A frase “mudar o mundo” tornou-se tão usada e abusada que perdeu a riqueza do seu próprio conceito. Mas ganha um novo significado quando a vida dos mais pobres é positivamente por ela tocada. Na sua 11ª edição, o fórum anual da reconhecida Skoll Foundation, premiou, como é seu hábito, o trabalho impar de sete organizações que realmente estão a contribuir para imprimir a mudança no (e do) mundo
POR HELENA OLIVEIRA
Todos os anos, no seu fórum mundial anual, a poderosa, inovadora e eficaz Skoll Foundation premeia o empreendedorismo social e de forma principesca. Ou nem tanto, na medida em que os projectos eleitos são demasiado importantes para terem um preço. Os premiados – indivíduos considerados como líderes transformadores, que contribuem para a disrupção da “ordem natural das coisas” e para a verdadeira mudança no (e do mundo), recebem 1,25 milhões de dólares e um apoio, ao longo de três anos, em termos de investimento, para aumentar a escala do seu trabalho e, consequentemente, o seu impacto.
Os nomeados pela Skoll Foundation em 2014 representam sete organizações, com parcerias em comunidades estabelecidas em 35 países e que, de acordo com o júri, estão prestes a “decifrar o código” de algumas das questões que mais importância têm para a humanidade. Estimulando a inovação numa panóplia de abordagens que maximizam a saúde, a educação, a oportunidade, a transparência e a responsabilização em alguns dos locais mais pobres do planeta, seguem-se os pioneiros eleitos este ano e que deverão estar no radar de todos aqueles que se preocupam com o futuro do planeta e da humanidade.
B Lab (Wayne, EUA)
Empreendedores sociais: Jay Coen Gilbert, Bart Houlahan, Andrew Kassoy
“Redefinir o sucesso nos negócios com base no que é o melhor PARA o mundo”
Co-fundado pelos amigos e colegas de longa data Jay Coen Gilbert, Bart Houlahan e Andrew Kassoy, o B Lab está a impulsionar um movimento global para redefinir o sucesso no mundo empresarial, para que todas as empresas compitam entre si não só para serem as melhores do mundo, mas para serem as melhores para o mundo. O B Lab está a desafiar o status quo através da edificação de um novo sector, uma nova estrutura legal e novas regras; a conferir empowerment a uma comunidade de “B Corporações” certificadas; e a trabalhar na promoção de políticas públicas que permitem às empresas criar valor financeiro, social e ambiental quer para os seus accionistas, quer para a sociedade. Com 20 estados norte-americanos que já aprovaram a legislação destas Benefit Corporations, cerca de 1000 empresas certificadas enquanto B Corporations e outras 16 mil a utilizar as suas ferramentas, o B Lab tem como principal enfoque acelerar a adopção global de este novo modelo de negócio.
[o VER já escreveu sobre as origens deste movimento no artigo “Injectar consciência no capitalismo”]
Fundación Capital (Bogotá, Colômbia)
Empreendedor social: Yves Moury
“Ajudar milhões a sair da pobreza”
Metade da população adulta do mundo – 2, 5 mil milhões – não tem acesso a qualquer serviço financeiro. Fundada pelo belga Yves Moury, a Fundación Capital é pioneira na inovação financeira inclusiva e tem como principal objectivo ajudar os pobres a poupar, a fazer crescer e a investir os seus activos, a prestar serviços de seguros às famílias contra riscos potenciais e a traçar um caminho permanente de “saída” da pobreza. Chegando já a três milhões de pessoas, a Fundación Capital está a trabalhar para alcançar mais oito milhões nos próximos anos através da expansão de acesso à formação, ao capital e às oportunidades. Os esforços levados a cabo por esta fundação para alinhar os avanços nas políticas públicas, nos mecanismos de mercado e na tecnologia, estão a ganhar um novo e substancial momentum que permitirá, a médio prazo, servir cerca de 100 milhões de famílias pobres, em três continentes, até 2030, permitindo-lhes tomar as suas próprias decisões financeiras e ir ao encontro das suas ambições.
Girls Not Brides (Londres, Reino Unido)
Empreendedora social: Mabel van Oranje
“Acabar com o casamento infantil para dar poder a uma geração de raparigas”
Todos os anos, cerca de 14 milhões de raparigas são obrigadas a casar ainda crianças, sendo-lhes negados os direitos à saúde, à educação, às oportunidades e a uma infância “normal”. Mabel van Oranje possui uma visão inspiradora de como seria o mundo sem estas “noivas crianças” e fundou a Girls Not Brides com o objectivo ousado de acabar com esta prática de casamentos na infância em apena uma geração. O casamento infantil “prende” estas raparigas, em conjunto com as comunidades onde estão inseridas, à pobreza. Ao acabar com esta prática, a comunidade global poderá começar a abordar um dos mais complexos desafios inerentes ao desenvolvimento. A Girls Not Brides consiste numa parceria global entre mais de 300 organizações da sociedade civil que trabalham em cerca de 50 países. Unindo as suas forças, os membros desta comunidade global acreditam que é possível lidar com esta norma social significativamente prejudicial e acabar com o casamento infantil.
Global Witness (Londres, Reino Unido)
Empreendedores sociais: Simon Taylor, Charmian Gooch, Patrick Alley
“Estimular a transparência para acabar com a ‘maldição dos recursos’ que dão origem a conflitos e a abusos dos direitos humanos”
Patrick Alley, Charmian Gooch e Simon Taylor estão conscientes de que muitas das pessoas mais pobres do mundo vivem nos países mais ricos em recursos do mundo. Os recursos naturais podem incentivar a corrupção, destabilizar governos e conduzir a conflitos e à pilhagem de regiões inteiras. Entre 2002 e 2011, o dinheiro ilícito que circulou através de negócios corruptos no mundo em desenvolvimento ascendeu a um total de quase 6 triliões de dólares. A Global Witness investiga e desmascara as redes “sombra” que estão por trás destes negócios, os quais estimulam os conflitos, a corrupção e a destruição ambiental. A organização recolhe provas e lança campanhas duras e eficazes para encontrar soluções globais para estas práticas e para colocar um ponto final na “maldição dos recursos”combatendo a corrupção, protegendo o ambiente, prevenindo o conflito e defendendo os direitos humanos.
Medic Mobile (São Francisco, EUA)
Empreendedor social: Josh Nesbit
“Construir ferramentas de comunicação móveis para levar os cuidados de saúde a comunidades carentes”
Cerca de milhões de pessoas nunca terão a oportunidade de conhecer um profissional de saúde ao longo da sua vida. O Medic Mobile de Josh Nesbit foi criado para melhorar a saúde em comunidades que não têm acesso a quaisquer cuidados médicos, através da utilização de ferramentas de comunicação. O Medic Mobile constrói aplicações móveis dirigidas a trabalhadores, cuidadores e pacientes, com o objectivo de aumentar a cobertura dos cuidados de saúde que podem salvar vidas. Existentes em 20 países, estas ferramentas apoiam 8 mil profissionais de saúde a trabalhar no terreno, com benefícios para quase seis milhões de pessoas e com planos para duplicar estes números anualmente. O objectivo é atingir um total de 200 mil profissionais da saúde que estarão ao serviço de 100 milhões de pessoas até 2018.
Slum Dwellers International (SDI) (Cidade do Cabo, África do Sul)
Empreendedor social: Jockin Arputham
“Inspirar os habitantes de favelas em todo o mundo a melhorar os seus bairros degradados”
Em 2008 – e pela primeira vez na história – existiam mais pessoas a viver em áreas urbanas do que em zonas rurais. Actualmente, mais de mil milhões de pessoas vivem em favelas. Fundada por um conjunto de habitantes de bairros degradados e por um grupo de profissionais preocupados, liderados por Jockin Arputham, um organizador comunitário na Índia, a Slum Dwellers International (SDI) trabalha no sentido ver as favelas reconhecidas como comunidades enérgicas, dignas e munidas de vários recursos que devem ser aproveitados. Na prática, a SDI trabalha com os habitantes destes bairros degradados ensinando-os a traçar um futuro melhor, a melhorar as suas condições de vida e a obter o reconhecimento enquanto “parceiros igualitários” dos governos e das organizações internacionais na criação de cidades inclusivas. Com programas em quase 500 cidades, e cerca de 15 mil grupos de trabalho nas próprias favelas, responsáveis por um milhão de pessoas, a SDI tem já 20 acordos fechados com governos nacionais e são já 130 mil as famílias que asseguraram os seus direitos à terra onde habitam. A SDI tem tido um papel principal e eficaz no que respeita à mudança em favelas espalhadas um pouco por todo o mundo.
Water & Sanitation for the Urban Poor (WSUP) (Londres, Reino Unido)
Empreendedor social: Sam Parker
“Ajudar as cidades a providenciar água e saneamento básico a todas as pessoas”
Em cada 5 segundos, a população mundial urbana aumenta em 10 pessoas. E toda a gente precisa de ter acesso a água potável e a serviços de saneamento, o que coloca uma enorme pressão nos organismos urbanos responsáveis por estes serviços. Como resposta a este desafio, a Water & Sanitation for the Urban Poor (WSUP) transformou o seu modelo de caridade tradicional através do desenvolvimento de modelos comercialmente viáveis que permitem levar água potável e saneamento básico a cerca de dois milhões de pessoas residentes em favelas em seis países. Sam Parker, um antigo gestor de negócios, tem vindo a liderar a organização desde 2006. Oferecendo um pacote criativo que mistura o sector privado, as organizações não-governamentais e a expertise académica, a WSUP equipa os organismos públicos e privados responsáveis por estes serviços, ao mesmo que os incentiva a servir todos os cidadãos nas cidades em questão.
FONTE: The Skoll Foundation |