O cumprimento dos prazos de pagamento é um dos fatores considerados na avaliação das práticas ESG. Em Portugal, o cumprimento dos prazos de pagamento acordados com os fornecedores tem, pelos piores motivos, uma grande margem para melhorar e deveria estar entre as prioridades das empresas
POR TERESA CARDOSO DE MENEZES
As empresas estão a ser chamadas cada vez mais a mostrar compromissos reais com a sustentabilidade da sua atuação nas áreas do ambiente, social e de governance.
Esta atuação, expressa na avaliação ESG das empresas está a mudar o modo como as empresas são avaliadas – uma avaliação da qual dependem situações que dizem respeito à sua capacidade de crescimento, tais como a reputação, o acesso a parcerias com outras empresas ou a financiamento.
O cumprimento dos prazos de pagamento é um dos fatores considerados na avaliação das práticas ESG. Em Portugal, o cumprimento dos prazos de pagamento acordados com os fornecedores tem, pelos piores motivos, uma grande margem para melhorar e deveria estar entre as prioridades das empresas.
Para empresas com tesourarias que já enfrentam debilidades, um atraso num pagamento pode dar origem a novos atrasos em cascata, num processo de multiplicação que contamina o ambiente de confiança que se pretende para o desenvolvimento dos negócios e o desejado crescimento das empresas.
Em maio deste ano, apenas 18,1% das empresas em Portugal pagavam dentro dos prazos acordados com os fornecedores. Cerca de dois terços registavam atrasos até 30 dias e 5,5% atrasos superiores a 90 dias.
Entre 2020 e o final de 2023, a média de dias de atraso tinha registado alguma melhoria, passando de 27 para 22 dias. No entanto, verificou-se uma ligeira inversão dessa tendência e, neste momento, a média de dias de atraso está nos 23 dias.
No panorama internacional, nos países analisados na última edição do estudo ‘Payment Study’ elaborado com dados de 2023 pela CRIBIS D&B, e no qual a Informa D&B participa com informação das empresas portuguesas, Portugal está entre os países com maior percentagem de empresas incumpridoras.
Desde 2022, o contexto internacional traz-nos motivos de incerteza. A seguir a 2 anos de pandemia que afetaram a operação e a tesouraria de muitas empresas, a subida dos preços da energia e matérias-primas veio ameaçar as suas margens operacionais.
Perante cenários com notícias negativas, a forma mais cómoda de olhar para os atrasos nos pagamentos é considerá-los um efeito de um conjunto de fragilidades de variada dimensão que atingem a vida das empresas. Esta é a forma mais cómoda de olhar para o problema, mas não é a mais responsável.
Em vez de um efeito, seria muito mais eficaz que se olhasse para os atrasos nos pagamentos como uma causa de um outro conjunto de debilidades. Ao criar dificuldades de tesouraria a muitas empresas, sobretudo a muitas empresas de reduzida dimensão, estes atrasos põem em causa a própria sustentabilidade do tecido económico de que fazem parte também as empresas que não cumprem estes prazos. Num tecido económico com cadeias de valor que juntam muitas organizações interdependentes, as dificuldades de um dos elos pode fragilizar toda a cadeia.
É necessário um gesto de vontade por parte das empresas, de preferência com capacidade de servir de exemplo, como está a ser feito pelas empresas que assumem publicamente esta responsabilidade com o Compromisso Pontual. Estão a fazê-lo não por si próprias, mas por todo o tecido empresarial, convictas de que este é um gesto que contribui para a sustentabilidade de muitas outras empresas.
O risco de crédito comercial sempre foi um tema importante na gestão das empresas. Mas a escala que atinge em Portugal é preocupante por se ter tornado numa prática comum à grande maioria das empresas, uma prática que atinge quer a confiança dos gestores, quer as suas tesourarias, empobrecendo o desenvolvimento da atividade económica.
Enquanto esta realidade não evolui no sentido mais saudável, ela tem necessariamente de ser monitorizada. De acordo com o indicador de Risco de Delinquency da Informa D&B, quase 9% de todas as empresas têm uma significativa probabilidade de incorrer em atrasos nos pagamentos superiores a 90 dias durante os próximos 12 meses, na sua maioria empresas de reduzida dimensão e que, no seu conjunto, representam metade do valor total por pagar a fornecedores. A deteção precoce dessas vulnerabilidades nos pagamentos deverá ser avaliada, de modo que a existência de crédito comercial não represente um risco significativo para os credores.
Teresa Cardoso de Menezes
Diretora geral da Informa D&B