pessoas afectadas. De forma a manter a competitividade e dar resposta aos accionistas e a Wall Street, não se podia manter aquela estrutura de custos que existia na altura.
Outro aspecto da cultura de desempenho que estava a tentar estabelecer foi o do foco nos clientes. Reginald Brack orgulhava-se de ter sido o primeiro CEO da empresa a vir das vendas e do marketing. Todos os antecessores, homens ilustres, tinham vindo do jornalismo ou, com bastante frequência, da parte financeira. Ele tinha uma orientação comercial.
Os primeiros tempos foram a época dos almoços com três martinis e dias bastante agitados. Na realidade, já se escreveram livros sobre o estilo de vida na Time Inc. da altura; Reginald Brack insistiu em manter-se afastado das pessoas que se limitavam a divertir. Os produtos da revista Time e da Sports Illustrated tinham tanta procura que não demoraram muito a ser vendidos. Foram tempos bons para todos.
Reginald Brack despendia o máximo tempo possível com os clientes. Pensou em todo o tipo de eventos: levou 75 pessoas para verem o primeiro 747 a sair do hangar. Eram clientes da indústria da aviação e das transportadoras aéreas. Levou um grupo semelhante a Paris para ver o primeiro voo do Concorde. Eram formas de aproximação aos clientes em acontecimentos a que dificilmente conseguiriam aceder. Brack concentrou-se em tratar realmente bem os clientes e a permitir-lhes experiências que tornariam a empresa apelativa.
A Time Inc. colocou uma forte ênfase no jornalismo de alta qualidade e na integridade editorial. Revistas como a Time, People, Sports Illustrated e Fortune eram conhecidas pelas suas reportagens aprofundadas, análises perspicazes e histórias envolventes. Era conhecida pela sua vontade de inovar e de se adaptar às mudanças no panorama dos media. A empresa aventurou-se em novas plataformas e formatos, como a televisão por cabo com a CNN e a publicação digital com a criação da Time Inc. Digital. Digital. ostentava uma carteira diversificada de marcas poderosas, cada uma com a sua própria identidade e público-alvo. Estas marcas tinham frequentemente um forte número de seguidores e eram reconhecidas como líderes nos seus respectivos nichos. Defendiam-se os padrões éticos no jornalismo, procurando a exatidão, a justiça e a objetividade nas suas reportagens. Os jornalistas e editores da empresa aderiram a códigos de conduta e ética profissionais.
A Time Inc. proporcionava aos seus colaboradores liberdade criativa e autonomia para explorar novas ideias e abordagens. Esta liberdade permitiu a criação de histórias inovadoras e perspectivas editoriais únicas. O segredo de todo este sucesso foi apenas um: coragem para mudar.
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