A nossa sociedade reverencia aqueles que se superam, os “self-made”, aqueles que sozinhos constroem, reconstroem, erguem. Assim e para quem está no polo oposto, pedir ajuda torna-se um sinal de debilidade que muitos não querem revelar. Desta forma, temos os que são, de forma evidente, descartados pela sociedade e aqueles que se “auto-descartam” sofrendo em silêncio. Uma das virtudes do programa SEMÁFORO é permitir, de forma discreta, identificar necessidades “ocultas” presentes no interior das nossas organizações
POR CARLOS JOÃO DIOGO

A primeira vez que tive contacto com o programa SEMÁFORO, a ser dinamizado pela ACEGE, pareceu-me de imediato um contributo extremamente relevante para as organizações e, no meu papel de gestor, logo percebi que me poderia ajudar muito. O que aqui partilho é parte da reflexão que fiz ao contactar com este programa e que despertou a minha vontade de participar.

Uma das (muitas) dificuldades que encontramos no trabalho social é a identificação das situações de pobreza não evidente. São visíveis, ao percorrer as nossas ruas, muitas situações que “gritam” as necessidades: de alimentos, de habitação, de cuidados de saúde (física e mental), de integração na sociedade e tantas outras. Mas isso está diante dos nossos olhos. Na verdade, um dos grandes desafios que enfrentamos é identificar e ajudar aqueles que precisam e que não têm “aspecto” de necessitados.

O trabalho social usa muitas estratégias para fazer esta identificação, mas as dificuldades encontradas são também variadas. A pressão social para manter a aparência, apesar das dificuldades, não é a menor delas. Pedir ajuda é sinal de fraqueza, de imaturidade, de incapacidade de resolver os próprios problemas. A nossa sociedade reverencia aqueles que se superam, os “self-made”, aqueles que sozinhos constroem, reconstroem, erguem.

A facilidade com que endeusamos este tipo de indivíduos tem o efeito de, pelas razões simétricas, rejeitarmos ou – usando as palavras do Papa Francisco – descartarmos quem está no polo oposto. Pedir ajuda torna-se assim um sinal de debilidade que muitos não querem revelar. Assim, temos as pessoas que são evidentemente descartadas pela sociedade de que todos fazemos parte; e temos as pessoas que se “auto-descartam” sofrendo em silêncio e, muitas vezes, durante demasiado tempo.

O programa SEMAFÓRO tem a virtude de permitir, de forma discreta, identificar necessidades não evidentes, que muitos de nós, com responsabilidades de gestão, não sonhamos que existem mesmo debaixo dos nossos narizes. Há, em todas as organizações, pessoas cujas vidas – histórias de vida – não são conhecidas por quem com elas partilha o dia-a-dia.

Num tempo em que o Papa Francisco nos convoca para (re)aprender a sinodalidade, precisamos desenvolver muito mais a nossa capacidade de escutar. Escutar o outro com todo o nosso ser para podermos realmente caminhar com ele. Esta é uma dimensão que não é habitualmente associada aos grandes líderes: vistos como grandes oradores, mobilizadores, inspiradores, audazes… nunca (ou quase nunca) como grandes escutadores.

Assim, quando e como podemos considerar a escuta como um factor crítico na liderança e gestão das nossas organizações? Quem nunca considerou estar a perder o tempo – com a consequente falta de eficácia – dedicado a ouvir os outros? Só ouvir. Ouvir sem intenção de retorquir, de corrigir, de clarificar. Ouvir para pensar; ouvir para pensar e agir.

É este também um dos contributos que o SEMÁFORO traz: uma forma discreta e efectiva de escutar. Não só de escutar, mas também de direccionar a ajuda adequada para as pessoas que sejam identificadas. Escutar bem, para agir bem.

Em resumo, este programa tem estas e outras características que o tornam numa ferramenta muito interessante para os gestores das organizações empresariais e sociais. Para uns, porque lhes permite conhecer mais a fundo as suas pessoas; para outros porque é uma forma de identificar as necessidades de ajuda não evidentes. Por isso o considero ser uma iniciativa de grande valor social e com um potencial de impacto muito significativo na vida das organizações e das pessoas que delas fazem parte.

Carlos João Diogo

Director Geral da Cáritas Diocesana de Coimbra