No seguimento do artigo publicado na passada semana sobre as principais tendências para 2014, publicadas pelo GlobalTrends , seguem-se as cinco restantes: os progressos na ciência e na tecnologia, os mercados e as gerações em transformação, o aumento dos riscos globais, a complexa luta contra o desemprego e, por último, a sobrevivência num mundo bipolar e cada vez mais incerto e imprevisível
6. A ficção científica chegou ou o impossível tornado possível Começando pelos locais de trabalho, e à medida que estes se tornam crescentemente automatizados, com robots e computadores a darem conta de um número crescente de tarefas, são muitos os que se interrogam se faz sentido culpar a tecnologia pelas taxas elevadas de desemprego, teimosamente persistentes, com que nos deparamos. Um estudo recente divulgado pela Universidade de Oxford sugere que quase metade dos empregos existentes nos Estados Unidos está em risco de ser usurpada por computadores à medida que os avanços na inteligência artificial progridem. Todavia, Eric Brynjolfsson, director do MIT Center for Digital Business, argumenta, numa famosa Ted-talk que, ao invés de lutarmos contra a máquina, é preferível trabalharmos lado a lado com ela para criar um resultado ainda melhor. Assim, os computadores devem ser encarados como “colegas de equipa” mas, para o fazermos, precisamos não só de redefinir o local de trabalho, como também a nós próprios. Uma outra “sub-tendência” nesta área é a tecnologia wearable (“vestível”). Em 2012, o mercado para este tipo de tecnologia – que envolve desde implantes auditivos a pulseiras com pedómetros – cifrou-se em quase 9 mil milhões de dólares. A analista Shane Walker, da IHS Global Insights, prevê que este valor possa atingir os 30 mil milhões de dólares até 2018. E se os dispositivos na pele começam a ser quase comuns, a próxima fronteira, de acordo com Gary Clayton, Chief Creative Officer na empresa de reconhecimento de voz Nuance, será a colocação dos mesmos “no interior” dos nossos corpos. Uma outra área tecnológica em franca expansão tem como alvo o sector automóvel. Na Austrália, a companhia de seguros RAC criou um carro “movido a atenção” controlado pelas ondas cerebrais: abranda quanto a atenção do condutor apresenta algum défice e volta a acelerar quando os níveis “normais” regressam. Por seu turno, as grandes fabricantes de automóveis, como a BMW, a Fiat, a Daimler, a Volvo e a Volkswagen, estão a testar sistemas que controlam, por exemplo, o volante, bem como outro tipo de sistemas de alerta que são activados quando um risco é detectado. Mas o controlo a partir da mente está a ser testado a diversos níveis: na Harvard Medical School, uma equipa desenvolveu um interface cérebro-para-cérebro não invasivo que permite a um humano controlar a cauda de uma ratazana. Investigadores na Universidade de Washington acreditam ter criado um interface humano-para-humano não invasivo, com um dos investigadores a enviar um sinal cerebral via internet para controlar os movimentos das mãos de um colega. Por seu turno, a Samsung está também a entrar no jogo, através de uma parceria com o especialista em computadores Roozbeh Jafari, da Universidade do Texas, para traduzir pensamentos em tarefas a realizar pelo computador. E se ainda não é possível vermos um dispositivo da Samsung controlado pela mente, não vai levar assim tanto tempo para que tal possa acontecer. Numa outra área futurista, estão as impressoras 4D. O facto da impressão a 3D ser ainda uma tecnologia imatura, não impede que o arquitecto e cientista do MIT, Skylar Tibbits, não esteja já a pensar em levá-la a um nível ainda mais avançado. O processo poderá ser utilizado para instalar objectos em locais de difícil acesso como em condutas subterrâneas e para construir mobiliário, carros e até edifícios. Uma outra tendência similar, em curso também no MIT, são uma espécie de robots forma de cubo que conseguem fazer uma “auto-montagem sem partes externas móveis”. Verdadeiros exércitos destes cubos móveis podem, de forma temporária, reparar pontes ou edifícios em situações de emergência, chegar a ambientes hostis ou inacessíveis a humanos, diagnosticar problemas e reorganizarem-se para fornecer soluções.
7. A transformação dos mercados e das gerações Começando pela Índia, considerada outrora como a nação mais promissora da Ásia, e de acordo com dados do Banco Mundial, as estimativas são para uma queda acentuada do PIB, devido essencialmente a uma quebra profunda na produção, no investimento e nos níveis de confiança nas empresas. E, apesar de as expectativas apontaram para uma recuperação do crescimento para 6,2% em 2014 e 2015, a Índia continua a travar batalhas significativas, com desafios gigantescos no que respeita à água, energia e ambiente, em conjunto com níveis elevados de corrupção, infra-estruturas pobres e lutas políticas internas. Já na China, e apesar de o ritmo do seu crescimento ter abrandado, mantendo-se agora entre os 7% ou 8%, não há sinais de recessão. Todavia, há que ter em atenção que muitos dos seus principais parceiros económicos, como a Austrália, o Canadá, o Brasil, a Malásia e a Coreia, poderão ser arrastados para uma economia mais recessiva, o que obviamente terá consequências para o gigante chinês. No que respeita aos transformadores dos mercados emergentes, o GlobalTrends afirma que não é só nos países desenvolvidos que as gerações mais novas pretendem ter mais influência, gerar mudança e optar por um estilo diferente de vida comparativamente à dos seus pais. Omesmo acontece com os jovens dos mercados emergentes – querem mais, tal como testemunhámos na Primavera Árabe e em outros protestos sociais (esta questão é desenvolvida na tendência 10). Fazendo parte da geração “Eu quero mais”, estes jovens são mais optimistas, hiperligados, com maiores níveis de escolaridade e maior rendimento disponível. E o que exigem são os “bens” provenientes do Ocidente, bem como uma enorme vontade de viajar. Graças à visão diferente que possuem da vida e dos padrões de consumo, as esperanças são neles depositadas no sentido de que têm o poder nas mãos para gerar um crescimento sustentável nos mercados emergentes.
8. O pânico versus a negação: a escassez de recursos e o aumento dos riscos globais A segurança alimentar é uma temática que gera preocupação crescente e que exige soluções inovadoras para aumentar a produção e reduzir os desperdícios. Por outro lado, as alterações climáticas, cada vez mais visíveis, conduzem a outro tipo de problemas. O mais recente relatório do IPCC confirmou uma relação directa entre a actividade humana e as rápidas alterações no clima que têm vindo a ocorrer nos últimos 100 anos e a intensificar-se ao longo da última década. E são já muitas as pessoas obrigadas a sair das suas terras e a transformarem-se em “refugiados” do clima. Um conjunto significativo de pesquisa indica que o impacto das alterações climáticas irá dar origem a novos desafios não só ambientais, mas também em termos de segurança e humanitários. Uma das questões que tem vindo a ser colocada por vários sectores da sociedade prende-se com a possibilidade de o consumo sofrer um “declínio” no futuro. São já muitas as pessoas que reconhecem que o padrão de consumo de produtos desnecessários apenas serve os interesses das empresas. Mas e se estas utilizassem todos os dados que recolhem para nos fazer comprar mais e mais, ajudando-nos a consumir menos? A ideia é que no futuro próximo as marcas possam ajudar os consumidores a perceber quanto é que estes consomem e o que tal significa para a sua saúde, rendimento e felicidade, ou seja, a sua marca favorita poderá construir um “cesto de compras” personalizado com base não só no seu histórico de compras passado, como também nos itens dos quais se desfez, entre outras possibilidades. E, neste caso, a chave será a lealdade à marca e não os descontos.
9. A luta contra o desemprego
10. Sobreviver no mundo bipolar A crise de liderança nos Estados Unidos encabeça esta tendência. Apesar de manter ainda a sua posição de superpotência, de apresentar uma dinâmica económica crescente e de dominar posições nas mais importantes instâncias internacionais, são muitos os que se interrogam se a economia norte-americana irá resistir às suas tempestades políticas. A crise de moralidade na zona euro constitui outra preocupação. A União Europeia reúne um conjunto muito diversificado de culturas, o que dificulta ainda mais a resolução das tensões económicas, políticas e de segurança que já há uns bons anos a afectam. A título de exemplo, o presidente irlandês Michael D. Higgins e alguns outros comentadores colocam a culpa nas diferenças existentes em termos de “moralidade” ou, mais precisamente, no abismo moral existente entre o norte, com enfoque na Alemanha, e o sul, destacando-se a Grécia. Enquanto a Alemanha é caracterizada como um exemplo moral por defender a frugalidade e evitar o aumento da dívida para estimular o crescimento, a Grécia é caracterizada como uma “receptora comum de corrupção”. Apesar de sabermos que nem tudo pode ser visto apenas a preto e branco, a verdade é que a Europa precisa de aprender a fazer a ponte entre as diferenças que caracterizam os seus países. Numa era em que a instabilidade é rainha, a confiança nos governos continua a decair perigosamente. A acrescentar a este fenómeno está o facto de mais de metade dos cidadãos do planeta viverem em locais isentos de liberdade politica e civil. Nos últimos três anos, as tensões sociais e a turbulência política “varreram”o mundo, desde a Primavera Árabe, ao movimento Occupy, sem esquecer os conflitos civis, como por exemplo, na Síria. O mundo está a assistir a uma alteração significativa: cada vez mais os cidadãos se unem para fazerem ouvir a sua voz, exigindo acção e desafiando os fundamentos políticos, económicos e os sistemas sociais. Existe um potencial real para que os conflitos se agravem e, sem se abordar as raízes do descontentamento popular, este tipo de demonstrações poderá ascender a níveis fora do controlo. Em termos empresariais, a combinação do lucro com a responsabilidade é igualmente uma tendência crescente. O desafio para as organizações e para os seus líderes é o de se concentrarem na criação de valor para as empresas e para as sociedades, em simultâneo. E é cada vez maior o número de empresas que está a adoptar abordagens que combinam o valor partilhado e o capitalismo responsável. Por outro lado, as instituições globais do século XXI estão a precisar de ser reformuladas. Num relatório recente, intitulado Now for the Long Term, um grupo respeitado de líderes globais apresenta uma reformulação de pensamento no que respeita aos progressos necessários para os desafios mundiais como as alterações climáticas, a redução das desigualdades económicas, a melhoria das práticas empresariais, entre outros, saltando finalmente o degrau da crise de curto prazo para se abordar os problemas e as suas possíveis resoluções a longo prazo. As recomendações deste relatório incluem, entre muitas outras, a criação de uma nova coligação que combine os países do G20, com 30 empresas e 40 cidades para neutralizar as alterações climáticas, a remoção de subsídios perversos que estimulem as energias poluentes e o apoio redireccionado para os pobres. Alinhar o rendimento com as contribuições fiscais é também uma medida defendida por muitos para diminuir o fosso crescente entre ricos e pobres. E, apesar de não existirem milagres e de o mundo não ser justo, existe já um conjunto significativo de CEOs de grandes empresas que estão a distribuir os seus chorudos bónus pelos empregados. O que pode constituir um bom presságio para o futuro. Artigo relacionado: Tendências globais I: Quem quer ficar ancorado ao passado? |
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