São conhecidos os principais problemas das PME: a descapitalização, a sobrecarga administrativa e fiscal, a dificuldade de acesso ao crédito, a enormidade dos “spreads” e, sobretudo, a rigidez laboral, com as consequências que todos conhecemos para o contexto económico e social. Justifica-se, por conseguinte, a pergunta: Resolver esses problemas é a primeira e principal obrigação de um empresário? Sem dúvida alguma! Numa conferência promovida recentemente pela Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada – CCIPD (Associação Empresarial das Ilhas de S. Miguel e Santa Maria), o vice-presidente da ACEGE, em representação da Associação Cristã de Empresários e Gestores, discursou sobre “As empresas e a sua responsabilidade no Desenvolvimento Socioeconómico”, um tema “que qualquer das duas crises que atravessamos colocou na ordem do dia das preocupações de empresários, gestores e, de uma forma geral, de todos os agentes económicos”, constata. Na sua opinião, “a grande, a enorme maioria dos empresários, nomeadamente os que a ACEGE representa, e certamente os que aqui estão presentes, são líderes responsáveis, pragmáticos, comprometidos com as tarefas de crescimento e de criação de valor nas suas empresas. Estes empresários “gerem num mundo real que não controlam, determinado por uma economia de mercado agitada pela ventania de uma globalização que, não tenhamos dúvidas, veio para ficar. Por conseguinte, são homens que lutam por ideais, mas que não se podem dar ao luxo de ser idealistas”, conclui. Defendendo que os empresários acreditam hoje, na sua maioria, que “acima de tudo, as empresas são pessoas” e que “em última análise, os negócios dizem sempre respeito a pessoas”, Nuno Fernandes Thomaz elogia os gestores que “assumem que a actividade económica, entendida como o conjunto de acções necessárias a satisfazer as necessidades humanas utilizando os recursos limitados de que dispõem, é uma actividade desenvolvida por homens que põem os seus talentos ao serviço dos outros homens”. O conceito “pode parecer mera teoria, mas não é”. Senão vejamos: Sem as PME, quem criaria riqueza em Portugal? Falando agora das empresas, o que seria deste nosso país e dos portugueses sem as empresas, sobretudo sem as médias, pequenas e micro empresas? Quem criaria riqueza? Quem criaria emprego? As PME constituem cerca de 90% do tecido produtivo nacional, mantêm mais de 75% do emprego activo, representam a maior quota agregada de exportação, e contribuem decisivamente para a coesão social dada a sua disseminação por todo o país. São essas mesmas empresas que, sobretudo em tempo de crise, são tão injustamente atacadas pelos mais variados lados. Pelo lado da administração pública (central, regional ou local), que as sobrecarrega de inexplicáveis exigências informativas e estatísticas – quase as mesmas que impõe às grandes empresas. Pelo lado da administração fiscal, que as asfixia com impostos e, quase pior que a carga fiscal, com a obrigação de decifrar leis que estão sempre a mudar, cada vez mais prolixas e mal redigidas, ou de preencher formulários kafkianos concebidos por quem não faz a mínima ideia do que é gerir uma empresa e que, até para pagar, têm de aguardar a vez de senha na mão em filas de repartições mal-humoradas. Mas não é por ser menos justa a imagem dos empresários e menos amigável o ambiente que enquadra as empresas (e a CCIPD, com a sua longevidade, sabe disso como ninguém), que empresários e empresas deixam de ter profundas responsabilidades num são desenvolvimento socioeconómico. Eis aqui o plano de princípios da Responsabilidade Empresarial: Dois elementos caracterizam a empresa social e economicamente responsável: No plano social: No plano económico: E no plano do ambiente: O segundo elemento que caracteriza a empresa socialmente responsável, a relação de verdade e transparência na gestão, não pode esquecer nenhum dos “stakeholders”: Em crise, onde acaba a responsabilidade e começa a sobrevivência?
Por outras palavras, será a responsabilidade social uma coisa muito meritória, mas um artigo de luxo para usar apenas em tempo de euforia económica, e nunca quando o problema das empresas é, como agora acontece, de pura sobrevivência? Distinguindo a problemática das grandes empresas das que não têm tal dimensão, vou ocupar-me das PME, pois as grandes, para além de beneficiarem de muito tempo de antena e de possuírem gordura financeira que lhes garante maior resistência, têm sempre quem as defenda. São conhecidos os principais problemas das PME: a descapitalização, a sobrecarga administrativa e fiscal, a dificuldade de acesso ao crédito (que só vai piorar), a enormidade dos “spreads” (quando os há) e, sobretudo, a rigidez laboral, com as consequências que todos conhecemos para o contexto económico e social. Justifica-se, por conseguinte, a pergunta: resolver esses problemas é ou não a primeira e principal obrigação de um empresário? Sem dúvida alguma!! e o cumprimento dessa obrigação representa, já por si, um forte sentido de responsabilidade socioeconómica. E podem os empresários ou as empresas que lideram ambicionar resolver só por si os problemas da nossa sociedade e da nossa economia? Certamente que não, mas temos capacidade para atenuar alguns desses problemas e para, assim, diminuir o sofrimento social existente na comunidade. Existem dois problemas muito concretos que constrangem a actividade das PME’s, em relação aos quais a responsabilidade social e económica das empresas se põe de modo particularmente delicado e difícil, mas onde esse sentido de responsabilidade tem todas as condições para impedir o agravamento dos problemas. Refiro-me, em primeiro lugar, à situação dramática em que vive hoje em dia uma parte substancial da sociedade portuguesa. Sem receio de errar, nenhum de nós fica indiferente ao dramático problema da pobreza que grassa no nosso país, à exclusão social e, enquanto empresários, de modo ainda mais sensível, à chaga do desemprego. Mas a conjugação da rigidez da lei laboral com a situação actual de crise dos mercados não nos dá condições para, de modo paternalista, garantir emprego a todos, por mais que isto nos torne impopulares. Argumentam alguns que essa rigidez é facilmente contornada pela precariedade existente no emprego, mas esta, bem pelo contrário, é consequência da falta de flexibilidade dos regimes contratuais, para já não falar da precariedade dos próprios mercados. Razão que leva a que os efeitos da rigidez laboral sobre o funcionamento da economia e, consequentemente, sobre o desenvolvimento socioeconómico, se meçam pela dificuldade de ajustamento das empresas às variações das conjunturas, quer no aumento quer na redução de trabalhadores. Só as empresas ricas têm possibilidade de fazer esse ajustamento, negociando rescisões. Essa situação conduz ao facto de, quando entre nós ocorrem crises, ao contrário do que acontece noutros países, as empresas em vez de se ajustarem, simplesmente fecham. Decisões como o despedimento, o “lay-off” ou qualquer outra forma de dispensa de pessoal trabalhador são decisões extremamente difíceis, e aquilo a que a responsabilidade social nos obriga é a tomar essas decisões em consciência – consciência de que, inclusivamente, e em momentos de recessão económica, a sobrevivência de uma empresa pode justificar o sacrifício de alguns para benefício de todos os outros. Empregabilidade e empreendedorismo Na ACEGE percorremos um caminho singular, que também não vai resolver os problemas da sociedade portuguesa mas que, acreditamos, terá um efeito muito positivo de contágio: o Fundo Bem Comum. O segundo problema a que me refiro decorre da tradicional cultura “entreguista”, de que é ao Estado que compete fazer tudo ou quase tudo, de que o Estado é o culpado de tudo o que está mal, de que o Estado é que tem de pagar os prejuízos – esquecendo-nos nós, com frequência, que quando o Estado paga o que quer que seja, somos nós que pagamos… Neste ponto sobressai a importância para o desenvolvimento socioeconómico do princípio da subsidariedade e do dever de participação. Nenhum de nós, empresários e gestores, deve recusar-se a participar nas tarefas do crescimento económico e do desenvolvimento social para as quais possamos contribuir dentro do maior ou menor universo da nossa vida empresarial. Sei que dizer isto nesta casa é, sem dúvida, chover no molhado, mas falo para fora, para um país onde há mais associações empresariais do que empresas com mais de 350 trabalhadores. São inúmeras as modalidades de participação. Chamaria a atenção para a relevância e utilidade das campanhas de boas práticas, em domínios cuja práticas tradicionais repercutem muito negativamente sobre a economia em geral e sobre as empresas em particular. É o caso, por exemplo, dos atrasos nos pagamentos: Portugal é o quarto país com prazos médios de pagamento mais longos (92 dias contra 57 na média europeia), sendo a administração pública (central, regional e autárquica) a que continua a ter na Europa a 27 os prazos médios mais longos de pagamento (129 dias contra uma média europeia de 67 dias). Escusado será referir as consequências gravíssimas, em muitos casos irrecuperáveis, que esta má prática causa às empresas, em termos de estrangulamento de tesourarias já de si muito apertadas. Foi com esse sentido que a ACEGE lançou há um ano e meio, com sucesso, uma Campanha de Pagamentos Pontuais, onde quase uma centena de empresas se comprometeu a honrar, e se possível melhorar, os prazos de pagamento acordados com os seus fornecedores. E o que a ACEGE fez, aliás com o apoio integral da CIP, pode e deve ser alargado a todos os sectores económicos através das associações empresariais. Com um duplo objectivo: por um lado tornar difícil que haja quem, podendo pagar pontualmente, se aproveite da crise para não o fazer; por outro lado, lembrar numa voz única ao Estado que seja tão rigoroso a pagar o que deve aos seus fornecedores como é rigoroso a cobrar os impostos aos contribuintes. A terminar, lembro que nunca foi fácil a vida das empresas em Portugal, e mais difícil fica quando a economia é varrida por um temporal como aquele que atravessamos. Fácil é não encarar os problemas, é fugir às responsabilidades, é deitar as culpas para cima do Estado, é exigir da economia mais do que ela pode dar. Helmut Khol disse um dia que “um país desenvolvido não é um parque de recreio onde os reformados são cada vez mais novos, os estudantes cada vez mais velhos, as férias cada vez mais longas e o horário de trabalho cada vez mais curto”. E é nesta linha de exigência, sem contemporização com o facilitismo nem contemplações com o nacional porreirismo, que deve ser compreendida e exercida a responsabilidade das empresas no desenvolvimento socioeconómico. Com crise ou sem ela… |
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Valores, Ética e Responsabilidade