Pioneiro, no sentido em que quantifica as perdas para a economia decorrentes da cultura enraizada de pagar tarde e a más horas, o estudo “Compromisso de pagamento no prazo acordado” estima igualmente os potenciais ganhos caso os prazos fossem cumpridos atempadamente, tal como é recomendado pela troika e por uma nova directiva da Comissão Europeia, que aconselha que os pagamentos a fornecedores não excedam os 60 dias. O VER resume o essencial do estudo POR HELENA OLIVEIRA
O estudo “Compromisso de pagamento no prazo acordado: uma cultura de pagamentos atempados, encomendado pela ACEGE – Associação Cristã de Empresários e Gestores – no âmbito de um dos eixos de actuação do Programa “AconteSer: Liderar com Responsabilidade” foi coordenado por Augusto Mateus e traça a história do impacto dos atrasos nos pagamentos para a economia portuguesa. O estudo enquadra igualmente o estado actual da economia nacional, a questão cultural subjacente a esta temática específica, prevendo ainda uma agenda de mudança, com base em boas práticas de gestão de crédito. O VER resume o essencial do estudo. A cultura que vem do sul O estudo de impacto realizado pela CE para a introdução da directiva estima que, em Portugal, 44% dos pagamentos sejam efectuados com atraso, percentagem que diminui para 40% no que respeita aos pagamentos das Grandes Empresas e que ascende aos 47% para as PME. Relativamente ao conjunto de economias europeias analisadas (Espanha, França, Itália, Alemanha e Bélgica) e comparativamente, Portugal situa-se, em termos de atrasos nos pagamentos, 20 pontos percentuais acima dos seus congéneres europeus, sendo apenas ultrapassado pela Itália. No que respeita ao indicador de contas a receber, os países europeus analisados não registam uma tendência homogénea, sendo que Portugal tem vindo a registar um agravamento contínuo. Ainda relativamente a este item, os países do sul da Europa apresentam comportamentos idênticos, que contrasta com a de melhoria para os países do norte e centro da Europa. Com base nos dados do relatório European Payment Index de 2011, da Intrum Justitia, que procedeu à análise de benchmarking da duração média de pagamento nas diferentes vertentes de negócio – B2C, B2B e Sector Público – Portugal ocupa uma posição intermédia. Ou seja, face aos vizinhos do Sul, Espanha e Itália apresentam resultados piores do que Portugal em todas as vertentes de negócio observadas. Contudo e comparativamente aos países do norte e centro, os valores para Portugal ficam bastante aquém do desejado. A título de exemplo, e juntamente com Itália, em Portugal os montantes com períodos de recebimento acima dos 90 dias representam 32% e 31% do montante total por cobrar, respectivamente, ao passo que na Alemanha, por exemplo, estes não chegam aos 10%. Já no que respeita aos incobráveis e fruto de um crescimento anémico, do aumento de insolvências e da dilatação dos prazos de recebimento, Portugal afasta-se, a passos largos, dos restantes países, destacando-se como “líder dos incobráveis” e com uma tendência de agravamento, bastante acentuada, em 2011. O problema do contágio Assim, é possível evidenciar-se uma lógica de ciclo vicioso, pois as empresas que sofrem de falta de liquidez porque os seus recebimentos não foram efectuados atempadamente, “empurram” também para o futuro os seus pagamentos a fornecedores, o que acaba por contagiar toda a economia. O presente estudo incluiu igualmente um inquérito, a um universo de 153 empresas, para proceder a uma análise do impacto quantitativo decorrente dos atrasos nos pagamentos. Com este inquérito, pretendia-se identificar as implicações financeiras e empresariais dos atrasos nos recebimentos de dívidas de clientes, as razões para os aumentos dos prazos e as estratégias de gestão de tesouraria que mais utilizadas têm sido pelas empresas respondentes. Assim, e no que respeita ao resultado do incumprimento dos prazos acordados com os clientes, 24% das empresas inquiridas apontaram um forte ou muito forte estrangulamento operacional, 34% afiram que o atraso nos pagamentos originam o aumento dos custos financeiros pela necessidade de recorrerem a crédito bancário e a outros instrumentos financeiros e, por último, 29% das empresas respondentes admitem uma forte ou muito forte dificuldade no pagamento aos seus próprios fornecedores. “A “falta de liquidez por deficiência na rentabilidade da empresa” é o aspecto evidenciado por 46% das organizações inquiridas no que respeita às razões para o aumento dos prazos de pagamento a terceiros. Micro e macro consequências Todavia, os atrasos nos recebimentos têm implicações a vários níveis do relacionamento dos agentes económicos: com os seus próprios clientes, com os fornecedores, com a banca e com o Estado. No que respeita aos clientes, os efeitos de políticas agressivas de cobrança podem afectar negativamente a reputação da empresa junto dos fornecedores e também da banca, pela eventualidade de se entrar em cumprimento. Já com o Estado – que continua o mais tardio pagador – pela possibilidade de não se cumprirem as obrigações legais nos prazos estipulados. Mais grave ainda é o risco de a empresa poder ameaçar a sua própria sobrevivência no imediato se, por falta de capacidade financeira, estrangular a sua actividade operacional ou, a prazo, se for incapaz de crescer e se expandir no mercado. A nível macro, os efeitos de atrasos nos recebimentos têm um impacto extremamente negativo ao nível do dinamismo económico, dada a redução de liquidez – resultante da dilatação dos prazos – que afecta sobremaneira a actividade dos agentes económicos envolvidos. Mais ainda e no actual contexto de escassez de crédito bancário e de aumento das taxas de juro, a evolução do investimento apresenta valores negativos, comprometendo o crescimento económico do país, sem esquecer a tão urgente criação de emprego. Uma das dúvidas que se colocam reside na resistência que as empresas mantêm em enveredar pela via do contencioso. Como é devidamente assinalado no estudo, as empresas levam a cabo um conjunto de políticas e medidas proactivas, antes de chegarem a uma situação limite de contencioso entre as partes. O receio de perder o cliente e de a dívida se transformar em incobrável trava a vontade das empresas em resolverem o problema por via judicial. Mais ainda, a cobrança de juros de mora é uma prática pouco utilizada por parte das empresas e até desconhecida para várias delas. E se a morosidade da justiça tem a sua quota-parte de culpa no processo, o temor de fazer perigar as relações comerciais constitui outra das barreiras que impedem as empresas de fazer valer os seus direitos.
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Editora Executiva