Imediatismo, curto prazo, sobrevivência. A crise financeira que marcou o mundo ao longo dos últimos cinco anos acabou por servir de desculpa para se adiar estratégias, políticas e acções que visassem encarar e solucionar os problemas globais que estão a marcar o século em que vivemos. Mas o tempo escasseia e não é possível esperar mais. O relatório excepcional que aqui damos a conhecer, realizado pela Oxford Martin School, comprova que os desafios estão identificados e que não faltam propostas para lidar genuinamente com os mesmos
POR HELENA OLIVEIRA

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À medida que o mundo começa a emergir, ainda que lentamente, da devastadora crise financeira que o assolou sem dar tréguas, está na altura de reflectir sobre as lições que dela emanaram e pensar, de forma “fresca”, sobre formas de evitar turbulências futuras. Ou, pelo menos, assim deveria ser, se o imediatismo ou o problema de curto prazo que afecta todo e qualquer tipo de políticas não continuasse a dominar os líderes de vários quadrantes da sociedade.

A pensar sobre a urgência de um “plano de longo prazo” para o planeta e para os seus desafios globais esteve a Oxford Martin School, uma comunidade de pesquisa interdisciplinar que conta com mais de 300 académicos, de renome mundial, e que é presidida, actualmente, por Pascal Lamy, antigo director-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Publicado ainda em 2013, e resultado de uma pesquisa que durou mais de um ano e que esteve a cargo de um conjunto de especialistas em diversas áreas provenientes de 13 países, a Oxford Martin School publicou o relatório Now for the Long Term, absolutamente excepcional e que vai ao encontro do principal objectivo da prestigiada escola de Oxford: a abordagem dos desafios globais mais prementes – e das oportunidades que os acompanham – do século XXI. Fundada e financiada por James Martin, falecido exactamente em 2013, o contributo deste génio das Tecnologias de Informação – autor de 67 livros e o maior financiador de sempre nos 900 anos de vida da aclamada Universidade de Oxford -, para a investigação interdisciplinar resultou em mais de 30 equipas de pesquisa que se debruçam, actualmente, sobre as mais diversas questões que dizem respeito ao nosso futuro.

O século XXI poderá vir a ser o melhor ou o pior século da história

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A provar a excepcionalidade deste relatório estão os números – em três meses, mais de 665 mil downloads em 150 países – em conjunto com cerca de 65 peças sobre o mesmo na televisão, imprensa escrita, web e rádio, sem falar nas reuniões que os seus responsáveis já tiveram com, por exemplo, Christine Lagarde, directora geral do FMI ou Ban Ki-moon, o secretário-geral da ONU que conta já com o contributo do relatório e da equipa que o realizou para a definição da agenda global pós 2015 (ano em que termina o “prazo” dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio). Adicionalmente, a Oxford Martin Commission for Future Generations é uma das três parceiras académicas do Fórum Económico Mundial, cuja habitual reunião em Davos está a decorrer esta semana. Razões mais do que suficientes para o VER apresentar um resumo das principais ideias – inovadoras – veiculadas pelo relatório, apesar de sugerir vivamente a sua consulta na íntegra.

Considerando que a humanidade se encontra numa encruzilhada – o século XXI poderá vir a ser o melhor ou o pior século da história – o relatório afirma que o resultado dependerá da nossa capacidade para perceber e aproveitar as oportunidades extraordinárias que temos ao dispor, bem como saber gerir as incertezas e riscos sem precedentes que enfrentamos. A intitulada “Comissão para as gerações futuras” tem como objectivo principal chamar a atenção para o fosso crescente existente entre o conhecimento e a acção dos muitos desafios da actualidade, identificar os motivos que estão a levar ao abrandamento das acções necessárias para os ultrapassar e sugerir caminhos para o cumprimento da agenda global.

Now for the Long Term é composto por três partes – Futuros Possíveis, onde são identificados os principais motores de mudança e abordados os desafios que irão dominar este século -, Futuros Responsáveis, nos quais a Comissão retira a sua inspiração a partir de exemplos passados em que os impedimentos para a acção foram positivamente ultrapassados, considerando igualmente as características da sociedade actual que frustram os progressos necessários e, por último, Futuros Práticos  – nos quais são estabelecidos os princípios de acção e as recomendações ilustrativas de como é possível construir-se um futuro sustentável, inclusivo e resiliente para todos.

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Futuros possíveis: as mega-tendências ou o futuro que é agora
O presente relatório começa por identificar as “mega-tendências” globais e as suas correspondentes e substanciais implicações. Demograficamente, a tendência que mais sobressai é a do envelhecimento rápido da população. Por outro lado, o mundo está cada vez mais “móvel” e a revolução na informação está a criar, por um lado, novas oportunidades e empregos em novas áreas mas, por outro, a ameaçar empresas e a “facilitar” o desemprego em outras. Ao mesmo tempo que assistimos a uma classe média em emergência, a desigualdade é uma tendência crescente. Globalmente, estamos a ser ameaçados por crises de recursos em termos alimentares, energéticos, ambientais e hídricos.

Mais pormenorizadamente, a Parte A do relatório – Futuros Possíveis – identifica as mega-tendências , e as suas inter-relações, agrupadas em sete grandes áreas:

  • Demografia: ao longo deste século, as alterações na demografia mundial – em termos de características e composição da população mundial – serão significativas. A população mundial está a envelhecer rapidamente, com os habitantes com mais de 60 anos a constituírem o segmento que mais rapidamente cresce. Em menos de 40 anos, uma em cada cinco pessoas terá mais de 60 anos. Estima-se que a população mundial atinja os oito mil milhões de pessoas em 2025 e, muito possivelmente, os 9 mil milhões em 2050, sendo que as estimativas apontam para que 60% da população global resida em África e na Ásia. Adicionalmente, aproximadamente 70% do crescimento ocorrerá nos 24 países mais pobres do mundo.
  • Mobilidade: O crescimento da população migrante não tem precedentes, sendo que a urbanização está também a ocorrer a um ritmo acelerado. Apesar de gerar novas oportunidades no que respeita à oferta de bens e serviços, os desafios dela decorrentes são significativos: estima-se que até 2030, mais de dois mil milhões de pessoas estejam a viver em favelas urbanas. Por seu turno, a classe média emergente poderá estimular o crescimento global através do aumento do consumo, do investimento em saúde, na educação e nas energias renováveis e no desenvolvimento sustentável da economia. Mas como não há bela sem senão, o risco de um fosso crescente entre esta nova classe média e aqueles que ficam aquém dela é quase certo. Ao mesmo tempo, o crescimento no consumo e nos rendimentos irá potenciar uma maior pressão em termos de recursos ambientais.
  • Geopolítica: A mudança em termos de poder económico para os mercados emergentes afigura-se como uma certeza. O relatório sugere que o PIB dos países em desenvolvimento seja já correspondente ao do mundo desenvolvido. A quota de exportações globais aumentou, ao longo da última década, de 33% para 43%, sendo que a China e a Índia deverão albergar 35% da população mundial e 25% do seu PIB até 2030. Mesmo que estas projecções sejam demasiado optimistas, a verdade é que a ascensão de novos poderes económicos dará origem a uma nova ordem política mundial.
  • Sustentabilidade: inerente à questão do longo prazo, a sustentabilidade exige a reconciliação necessária da procura em termos ambientais, sociais e económicos para a sobrevivência da humanidade e de outros organismos do planeta. Mas e acima de tudo, viver de forma sustentável significa saber lidar com a denominada “tempestade perfeita” associada à indivisibilidade da água, alimentação e clima. Os efeitos das alterações climáticas e da degradação ambiental podem “desfazer” os progressos enormes (ainda que insuficientes) no que respeita à pobreza, em particular porque os países pobres são os que menos preparados estão para lidar com estes problemas.
  • Saúde: com inegáveis avanços ao longo do último século, e que contribuíram essencialmente para aumentar a esperança de vida, a tecnologia biomédica e a capacidade para melhorar a qualidade dos cuidados de saúde deixa de fora os pobres e os mais vulneráveis. Para além de que estamos igualmente no centro de múltiplas transições que terão impactos diversos na saúde. Estes incluem uma transição demográfica de um padrão de elevada fertilidade e mortalidade para uma queda da natalidade (com excepção para a África subsaariana), para um envelhecimento da população e para um padrão diferente em termos de doenças: com uma redução das doenças infecciosas e epidemiológicas para o aumento de doenças crónicas e degenerativas associadas com a longevidade e com os estilos de vida urbanos e industriais. Estas alterações estão também relacionadas com uma viragem em termos de nutrição, na medida em que a má nutrição pode ser devida à fome ou ao excesso de calorias (obesidade). A ameaça mais preocupante na actualidade é o aumento das denominadas doenças não transmissíveis, como o cancro, a diabetes, as doenças coronárias e pulmonares, as quais foram responsáveis por 63% ou 36 milhões das mortes ocorridas em 2008.
  • Tecnologia: até 2020, estima-se que existam 4 mil milhões de pessoas online, cerca de 31 mil milhões de dispositivos conectados, 450 mil milhões de interacções realizadas por dia e mais de 50 triliões de gigabytes de dados. A noção de que o cibermundo enquanto “espaço” separado está a tornar-se redundante, na medida que a tecnologia se torna mais difundida e omnipresente e nos tornamos cada vez mais dependentes dela através dos modelos de negócio vigentes, do tipo de trabalho que desenvolvemos, das práticas sociais que absorvemos, em conjunto com a crescente oferta de serviços existente na rede. Todavia e apesar dos avanços tecnológicos terem revolucionado as nossas vidas, dando origem a um novo mundo de possibilidades e oportunidades, são também responsáveis pela maximização da vulnerabilidade a que estamos expostos. Por outro lado, estamos também a assistir a desenvolvimentos controversos na vida artificial, na monitorização e nas “melhorias” genéticas, na divisão global do trabalho, em conjunto com a invasão da nossa privacidade. Se o potencial dos “big data” está a gerar entusiasmo em muitas áreas, a ubiquidade das tecnologias da informação está igualmente a ampliar a desconfiança pública relativamente aos governos e à ciência, em vez de aumentar a coesão social.
  • Sociedade: Apesar de, no geral, as grandes tendências anteriormente apresentadas darem origem a oportunidades substanciais, o mesmo acontece no que respeita a riscos e desafios impossíveis de serem controlados. O relatório identifica, nesta secção, cinco grandes áreas nas quais, a seu ver, a acção é imperativa. A saber:

Ao nível social, de que forma é que o crescimento e o desenvolvimento podem ser mais sustentáveis e inclusivos?

Ao nível dos recursos, como é possível assegurar os alimentos, a energia, a água e a biodiversidade?

Ao nível da saúde, de que forma é que as infra-estruturas e os processos de saúde públicos poderão responder às necessidades de todos?

Ao nível da geopolítica, de que forma é que as transições do poder poderão dar origem a uma base inovadora de novas formas de colaboração?

Por último e ao nível da governança, de que forma podem as empresas, as instituições e os governos contribuírem para um crescimento mais inclusivo e simultaneamente sustentável?

Nesta parte A do relatório, a Comissão oferece aquilo que denomina como respostas possíveis.
São apresentados novos objectivos de crescimento e emprego, com um enfoque nos trabalhadores mais jovens e em locais de trabalho mais flexíveis. A importância da transparência na utilização dos recursos e na partilha de informação é reiterada, o mesmo acontecendo com as medidas para contrariar as alterações climáticas.

Ao mesmo tempo que assistimos a uma classe média em emergência, a desigualdade é uma tendência crescente

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São igualmente sublinhados os objectivos para reduzir as doenças não transmissíveis, remediar as deficiências nos sistemas públicos de saúde, implementar um conjunto de boas práticas já identificadas e efectivar parcerias criativas com a indústria farmacêutica.

Aos países é aconselhado que identifiquem interesses partilhados, que “actualizem” as suas instituições e que desenvolvam uma maior capacidade de cibersegurança à medida que são obrigados a navegar através de transições estruturais em termos de políticas internacionais. Um melhor sistema de governança irá ajudar esta nova cruzada, particularmente se a tecnologia for utilizada de forma criativa, se os indicadores sofrerem melhorias e se os negócios forem “afinados”por um novo diapasão que privilegie o investimento a longo prazo.

Futuros Responsáveis e os factores que impedem as mudanças positivas
Nesta secção, a qual o VER resume em poucas linhas, mas que também merece uma leitura na íntegra, são analisados os motores históricos da mudança transformadora, tais como a existência de crises, dos interesses partilhados, da liderança, inclusão, instituições e redes, parcerias, entre outros. Desde as campanhas para proteger a camada do ozono ou para reduzir a utilização do tabaco, ao Mercado Único Europeu e aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, são muitos os exemplos que demonstram de que forma grupos outrora dispersos se uniram para dar origem a progressos significativos. Todavia e no lado oposto do espectro, a Comissão considera como menos bem-sucedidas as características da política moderna, como  a denominada “tragédia dos comuns” [contribuir para um bem comum sem estarmos dispostos a pagar um custo pelos mesmos – o que acontece quando exploramos recursos naturais até ao seu esgotamento], a inexistência de uma visão e consciencialização intergeracional, o eterno problema dos chamados “interesses próprios” e a ausência de uma visão verdadeiramente global face aos desafios do planeta. Para demonstrar os factores responsáveis que tornam a mudança positiva tão difícil de acontecer, a Comissão elege os seguintes:

  • Instituições. São “demais” aquelas que lutam – muitas vezes, ingloriamente – por se adaptarem ao mundo hiper-conectado da actualidade
  • Tempo. O curto prazo que norteia os ciclos políticos e empresariais, salvo raras excepções
  • O envolvimento político e a confiança pública. A política não se conseguiu adaptar aos novos métodos nem aos novos níveis de participação

  • Complexidade crescente. Os problemas podem atingir uma escala muito maior e a um ritmo muito mais rápido comparativamente à sua possível resolução
  • Preconceitos culturais. A globalização pode ampliar as diferenças culturais e excluir “vozes importantes”.
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A agenda para o longo prazo
Construída em torno de cinco grandes princípios, com exemplos propostos para os ilustrar individualmente, a agenda de longo prazo proposta pela Comissão tenta dar resposta aos desafios identificados na parte A, aos factores impeditivos da mudança positiva sublinhados na parte B, ao mesmo tempo que aborda factores culturais e políticos que funcionam como os grandes obstáculos para um envolvimento de longo prazo. Adicionalmente, e caso o leitor esteja interessado em aprofundar o seu conhecimento, a parte C do relatório oferece igualmente princípios e propostas que têm em conta os interesses das gerações futuras com o objectivo simultâneo de promover a resiliência, a inclusão e a sustentabilidade. O VER elegeu, entre os cinco princípios propostos para uma “agenda de longo prazo”, apenas dois, dada a já avançada dimensão deste texto. Contudo e mais uma vez, sugere vivamente a leitura dos demais princípios.

Coligações criativas
Para responder aos desafios do presente século, a Comissão sugere três coligações por excelência.

Considerando que a luta contra as alterações climáticas precisa urgentemente de ser revigorada e face à inexistência de compromissos genuínos nesta matéria a nível global, a primeira coligação proposta – denominada C20-C30-C40 – tem como objectivo principal reunir um conjunto de multi-stakeholders constituído por 20 países (os que pertencem ao G20), por 30 empresas (com base na selecção de organizações que sejam afiliadas do World Business Council for Sustainable Development – WBCSD) e por 40 cidades (as que fazem parte do Cities Climate Leadership Group, grupo fundado em 2005, para coordenar políticas ambientais em 40 das maiores cidades do mundo).

São muitos os exemplos que demonstram de que forma grupos, outrora dispersos, se uniram para dar origem a progressos significativos

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Esta coligação, que continuaria a reportar à Conferência Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, teria como objectivo inspirar os países, as empresas e as cidades em causa a agirem, verdadeiramente, em prol deste desafio global, desenvolvendo acções concretas como, por exemplo, a utilização das lâmpadas LED na iluminação pública, promovendo a construção de edifícios eficientemente energéticos, a utilização de transportes públicos e automóveis movidos a energias limpas, aumentando as taxas de reciclagem, entre muitas outras medidas. Aos membros seria exigido que medissem as suas emissões de gases com efeito de estufa através de uma calculadora de carbono, com métricas devidamente identificadas para cada sector, país ou dimensão da cidade. A afiliação poderia estar dependente da performance, que seria avaliada de forma independente, por um sistema de acreditação, o qual poderia recompensar de alguma forma os mais “bem comportados”.

Com vista à protecção e segurança de dados, a segunda coligação sugerida – a CyberEX – tem como base a criação de uma plataforma para o benefício partilhado de governos, empresas e cidadãos, agindo como um “analista” de confiança no que respeita à selecção de dados para identificar ameaças comuns emergentes e ajudar a coordenar, de forma apropriada, respostas acessíveis para todos. Adicionalmente, teria como missão ajudar os países em desenvolvimento, nos quais as infra-estruturas cibernéticas são mais fracas. A CyberEx poderia igualmente funcionar como uma bolsa de valores independente, financiada pelos stakeholders participantes e que trabalharia para desenvolver métricas completas, consistentes e comparáveis das ameaças comuns, permitindo uma compreensão mais transparente e aprofundada para o longo prazo.

A terceira coligação proposta – Fit Cities (uma espécie de cidades “em forma”) – tem como objectivo criar uma rede global centrada nas cidades e dedicada ao combate das doenças não transmissíveis. A rede centrar-se-ia em cidades com mais de cinco milhões de habitantes, colocando à “mesma mesa” os produtores de alimentos, bebidas e álcool em colaboração com as autoridades de saúde pública, com a Task Force das Nações Unidas, com organizações da sociedade civil, entre outras. Adicionalmente ao facto de encorajar o estabelecimento de leis que regulem a promoção da saúde, a Fit Cities concentrar-se-ia na oferta de alimentação saudável, na qualidade da educação para a saúde e em mecanismos eficazes que promovessem os estilos de vida saudáveis.

Instituições abertas, inovadoras e revigoradas
A Comissão alerta veementemente para o facto de existirem organizações internacionais em “demasia”, mal aproveitadas, deficientemente geridas, obsoletas e que em nada contribuem para a resolução dos problemas que, supostamente, deveriam solucionar. A este propósito, o VER analisou, para além da secção a ele dedicada no relatório em causa, um artigo escrito por Pascal Lamy, antigo director-geral da OMC e um dos principais responsáveis por este estudo, que contextualiza, a nível histórico, a origem e consequente proliferação dos organismos internacionais.

Lamy relembra que quando as Nações Unidas e as instituições que emanaram do sistema de Bretton Woods foram estabelecidas, há quase 70 anos e no rescaldo da segunda grande guerra mundial, o poder económico e político estava concentrado nas mãos de uns poucos de “países vitoriosos”, sendo relativamente fácil chegar-se a um consenso no que dizia respeito à restauração da ordem internacional. Mas e desde então, a governança global tornou-se crescentemente confusa, o que tem vindo a impedir o progresso em áreas de preocupação mundial.

Para além dos mais de 190 países que pertencem agora às Nações Unidas, as instituições internacionais publicamente financiadas têm vindo igualmente a proliferar, sendo que não há um único exemplo de uma instituição multilateral que tenha cessado a sua actividade desde a segunda grande guerra. O resultado é, de acordo com este responsável da Comissão, Pascal Lamy, uma enorme ineficácia em conjunto com uma amálgama confusa de mandatos sobrepostos.

Em simultâneo, porções cada vez mais significativas do sistema internacional sofrem de falta de financiamento, o que as impede de atingir progressos em áreas significativamente críticas – um problema que só terá tendência para piorar na medida em que as necessidades e as expectativas de uma população crescente não param de aumentar. Adicionalmente, este tipo de organizações internacionais continua a trabalhar de acordo com princípios e acordos estabelecidos em meados do século passado, o que origina dois problemas: o primeiro diz respeito ao facto de os países com “menor peso” terem um poder significativamente desproporcional face aos demais, sendo que o segundo espelha o facto de a tomada de decisão global envolver agora quatro vezes mais de países comparativamente ao período do pós-guerra, já sem mencionar a gigantesca abundância de organizações não-governamentais e grupos da sociedade civil, que complicam mais do que produzem.

Uma parte significativa das organizações internacionais continua a trabalhar de acordo com princípios e acordos estabelecidos em meados do século passado, obsoletos

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Escusado será dizer que com os problemas mundiais a crescerem em termos de complexidade, e profundamente inter-relacionados, os processos de tomada de decisão deverão ser o mais ágeis e eficientes quanto possível. Quando comités numerosos se reúnem em paralelo, os países com as equipas mais bem recheadas de especialistas dominam os procedimentos, deixando de fora das decisões os demais (que são a maioria) e impedindo um diálogo com verdadeiro significado.

Assim, e para aumentar a produtividade das negociações globais, a Comissão recomenda a criação de coligações entre países motivados, em conjunto com outros actores, como empresas e cidades. Uma outra proposta passa por plataformas voluntárias que facilitem a criação de tratados globais em áreas vitais. Por exemplo, a Comissão sugere a inclusão de cláusulas de caducidade nas estruturas de governança da maioria das instituições internacionais com o objectivo de assegurar uma reflexão regular e uma análise da performance e propósitos da organização em causa. Esta análise deverá ser transparente e inclusiva, inspirando as instituições a serem mais inovadoras e adaptativas, ao longo dos seus mandatos, em resposta às exigências do século XXI. E, nos casos em que as instituições demonstrem ter preenchido e terminado os seus objectivos, a solução será o seu fecho, direccionando os recursos e as actividades para outras organizações que estejam realmente a contribuir para lidar com os desafios da actualidade.

Ainda no interior deste principio eleito pela Comissão, e para além de uma proposta de optimização da participação política, transparência e responsabilização, em conjunto com a ampliação das vozes dos cidadãos globais, uma das propostas que mais eco tem tido nos órgãos de comunicação social, é a criação de uma agência especializada que assegure a confiança, a longo prazo, das estatísticas que vão sendo produzidas. Denominada como Worldstat, esta agência teria como principal tarefa o controlo da qualidade das estatísticas globais, a avaliação das práticas nacionais, a regulação do seu uso indevido e a melhoria da recolha de dados. Entre um conjunto diversificado de outros objectivos, o Worldstat investiria em novas ferramentas tecnológicas e estabeleceria parcerias com empresas e universidades para gerar, recolher, agregar e interpretar os dados estatísticos.

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