Embora não seja uma estratégia adoptada ainda por muitas empresas, a recolha e análise de dados é uma ferramenta bastante útil para o processo de tomada de decisões. Porém, se muitos são os gestores que assumem ter acesso a informação fidedigna, poucos são ainda aqueles que revelam dispor da “informação certa”. E se implementar uma cultura de dados pode ser uma tarefa ainda dispensável para muitos, a verdade é que é crescente a percentagem de executivos que a consideram uma ferramenta útil para traçar o caminho das suas organizações. Quem o diz é o MIT em parceria com a SAS, no estudo “Data, Analytics, & AI: How Trust Delivers Value”
POR MÁRIA POMBO

São necessários mais dados de apoio à gestão e à tomada de decisões, a privacidade de dados é reconhecida como uma oportunidade e como uma necessidade, e uma “cultura analítica” contribui para a inovação, permitindo que as empresas procurem melhores formas de satisfazer as necessidades dos seus clientes.

Estas são as principais conclusões do estudo “Data, Analytics, & AI: How Trust Delivers Value”, apresentado recentemente pelo MIT em parceria com a SAS, a gigante pioneira em Business Intelligence e que acredita que a informação é uma poderosa ferramenta para qualquer empresa que pretenda alcançar e manter o sucesso. O estudo foi realizado em Maio de 2018 e contou com a participação de cerca de 2400 gestores e líderes empresariais, de todas as regiões do planeta.

A confiança nos dados é um tema controverso, tendo em conta que, embora os especialistas nesta matéria afirmem que a mesma é fundamental, são ainda poucos os que a consideram relevante nos departamentos de gestão. Isto porque, ao passo que a maioria dos gestores afirma que tem mais acesso a dados, apenas uma pequena minoria revela ter acesso à informação “certa” para tomar decisões. Neste sentido, apenas 15% dos respondentes afirmam que recorrem à análise de dados para tomarem decisões, sendo que menos de 10% trabalham com informação automática e apenas 7% recorrem a sistemas de inteligência artificial na tomada de decisões. A larga maioria (76%) revela que tem acesso a “informação útil”, mas apenas 43% assumem que dispõem de “informação certa” para tomarem decisões informadas, sendo esta uma tendência que praticamente não se alterou desde 2017.

Estas conclusões vão ao encontro da ideia de que mais pessoas e empresas utilizam a informação disponível, mas que poucos são ainda aqueles que confiam nela e que a consideram uma ferramenta necessária para traçar o percurso das organizações. Ou seja, verifica-se que existe um gap de confiança na informação disponível, já que apenas uma pequena percentagem de respondentes afirma que confia genuinamente nos dados a que tem acesso.

Muitos gestores confiam “com ressalvas” na recolha e análise de dados

Para muitos inquiridos a informação é “muitas vezes” fidedigna (47%), actual (44%) ou relevante (43%), mas são poucos aqueles que a consideram “completa” (28%).

Uma outra conclusão interessante diz respeito ao facto de que muitos inquiridos “confiam” nos dados gerados internamente (63%) ou por peritos nesta área (55%), mas que existe uma “confiança com ressalvas” nos dados apresentados por empresas concorrentes (67%), nos dados apresentados por fabricantes (64%) e naqueles que estão publicamente disponíveis (66%). Por seu turno, a informação gerada internamente e disponibilizada pelos clientes é aquela que é verificada com mais frequência, o que permite concluir que é a que tem mais relevância para os gestores que participaram na análise.

Adicionalmente, verifica-se que, comparando com o que acontecia há um ano, as empresas aumentaram ligeiramente (40%) o investimento disponível para recolha e análise de dados, sendo que apenas 15% aumentaram significativamente o montante destinado a este fim, 38% não fizeram quaisquer alterações, 5% diminuíram ligeiramente e 2% fizeram cortes significativos nesta mesma actividade.

Por outro lado e como sabemos, a desconfiança dos consumidores face ao tratamento dos seus dados tem vindo a crescer, obrigando os gestores a tomarem medidas que estimulem a confiança dos clientes. Neste sentido, verifica-se que a maioria (63%) dos inquiridos já implementou ou está a implementar planos para lidar com situações de violação de dados, garantindo aos clientes a confidencialidade de toda a informação que disponibilizam. Complementarmente, a maioria (54%) também está empenhada em implementar estratégias e mecanismos de combate aos ciberataques.

Porém, se muitos já estão a aumentar a segurança e a implementar medidas que evitem o roubo ou a violação de dados dos consumidores, a verdade é que apenas 41% assumem manter os seus clientes informados acerca do modo como utilizam e partilham a informação que estes disponibilizam.

Mas então como é que as empresas podem criar uma cultura de confiança junto dos seus clientes?

De acordo com o documento, as organizações que mais recolhem e apresentam os dados (tanto dos consumidores como dos colaboradores) são aquelas que apresentam níveis mais elevados de confiança e as que mais utilizam esta informação para tomarem decisões, considerando-a útil e fidedigna.

Neste sentido, o estudo apresenta dois factores (ou estratégias) que podem melhorar o clima de confiança nos dados. O primeiro diz respeito à existência de uma pessoa para liderar a recolha e análise de dados, e que pode ocupar a função de Chief Analytics Officer (CAO) ou de Chief Data Officer (CDA). De acordo com a análise, 33% daqueles que revelam que, na sua empresa, existe alguém a desempenhar este cargo têm uma maior tendência para assumir que existe sempre ou quase sempre informação útil e necessária para a tomada de decisão.

O segundo factor relevante está relacionado com o facto de os líderes empresariais defenderem a importância da análise de dados, correndo, no entanto, o risco de utilizar informação já existente para tomarem decisões ao invés de optarem ela recolha e consequente tratamento de dados mais “frescos”. De acordo com o estudo, 40% dos inquiridos compreendem a informação apresentada e utilizam-na frequentemente como apoio para decidir o rumo das empresas, mas apenas 36% a incorporam mesmo no processo de tomada de decisões, sendo que apenas 11% dos inquiridos consideram que o investimento feito em ferramentas de dados é “sempre” considerado como uma prioridade.


Informação significa inovação, eficiência e acção

Melhorar as competências analíticas dos colaboradores, encorajando-os a utilizar a informação disponível para serem melhores profissionais, é um desafio que muitos respondentes consideram útil. Aceitá-lo e implementá-lo nas empresas significa estimular a existência de uma cultura empresarial que permite que os trabalhadores tenham a liberdade de inovar, questionando constantemente de que modo podem ser melhores e mais eficientes. Analisar, por exemplo, quais foram os produtos que cada colaborador mais vendeu, em que alturas do mês isso aconteceu e que tipo de abordagem fez junto dos clientes é uma forma de compreender de que modo se pode inovar e melhorar, abandonando estratégias que não resultaram e adoptando medidas que ajudem a aumentar o número de vendas, por exemplo.

Porém, se é verdade que, para muitos participantes nesta análise, existe uma grande margem para que as empresas possam utilizar os dados para melhorar as competências dos colaboradores – sendo que a maioria das empresas já tem (ou irá ter no futuro) planos de implementação de uma cultura de análise de informação junto dos trabalhadores –, o estudo conclui igualmente que para cerca de 30% dos inquiridos, esta ainda é uma estratégia pouco relevante e fora dos planos para um futuro próximo. Importa sublinhar também que introduzir nas empresas uma cultura de análise de dados, fazendo com que esta passe a fazer parte do dia-a-dia de todos os colaboradores não é uma tarefa fácil, já que requer uma mudança substancial e uma adopção de estratégias e medidas que antes não existiam.

De acordo com o documento, “promover uma cultura de inovação exige não só ser ouvido como ouvir”, sendo certo que “muito do trabalho da ciência dos dados é sobre cultura e gestão da mudança, ajudando os colaboradores a compreenderem o valor da informação e o modo como esta pode conduzir a novas formas de pensar”. Ou seja, por muito que a análise de dados seja útil e que mais gestores a queiram introduzir nas suas empresas, o processo deve ser estudado e comunicado, e os colaboradores devem ter tempo e ferramentas que lhes permitam compreender a importância dos dados e o modo como estes podem facilitar muitas tomadas de decisão, desde as mais difíceis às mais simples.

Para demonstrar a importância da educação e da formação nesta temática, os autores do documento entrevistaram um grupo de trabalhadores que participaram no curso “Data SF’s Data Academy Assessment”, nos Estados Unidos, com 80% dos empregados a afirmar que as suas competências “melhoraram” ou “melhoraram significativamente” após o curso.

Complementarmente, e quando questionados acerca das vezes que utilizam as informações ou competências adquiridas no curso, 18% assumiram utilizar diariamente, 28% revelaram utilizar semanalmente e 23% afirmaram que recorrem mensalmente aos conhecimentos adquiridos, sendo que 22% raramente recorrem ao que aprenderam e 9% nunca dão uso à nova informação de que dispõem.

Embora não seja uma estratégia adoptada ainda por muitas empresas, este estudo revela que a recolha e análise de dados – tanto de consumidores, como de colaboradores e fornecedores – é uma ferramenta bastante útil para o processo de tomada de decisões. Para que a mesma faça cada vez mais parte da cultura das organizações, os autores do documento sugerem que seja criado o cargo de Chief Analytic Officer, o qual será responsável por toda a informação gerada na empresa e que permitirá, por um lado, que os dados não se dispersem pelos diversos departamentos da organização e, por outro, que a confidencialidade seja assegurada.

As medidas inerentes ao Regulamento Geral sobre a Protecção de Dados (RGPD)recentemente introduzidas permitem que os consumidores tenham um maior controlo relativamente aos dados que disponibilizam, mas também continua a ser verdade que são  muitas as organizações que continuam a não tratar as suas informações pessoais com a confidencialidade que deveriam, o que implica que as organizações tenham de fazer um esforço redobrado para garantir a protecção de dados de todos os clientes e evitar ciberataques.

Para os autores do documento não existem dúvidas: “a comunicação e a colaboração entre os especialistas em análise de dados e os líderes empresariais originam uma maior compreensão e benefícios mensuráveis”, estando certos de que “a confiança cria valor”.

Jornalista