Cabe-nos uma enorme responsabilidade na forma como formos capazes de servir no mundo, na sociedade, nas empresas, nas famílias, a partir do que somos, vimos e vivemos. Estar em Roma, no centro do cristianismo e da Igreja nascente foi marcante e “não poderemos calar o que vimos e ouvimos” (Actos, 4, 20), à imagem dos primeiros discípulos. De cada vez que o nosso coração e a nossa mente se iluminam com algo de novo, como o que recebemos nestes dias, somos também nós “primeiros discípulos” no anúncio e no compromisso
POR JOÃO PEDRO TAVARES

Assim diz Javé, Aquele que abriu um caminho no mar, uma passagem (…) eis que vou fazer uma obra nova: ela está a começar agora, e vós não a vedes? Abrirei um caminho no deserto, rios em lugar seco” Isaías, 43, 19-21:

Assim começou o congresso da UNIAPAC em Roma, com a 1ª leitura na eucaristia de abertura, liderada pelo Cardeal Czerny. E, desta forma, o Congresso ficou marcado, desde o seu início, pela exortação de que tenhamos “coragem para mudar”, mas, sobretudo, “coragem para renovar”, para “nos renovarmos”, pois, o caminho mais transformador é o que começa no nosso coração. Estando diante de empreendedores e empresários, a resposta só poderia ser na primeira pessoa, assumida como responsabilidade pessoal, colectiva e corporativa.

E os desafios prosseguiram com “foram os pobres convidados?” e ainda “foram os jovens convidados?”. Ou ainda, de que forma os poderíamos representar e comprometermo-nos com eles? Como os poderíamos cuidar e dignificá-los? Estávamos a ser desafiados para uma inclusão levada ao limite e ao que é verdadeiramente importante: o outro, o que nos está próximo, aquele de quem nos fazemos próximos, seguindo o exemplo do samaritano que se envolveu, cuidou, regressou e acompanhou. Nos testemunhos que fomos partilhando ao longo destes dias fomos vendo como são frutuosos os caminhos de proximidade e de cuidado.

E prosseguiu com o próprio Papa exortando a que “A mudança sempre requer coragem. Mas a verdadeira coragem também exige que sejamos capazes de reconhecer a graça divina na nossa vida.” Ou, de outra forma, a coragem não é, apenas e só, um propósito ou uma atitude ou uma capacidade. É, sobretudo, o exercício da vontade, em liberdade, para a promoção do bem comum. É, por assim dizer, o exercício pleno do Amor, da Verdade, da generosidade. Não existe bem comum sem generosidade, sem me disponibilizar a ter menos para que outros tenham mais. A servir sem esperar de volta ou como forma de promoção. A despojar-me de protagonismos pessoais, de cumprimento de regras para alivio da consciência se isso não for feito com autenticidade, com espírito de serviço, com promoção de um bem maior, descentrado de mim mesmo. A promoção do bem comum exige o esquecimento próprio em serviço à missão maior. O saber cuidar de tudo como interveniente, administrador e não como dono do que quer que seja. É esse sentido de Graça que deve sempre imperar e guiar-nos, nos pensamentos, palavras e obras.

Estes dias de congresso não foram para alegria ou gozo pessoal, mas para o cumprimento de uma missão e vocação maior, que é nobre e que a todos deve dignificar. Cabe-nos uma enorme responsabilidade na forma como formos capazes de servir no mundo, na sociedade, nas empresas, nas famílias, a partir do que somos, vimos e vivemos. Estar em Roma, no centro do cristianismo e da Igreja nascente foi marcante e “não poderemos calar o que vimos e ouvimos” (Actos, 4, 20), à imagem dos primeiros discípulos. De cada vez que o nosso coração e a nossa mente se iluminam com algo de novo, como o que recebemos nestes dias, somos também nós “primeiros discípulos” no anúncio e no compromisso.

Guiarmo-nos por padrões éticos e de sustentabilidade – económica, ecológica, social, de governo -, aplicando as finanças a um maior propósito, abraçando os desafios da tecnologia digital – robotização, inteligência artificial, comunicação, virtualização – entendidos como meios para uma nova economia, mais inclusiva, mais justa, mais próspera, mais próxima. Sabendo que nos reunimos depois dos jovens se terem comprometido, em conjunto com o Papa, com a promoção de novas realidades no mundo do trabalho, numa economia profética, que anuncia e que, entre outras coisas, inclui uma economia:

  • de paz e não de guerra;

  • que cuida da criação e não a destrói;

  • ao serviço da pessoa, da família e da vida;

  • onde o cuidado substitui o descarte e a indiferença;

  • que não deixa ninguém para trás;

  • que reconhece e protege o trabalho decente e seguro para todos e,

  • em que as finanças sejam amigas e aliadas da economia real e do trabalho, e não contra eles.

Depois de mais de dois anos de pandemia, afastados, em ligação remota, foi muito importante convivermos, partilharmos, abraçarmo-nos. Mas também comprometermo-nos e sabermos que não caminhamos sozinhos. Do outro lado do mundo há alguém que luta com desafios idênticos de ser testemunha e que pretende cumprir a sua missão de construir o bem comum, vivendo a nobre vocação de ser líder empresarial, servindo. A missão da UNIAPAC está precisamente em servir de cola a todas estas pessoas e associações locais, proporcionando-lhes maior proximidade, acesso a todos, ajuda e apoio. A Graça recebida é uma nova responsabilidade e somos chamados a uma coragem renovada. Sempre em serviço pelo bem comum. Pelos outros, pelas empresas, pela sociedade. Como sinal de esperança num mundo melhor.

Presidente da ACEGE – Associação Cristã de Empresários e Gestores