Os Menores Não Acompanhados (leia-se crianças separadas de ambos os pais que não estão ao cuidado de nenhum adulto) “acumulam a experiência de ser refugiado a residir num país estrangeiro, com as experiências traumáticas decorrentes da ausência dos pais e da violência a que estiveram sujeitos”. Portugal tem finalmente um Centro de Acolhimento para estas crianças, onde, através de um projecto multidisciplinar que inclui integração em meio escolar e profissional, será possível construir um percurso de vida autónomo para cada um destes meninos e meninas, forçados a serem pequenos “cidadãos do mundo”
O primeiro Centro de Acolhimento Temporário para Crianças Refugiadas em Portugal foi inaugurado e entregue pela Swatch ao CPR – Conselho Português para os Refugiados no passado dia 15 de Maio. O novo CACR, cujas instalações se localizam na Quinta da Bela Vista, em Lisboa, tem como missão ajudar e proteger todas as crianças refugiadas que chegam ao nosso país sozinhas, por inúmeras razões, como explica ao VER Teresa Tito Morais. Implementado no âmbito do projecto “Uma Casa para o Mundo”, uma parceria da famosa marca de relógios com o CPR que reuniu o apoio de diversas entidades públicas e privadas e o apadrinhamento de Maria Cavaco Silva (que inaugurou o novo centro em conjunto com o presidente da Câmara de Lisboa e, durante dois anos, “acompanhou sempre de perto” a sua evolução), o CACR visa colmatar “a inexistência de estruturas apropriadas para o acolhimento destas crianças, em Portugal”, algo essencial face “às características de extrema vulnerabilidade deste grupo”. O projecto contempla uma intervenção multidisciplinar, nomeadamente ao nível socioeducativo, escolar, familiar e em termos de emprego e formação profissional. Em entrevista ao VER, a presidente do CPR sublinha ainda que todas as crianças encaminhadas para este centro ali permanecerão “até se considerar que estão reunidas as condições para uma vida autónoma”, tendo em conta “cada aspecto do seu percurso no país que as acolheu: Portugal”.
Como surgiu a ideia para a criação de um centro de Acolhimento Temporário para Crianças Refugiadas em Portugal, num contexto em que 90% das vítimas de guerra são civis e, destas 50% são crianças? Com o objectivo de obter mais informações sobre esta população, o Conselho Português para os Refugiados, com o apoio da Organização Internacional das Migrações (Missão de Portugal), desenvolveu, entre 2006 e 2007, um levantamento sobre a situação dos Menores Não Acompanhados (MNA) em Portugal, no âmbito do programa Fundo Europeu para os Refugiados. Uma das preocupações centrais resultantes da elaboração deste relatório prendeu-se com a inexistência de estruturas apropriadas para o acolhimento destas crianças, em Portugal. Até agora, tem sido o CPR a assegurar o primeiro acolhimento destes menores, no seu Centro de Acolhimento para Refugiados (CAR), na Bobadela. Porém, o CAR foi desenhado para o acolhimento de requerentes de asilo adultos, não fornecendo, desta forma, a recepção ideal para crianças. Devido às características de extrema vulnerabilidade deste grupo, pareceu-nos essencial o desenvolvimento de estruturas apropriadas para o acolhimento destas crianças. Paralelamente, já em 2006, aquando da inauguração do Centro de Acolhimento para Refugiados da Bobadela, António Costa (à época Ministro da Administração Interna), havia já dirigido informalmente o convite ao CPR para a criação de um centro específico para crianças em Lisboa. Como irá funcionar este Centro, ao nível de valências para estas crianças e jovens e quais são os seus objectivos fundamentais? Resumidamente, o Centro de Acolhimento para Crianças Refugiadas terá os seguintes objectivos: melhorar as condições de acolhimento das crianças refugiadas em Portugal; oferecer às crianças refugiadas um ambiente seguro, adequado às suas necessidades específicas; promover a autonomia pessoal; impulsionar as capacidades sociais, afectivas, criativas e intelectuais das crianças; fomentar valores de responsabilidade, tolerância e respeito com os outros; e ser uma solução duradoura para as crianças refugiadas. Em suma, este Centro pretende oferecer às crianças um ambiente estável, onde possam desenvolver uma voz crítica e condutas responsáveis diante a vida.
Através destas áreas de intervenção, de que modo irá o CACR capacitar os seus jovens utentes para ultrapassarem os obstáculos que se lhes impuseram, e contribuir para a sua reinserção familiar, comunitária e educativa? A educação é mais que um direito humano básico reconhecido por um conjunto de instrumentos jurídicos nacionais e internacionais. Ela é essencial para o empowerment, comunicação e capacitação dos jovens refugiados e torna-se essencial para restaurar a sua auto-estima. Nesse sentido, o CACR terá uma equipa multidisciplinar dedicada e empenhada em melhorar as condições de vida destes jovens, assegurando que eles possam crescer em segurança e felizes. Mas acima de tudo, este centro proporcionará um local seguro para estas crianças, num ambiente muito próximo da estrutura familiar, longe das sistemáticas violações dos Direitos Humanos a que estiveram sujeitos nos seus países de origem. Qual foi o contributo dado pela Swatch para a requalificação e obras do edifício cedido pela Câmara para a instalação da “Casa do Mundo”? Que outros apoios presta esta empresa ao projecto?
Contámos com o contributo da Câmara Municipal de Lisboa, que cedeu o terreno e o edifício e doou uma quantia de 125 mil Euros, e com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que contribuiu também com 125 mil Euros. A Swatch promoveu, financiou com os seus parceiros e geriu, em conjunto com o CPR, o dia-a-dia da obra, até ao seu lançamento, realizado esta semana, no dia 15 de Maio. Que tipo de envolvimento tiveram os demais parceiros do projecto? De que importância se reveste o apadrinhamento desta iniciativa por Maria Cavaco Silva, que inaugurou o novo espaço no Parque da Bela Vista? No âmbito do esforço de cooperação portuguesa com o sistema de protecção internacional de pessoas refugiadas, que destaque vêm merecendo o apoio aos grupos mais vulneráveis, como é o caso das crianças “desacompanhadas” ou “separadas”? Como define o ACNUR esta categoria especial de refugiados e qual é o limite de tempo de estadia e o percurso previsto para cada criança acolhida temporariamente no CACR? Existe, igualmente, a definição de “crianças separadas”: são crianças que se separaram dos pais, ou de quem cuida delas habitualmente, mas não necessariamente de outros familiares, diz a Convenção sobre os Direitos das Crianças. Estas crianças separadas enfrentam riscos similares aos das crianças não acompanhadas e as suas necessidades da protecção exigem, igualmente, uma atenção de prioridade. As crianças não acompanhadas e separadas têm direito à protecção internacional e são vários os instrumentos internacionais e regionais que garantem esta protecção (Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção de Genebra de 1951, a Convenção dos Direitos das Crianças, entre outros). Após a chegada ao território nacional e após a apresentação de um pedido de asilo, no caso das crianças requerentes de asilo, elas serão encaminhadas para o CACR, onde permanecerão até se considerar que estão reunidas as condições para uma vida autónoma. Cada caso será analisado e avaliado pela equipa técnica muito cuidadosamente, ponderando-se cada aspecto do percurso de vida destas crianças no país que as acolheu: Portugal. Quais são os principais países de origem das crianças acolhidas pelo CPR e que idades têm, em média? Quais são as principais causas que motivam a deslocação destes menores: conflitos armados, razões políticas, razões religiosas, catástrofes ambientais, perseguições, pobreza…? São vários os perigos a que as crianças não acompanhadas estão sujeitas: o recrutamento militar, a exploração, o abuso e violência sexuais, o trabalho forçado, a adopção irregular, o tráfico, a discriminação ou a falta do acesso à instrução e a actividades recreativas. Eles são, de facto, os alvos principais da exploração, do abuso e da violência sexuais e estão impedidas de ter acesso à educação, pelo que é urgente assegurar a sua protecção.
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Jornalista