Todos sabemos que o início do ano é amplamente documentado como uma altura em que milhões de pessoas se empenham com um vigor atípico para atingir os seus objectivos, tais como perder peso, comer de forma mais saudável, deixar de fumar, aprender algo de novo ou poupar mais dinheiro, entre outros exemplos. Mas desde quando é assim? E o que obsta a que as taxas de sucesso no cumprimento destas resoluções sejam elevadas? É possível fazer algo para que a força de vontade não esmoreça? Tentámos responder a estas questões neste artigo que dá também início ao novo ano
POR HELENA OLIVEIRA
Reza a história que os antigos babilónios foram o primeiro povo a tomar resoluções de Ano Novo, há cerca de 4.000 anos, tendo sido também os primeiros a realizar celebrações registadas em honra do novo ano – embora para eles o ano não começasse em Janeiro, mas em meados de Março, quando as colheitas eram plantadas. Também faziam promessas aos deuses no sentido de pagar as suas dívidas e devolver os objectos que lhes tinham sido emprestados. Se os babilónios cumprissem a sua palavra, os seus deuses (pagãos) conceder-lhes-iam favores para o ano seguinte. Caso contrário, cairiam em desgraça. Estas promessas podem ser consideradas como precursoras das nossas resoluções de Ano Novo.
Uma prática semelhante ocorreu na Roma antiga, depois de o imperador Júlio César, considerado um reformista, ter mexido no calendário e estabelecido o dia 1 de Janeiro como o início do novo ano, por volta de 46 a.C. Pedido emprestado o nome a Jano, o deus de duas faces, Janeiro tinha um significado especial para os romanos. Acreditando que Jano olhava simbolicamente para trás, para o ano anterior, e para o futuro, os romanos ofereciam sacrifícios à divindade e faziam promessas de boa conduta para o ano seguinte.
Por seu turno, para os primeiros cristãos, o primeiro dia do novo ano tornou-se a ocasião tradicional para reflectir sobre os erros cometidos no passado e tomar a decisão de fazer e ser melhor no futuro.
A verdade é que a noção de que os novos começos são possíveis e oferecem aos indivíduos uma oportunidade de se aperfeiçoarem há muito que é apoiada pela nossa cultura. Por exemplo, os cristãos podem “nascer de novo”, com as confissões e penitências católicas a proporcionam aos pecadores um novo começo; muitos grupos religiosos praticam rituais de purificação ou abluções (por exemplo, budistas, cristãos, muçulmanos e judeus); e a fénix metafórica que renasce das cinzas é um símbolo omnipresente de renascimento. Tal sugere uma crença amplamente partilhada de que temos oportunidades ao longo da nossa vida para começar de novo, com o “efeito de Ano Novo”, o qual demarca a passagem do tempo e cria numerosas oportunidades de “recomeço”, as quais estão associadas a aumentos subsequentes no comportamento aspiracional.
A ciência comportamental atesta igualmente o poder do “efeito de recomeço”, sugerindo que o ano novo pode ser um bom momento para fazer resoluções e mudanças, na medida em que pode funcionar como um marco temporal que confere às pessoas um compromisso renovado com os seus objectivos. Estes marcos temporais permitem que as pessoas dividam a sua percepção do tempo em “antes” e “depois”, e que considerem os fracassos anteriores como responsabilidade de um “eu” passado, acreditando, por outro lado, que um novo “eu” surgirá.
Que resoluções e quanto tempo duram em média?
Para 2024, uma pesquisa da Forbes Health / OnePoll que inquiriu 1.000 adultos americanos e foi realizada em Outubro de 2023, concluiu que quase 48% dos entrevistados observaram que melhorar a forma física era sua principal prioridade, contra apenas 36% dos que elegeram a saúde mental como o seu principal objectivo. Os resultados mostram assim que existiu uma mudança de foco em relação às resoluções de Ano Novo para 2023. No ano transacto, 45% dos inquiridos referiram a melhoria da saúde mental como a sua principal prioridade, tendo apenas 39% referido a melhoria da condição física como o seu objectivo número um.
Ainda assim, a saúde mental continua a ser a principal preocupação de muitos inquiridos, e as melhorias, tanto na mente como no corpo, estão intimamente ligadas. Na sondagem deste ano, quando se perguntou aos inquiridos o que era mais importante para 2024, se a saúde mental ou a física, 55% afirmaram que estes dois objectivos eram igualmente importantes.
Outras resoluções populares de Ano Novo para 2024 manifestadas neste mesmo inquérito incluem melhorar as finanças (38,2%), perder peso (33,8%) e melhorar os hábitos alimentares (31,6%). Entretanto e ao contrário do que era habitual, menos pessoas estão a concentrar-se em objectivos como aprender uma nova competência (8,8%), dedicar mais tempo a passatempos (7,1%) e viajar mais (5,9%).
No que respeita à intenção de manter as resoluções de Ano Novo e ainda segundo a pesquisa da Forbes Health, pouco menos de um em cada 10 respondentes (8%) afirma que as suas resoluções duraram um mês, 21,9% referem dois meses, 22,2% três meses e 13,1% afirmam que as suas resoluções duraram quatro meses.
Esta incapacidade de nos mantermos fiéis ao que prometemos mudar em nós mesmos tem sido terreno fértil para muitos investigadores que analisam este fenómeno e as taxas de sucesso deste tipo de resoluções. E, nas primeiras semanas, tudo parece correr bem. Todavia, e em particular ao fim de um mês, Fevereiro apresenta-se como a altura em que já deixámos resvalar todos os nossos desejos de mudança e a maior parte das pessoas volta à casa da partida, sem resultados visíveis. De acordo com o estudo U.S. News & World Report, 80% das resoluções de ano novo falham em Fevereiro e de acordo com um outro, mais antigo, feito por Richard Wiseman, professor de psicologia da Universidade de Bristol e que envolveu três mil pessoas, 88% daqueles que estabeleceram objectivos de mudança nesta altura do ano falharam, apesar de 52% dos mesmos participantes terem-se manifestado muito confiantes do seu sucesso na altura em que o fizeram. Por seu turno, uma pesquisa efectuada pela Universidade de Scranton sugere também que apenas 8% das pessoas consegue atingir as suas resoluções de ano novo, o que significa que 92% fracassam nos seus intentos.
É mais fácil estabelecer novos objectivos ou quebrar maus hábitos?
Num artigo publicado pelo The Guardian e que sugere que o melhor é não se fazer qualquer tipo de resolução, é abordada igualmente a ideia de as pessoas acreditarem que se “transformam” simplesmente por decidirem com firmeza fazê-lo. Ou seja, aqui está o “velho e familiar Eu”, com todas as imperfeições e problemas, a acreditar que está na altura de surgir um outro e novo “substituto”. Como refere o artigo, e para os que levam o “New Year, New Me” a sério, “a pessoa que supervisiona esta transformação – a pessoa que nomeia os novos hábitos, que compra os livros de auto-ajuda, que cria os gráficos de progresso diários para colar no frigorífico – é, obviamente, o Velho Eu. O que significa que as mudanças específicas que selecciona, e a forma como as faz, terão invariavelmente as marcas do seu criador”. Assim e desta forma, as perspectivas não parecem ser de todo animadoras. Dadas as elevadas taxas de insucesso, muitos investigadores sugerem que o ponto de partida é o reconhecimento de que as pequenas mudanças de hábitos e os objectivos modestos são frequentemente mais transformadores do que aqueles que se apresentam como grandiosos.
Por outro lado, e no que respeita à ciência comportamental, os seus especialistas concordam igualmente que a chave para uma resolução de Ano Novo bem-sucedida deve centrar-se no estabelecimento de novos objectivos em vez de se insistir na quebra de maus hábitos. Um estudo de 2020, publicado na revista PLoS One, concluiu que 55% dos participantes consideravam-se bem-sucedidos na manutenção das suas resoluções de Ano Novo do ano anterior. No entanto, os participantes com objectivos orientados para a abordagem acima referida (fazer algo novo) foram significativamente mais bem-sucedidos do que os que optaram por objectivos orientados para deixar de fazer algo, com uma taxa de sucesso de 58,9% contra 47,1%. Isto indica que aqueles que assumem novos desafios têm mais probabilidades de sucesso do que aqueles que tentam eliminar algo que consideram nefasto nas suas vidas.
Isto não significa que os participantes que estabeleceram objectivos como deixar de fumar ou perder peso não tiveram êxito, mas sim que a probabilidade de as pessoas serem bem-sucedidas nas suas resoluções foi maior quando o objectivo foi enquadrado numa forma orientada para fazer algo de novo.
Por outro lado e como o VER já escreveu anteriormente, “existe uma enorme diferença entre desejar a mudança e desejar-se mudar. Mesmo quando as pessoas professam um desejo claro para mudarem, o que tal significa geralmente é que estão interessadas na mudança como um resultado em vez de a encararem como um processo”, afirma o professor de psicologia nos negócios Tomas Chamorro-Premuzic.
Ou seja, os verdadeiros sacrifícios entram muito levemente na equação e uma das primeiras lições a retirar é a de que para atingir um determinado resultado, há que trabalhar a mudança como um processo. Um outro facto a ter em conta é a explosão de motivação que todos parecemos ter no início do ano, misturada com a impaciência de atingirmos um determinado grande objectivo o mais rapidamente possível. O problema é que com grandes objectivos o progresso é geralmente muito lento, o que também serve para a desmotivação que se segue em pouco tempo. Assim, em vez de se estabelecer uma grande mudança, é mais proveitoso estabelecer pequenos passos ou “dividi-la” em objectivos mais reduzidos.
O que pode ajudar
Apesar de as estatísticas e os exemplos que conhecemos pessoalmente não serem muito animadores, existem variadíssimas sugestões que supostamente ajudam a mantermo-nos fiéis aos objectivos que escolhemos para o novo ano. Partilhamos algumas delas:
Os objectivos devem começar num momento de mudança ou de necessidade de mudança
- Ou seja, muitas resoluções são estabelecidas porque é tradição, mas não têm de necessariamente ter início no começo de cada ano. Quanto aos objectivos, lembre-se que estes são a sua visão do que gostaria que fosse o futuro. Se está a definir uma resolução por uma questão de tradição, a sua motivação será menor do que a de um objectivo definido por uma necessidade. Evite igualmente estabelecer vários objectivos, concentrando-se ao invés em um ou dois deles. Isto permite-lhe atingir objectivos específicos em vez de se sentir um fracasso por não ter atingido nenhum deles.
Planear e antecipar obstáculos
- É melhor planear o seu objectivo. Pense na forma como pretende cumprir a sua resolução e no tempo que pode demorar a atingi-la. Por exemplo, se a sua resolução for deixar de fumar, pesquise o tempo que uma pessoa leva, em média, a abandonar o hábito e os possíveis contratempos que pode esperar. Não se esqueça igualmente de que por mais pequeno ou simples que seja o objectivo, existe sempre a possibilidade de emergir um obstáculo. Para manter o optimismo, identifique antecipadamente as dificuldades que poderão surgir e crie planos para as evitar. Isto reduzirá a possibilidade de retrocessos ou fracassos.
Defina objectivos desafiantes, mensuráveis e mais pequenos
- Em primeiro lugar evite criar expectativas demasiado elevadas em relação a si próprio. Comece aos poucos. Se deseja perder peso, escolha um objectivo de perda de peso pequeno mas realista. Talvez sejam cinco quilos em dois meses. Quando atingir esse objectivo, pode pensar em perder mais cinco. Definir pequenos objectivos pode ajudá-lo a obter grandes resultados. Por outro lado, os dados mostram que, se definir objectivos mensuráveis, ficará mais motivado para os alcançar. Os objectivos que são passíveis de ser medidos não só mostrarão os seus progressos, como também o inspirarão quando vir os resultados, dando-lhe ao mesmo tempo a oportunidade de celebrar pequenas vitórias quando atingir um marco. A celebração de um objectivo ajudá-lo-á a continuar a persegui-lo.
Identificar “parceiros de apoio”
- São vários os estudos que demonstram que as pessoas que não só escrevem os seus objectivos, como também estabelecem uma forma de prestar contas pelos mesmos, têm duas vezes mais probabilidades de os atingir. Apoie-se nas pessoas – quer seja um amigo para manter a sua resolução de exercício no caminho certo, ou um cônjuge para o ajudar com hábitos alimentares mais saudáveis. A verdade é que funcionamos melhor com a comunidade à nossa volta, motivando-nos e recordando-nos porque é que escolhemos essa resolução de Ano Novo em primeiro lugar.
Bom ano. E… boa sorte.
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Editora Executiva